Banco do Vaticano quer ser um "modelo de gestão financeira"

Instituição deverá desfazer-se da área de investimentos, concentrando-se na sua missão original. Francês Jean-Baptiste de Franssu será o novo presidente.

Foto
Jean-Baptiste de Franssu,o novo presidente do Banco Vaticano, o cardeal George Pell e Ernst von Freyberg, que sai da direcção do banco Tony Gentile/REUTERS

É mais um passo dado pelo Papa para reformar a máquina administrativa e financeira do Vaticano, depois de anos de opacidade e escândalo. No prazo de três anos, o Instituto das Obras Religiosas (mais conhecido por Banco do Vaticano) deverá desfazer-se da área de investimentos e passar a concentrar-se naquela que era a sua missão original, gerindo as contas de instituições religiosas e enviando dinheiro da Santa Sé para as missões e dioceses em todo o mundo.

“O nosso objectivo é que ele se torne um modelo de gestão financeira e não uma razão para escândalos ocasionais”, afirmou o cardeal George Pell, o australiano que o Papa Francisco nomeou em Fevereiro para liderar a Secretaria da Economia, o “super-ministério” criado para gerir as finanças e a administração do Vaticano. Foi o primeiro acto de uma reforma destinada a varrer as suspeitas que se acumularam durante décadas e cuja divulgação manchou, a par dos escândalos de pedofilia, os últimos anos do pontificado de Bento XVI.

O IOR, instituição com 127 anos, milhares de clientes e um registo igualmente recheado de ligações a casos de corrupção e lavagem de dinheiro, era um dos temas mais espinhosos. O seu encerramento chegou a estar em cima da mesa mas, em Abril, Francisco decidiu mantê-lo, na condição de que adoptasse uma gestão prudente e servisse para fornecer serviços financeiros à Igreja. Colocou-o sob a alçada de Pell – até então estivera nas mãos do secretário de Estado –, a quem incumbiu de pôr em marcha as reformas discutidas no último ano.

Os primeiros detalhes do plano foram revelados nesta quarta-feira, numa conferência de imprensa em que Pell esteve acompanhado por Ernst von Freyberg, nomeado por Bento XVI no início de 2013 com a missão de tornar o IOR menos permeável à lavagem de dinheiro, depois de uma investigação da justiça ter levado à demissão dos anteriores directores.

O advogado alemão vai agora ser substituído por Jean-Baptiste de Franssu, um empresário francês especializado em gestão de fundos que integrava já o conselho económico criado para assessorar Pell. Os dois responsáveis sublinharam que haverá “uma continuidade” entre os dois mandatos e que, depois de uma primeira limpeza à gestão do IOR, as reformas “vão entrar agora numa segunda fase”. O objectivo é que até 2017 a instituição se desfaça “paulatinamente” das actividades de investimento, transferindo-as para um departamento de Gestão de Bens do Vaticano, a criar em breve, passando a concentrar-se no fornecimento de serviços financeiros a membros do clero, instituições religiosas e dioceses.

“Não podemos permitir-nos mais nenhum escândalo”, confidenciou ao Financial Times uma pessoa que o jornal identifica como sendo próxima do Papa. Mas a agenda de transparência não está isenta de custos. O IOR revelou que, desde Maio, congelou duas mil contas e excluíu três mil pessoas da sua lista de clientes. E o relatório de contas divulgado terça-feira revela que, em 2013, os lucros da instituição baixaram 97% face ao ano anterior (de 86,6 milhões de euros para 2,9 milhões), uma quebra justificada pelas despesas com a contratação de auditores externos e denúncia de contratos de investimento subscritos pela anterior gestão. A imprensa italiana fala ainda de 15 milhões resultantes de um empréstimo autorizado pelo antigo secretário de Estado, o cardeal Tarcisio Bertone, a uma produtora audiovisual de um seu conhecido.

Na conferência de imprensa desta quarta-feira, Pell revelou ainda que o grosso das competências até agora atribuídas à Administração do Património da Santa Sé – que gere as propriedades e orçamentos do Vaticano e viu recentemente o seu nome implicado em vários escândalos – passará para a secretaria de Economia, sendo aquela entidade reconvertida numa espécie de tesouraria da cidade-Estado. Uma mudança que, diz o cardeal, era essencial para garantir que o seu ministério “exerce as suas responsabilidades de controlo económico e supervisão” sobre todos os departamentos do Vaticano.

Sugerir correcção
Comentar