Quanto valem dez cêntimos

“Não, não é preciso”, disse eu na mercearia. E em boa hora: a senhora já ia colocar o saco de plástico onde residiam seis carcaças dentro de outro sem nada, a não ser o seu inconfundível cheiro a polímero. Entendo o gesto, aliás de grande simpatia muscular. Tendo asas, o segundo permite um transporte mais equilibrado, com os dedos em gancho, sem forçar desnecessariamente a mão e distribuindo melhor o peso entre as juntas do punho, cotovelo e ombro.

Mas eram pãezinhos, bolas. E ainda por cima feitos matéria semi-oca, com mais ar do que miolo – marca registada da panificação industrial. Podia levá-los pendurados na unha do dedo mindinho.

Chegando em casa, impliquei também com o próprio saco das carcaças. Em dois dias, estaria no lixo. E na cozinha, o contentor amarelo para as embalagens recicláveis – onde nós, poluidores, enterramos as nossas culpas – estava a transbordar de artigos semelhantes, derivados do petróleo.

Fiz um rápido exame ao tempo em que alguns me serviram. O saco plástico interno do cereal decedera em quatro dias, fruto de apetites adolescentes. A embalagem do arroz durou mais: uma semana. Um pacote de queijo ralado viveu 72 horas, até transformar-se em lasanha. Já os boiões de iogurte conseguiram chegar à terceira idade e o frasco de lava tudo sagrou-se campeão da longevidade: só foi para o caixote depois de seis meses – sintoma alarmante de que devo rever os hábitos de higiene doméstica.

Pobres dos sacos de supermercado que também ali estavam – os rotos e os sujos, que nem sequer puderam ter um segundo uso. O seu ciclo de vida útil é mais curto do que o de um espermatozóide perdido. Lembram os insectos efemerópteros, que depois da fase larvar só têm 24 horas para a infância, a juventude e a maturidade sexual. Se não encontram parceiro, ainda morrem sem conhecer o amor – uma crueldade para quem só vive um dia.

Para os sacos de supermercado, o seu tempo útil é ainda mais escasso. Entre o momento da compra e a chegada à casa, estamos a falar de minutos.

Felizmente há agora uma proposta de um imposto de dez cêntimos por cada saco distribuído. É medida comprovadamente eficaz. No Reino Unido, o País de Gales passou a cobrar uma taxa cinco pence (seis cêntimos) e em dois anos o número de sacos distribuídos caiu 79%. Já na Inglaterra, que ainda nada cobra, houve um aumento de 18%, representando mil milhões de sacos a mais.

Parte da culpa é da proliferação de caixas self-serve nos hipermercados. Numa magnífica obra de ergonomia consumista, o dispensador de sacos foi habilmente desenhado para que o cliente, ao puxar um, saia com três. Se tal esbanjamento é possível, é porque o preço do saco é tão barato para o comerciante que mais vale satisfazer o cliente com o secreto prazer de esconder no meio das compras aqueles que vêm a mais.

Como todos sabemos, há cadeias que foram mais inteligentes: vendem os sacos, saem bem na fotografia e conseguem receitas – em mais uma prova de que por detrás de uma solução sustentável há sempre um bom negócio

O futuro imposto irá desbaratar esta pândega e resolver o assunto. Só mesmo os mentalmente inábeis quererão pagar dez cêntimos para levar lixo para casa. Dez cêntimos por um item que dura dez a vinte minutos – uma dupla ofensa, económica e ecológica. Eu, com esse dinheiro, compro mais duas laranjas na mercearia, deixo lá o saco e volto com elas fazendo malabarismo.

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