Na noite em que o eterno rival se bateu pela glória, o Rio virou "alemão"

A rivalidade entre Argentina e o Brasil trouxe uma nova falange de apoio à selecção da Alemanha.

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Reuters

Dezenas de milhares de adeptos argentinos agitam as bandeiras azuis e brancas sobre a praia de Copacabana, num Rio de Janeiro que parece ter virado 100% alemão. Mais de 25 mil “hinchas” que não conseguiram aceder ao mítico Maracanã para assistir à grande final Argentina-Alemanha concentram-se em frente ao ecrã gigante do Fan Fest. Outros tomam de assalto os bares da “Cidade Maravilhosa” e vão sustendo a respiração.

O Rio foi invadido por mais de 100 mil argentinos, segundo as autoridades. Percorreram milhares de quilómetros: uns de carro, autocarro ou até de boleia. Todos fizeram questão de rumar ao território do eterno rival, desta vez já afastado da contenda, após os humilhantes 1-7 frente à Alemanha.

Na segunda maior cidade do Brasil, nunca se falou tanto espanhol. Mas há algo mais estranho nas ruas. É que desta vez os corações parecem bater em coro pelos rivais de há poucos dias, tal é a vontade de ver Messi perder a Taça Jules Rimet no derradeiro suspiro, em pleno Maracanã. “Há uma grande rivalidade em tudo, desde sempre, entre brasileiros e argentinos. Eles pensam que são os maiores… e nós também! Estavam convencidos que seriam campeões e as coisas não se passaram como imaginaram. Agora que eles apoiem a Alemanha, isso faz-me mal ao coração, somos todos latinos”, contou à AFP Roberto Romeira.

A alguns metros do Fan Fest, um jovem argentino enrolado na bandeira do seu país enche de areia um amigo coberto com a bandeira do Brasil, numa metáfora do enterro do futebol brasileiro. No meio desta massa humana que se cobre com as cores da “alviceleste”, os primos brasileiros Guilherme Limeira e Luiza Tendler exibem as bochechas pintadas com as cores da Alemanha. “Não quero que a Argentina ganhe, senão de cada vez que for lá, toda a gente vai gozar comigo”, conta este estudante de Engenharia, natural do Recife. “Da Argentina, gosto de tudo, menos do futebol”, reitera a prima.

Do outro lado, Mario Brunetti, de Buenos Aires, não poupa a selecção de Luiz Felipe Scolari. “É a pior equipa que vi na História. Só chegaram à final graças ao árbitro.” “Nada poderia ser pior para nós do que ver o Brasil campeão do mundo e nada seria pior para eles do que ver a Argentina ganhar”, explica Ariel Westten, um argentino “descendente de alemães”. “Mas é só isso: descendente!”, enfatiza.

Para Eric Turanza, a explicação para os brasileiros apoiarem a Alemanha é simples: a mania das grandezas dos rivais. “Somos argentinos mas quase nos sentimos europeus, sobretudo os porteños [habitantes de Buenos Aires]. O pior é que, por causa disso, se fosse uma final Brasil-Argentina, toda a América apoiaria o Brasil. Não gostam de nós”, diz, antes de soltar uma sonora gargalhada.

As provocações parecem surgir de todos cantos onde haja brasileiros e argentinos. “Somos confrontados com uma escolha difícil: apoiar os nossos carrascos ou os nossos rivais históricos, os argentinos. Mesmo assim, prefiro a Alemanha porque sei que se “Los Hermanos” ganham, gozarão connosco para o resto da vida”, atira Francisco Silva, carioca.

Em Copacabana, Peter Stock, um alemão de 51 anos com um equipamento da Deutschland assiste a toda esta exuberância sul-americana com inquietação. “Os argentinos estão por todo o lado, a beber há três dias e a fazer a festa. Mas se perderem, pergunto-me se esta loucura não se tornará agressiva…”

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