Decisão sobre “barrigas de aluguer” atirada para próxima sessão legislativa

PSD declarou-se indisponível para votar o seu projecto-lei, inviabilizando assim a sua votação antes de o Parlamento fechar para férias

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Para que a lei da gestação de substituição seja avaliada pelo TC, o CDS precisa do apoio do PSD Foto: João Guilherme

O dia 10 de Julho chegou a estar no calendário como o dia em que a Assembleia da República poderia abrir portas às “barrigas de aluguer”. Porém, depois de ter passado dois anos a negociar com o PS a versão final do texto que altera a Lei da Procriação Medicamente Assistida (PMA) para permitir a chamada gestação de substituição a casais heterossexuais impedidos de engravidar, o PSD alegou esta quarta-feira que, afinal, precisa de mais tempo para discutir o projecto-lei. Com isso, adiou a respectiva votação na comissão parlamentar de Saúde e, consequentemente, as hipóteses de o projecto ir a votação final no plenário antes das férias.

Este adiamento acontece um dia depois de o deputado do CDS/PP, Ribeiro e Castro, ter enviado uma exposição à Presidente da Assembleia da República, Assunção Esteves, reclamando a caducidade de todo o processo. “Este processo legislativo não pode deixar de dar-se por caducado e extinto”, preconizou Ribeiro e Castro, que aponta irregularidades em todo o processo legislativo que se arrasta desde há dois anos. 

Declarado opositor da gestação de substituição, o deputado do CDS/PP considera que os procedimentos até agora adoptados ofendem “a normalidade, abertura e transparência de qualquer processo legislativo democrático”, nomeadamente porque os prazos legais foram ultrapassados. "Um processo legislativo democrático não é um "tricot" às escondidas, nem uma arrastada manipulação processual", declarou Ribeiro e Castro ao PÚBLICO. 

O deputado do BE, João Semedo, contrapõe que tal argumentação não tem fundamento. “Não houve qualquer atropelo à lei nem ao regulamento”, asseverou o também vice-presidente da Comissão de Saúde. Por seu turno, a presidente da comissão de Saúde, a socialista Maria Antónia Almeida Santos, confirma que é “completamente falso” que o prazo da discussão em sede de comissão tenha sido ultrapassado. “No dia 1 de Setembro, que é quando termina o prazo que está a decorrer, pedirei uma nova prorrogação do prazo”, declarou ao PÚBLICO.

Trata-se já da 11º prorrogação do prazo. “Não sei por que razão o PSD precisa de mais tempo para fazer a discussão interna do texto consensualizado, mas o certo é que pediu esse tempo adicional e trata-se de um pedido válido, até por se tratar de uma matéria difícil. Só espero que em Setembro possamos aprovar esta lei que já criou tantas expectativas a estas mulheres”, acrescentou a deputada do PS.  

João Semedo, por seu turno, considera que foi uma “irresponsabilidade” o PSD ter esperado até ao último minuto do fim do processo legislativo para declarar que precisa de mais tempo. “É uma instrumentalização do trabalho do Parlamento para fins exclusivos de afirmação e propaganda partidária”, acusou. Mais grave, Semedo considera que os sociais-democratas defraudaram “as expectativas das centenas de mulheres e das centenas de casais que acreditaram que a maternidade de substituição seria aprovada nesta sessão legislativa”.

O BE foi o primeiro a avançar com uma proposta de alteração da PMA que não só previa a maternidade de substituição como alargava a procriação medicamente assistida a todas as mulheres, mesmo que solteiras e férteis. Ao mesmo tempo que chumbaram esta proposta, PS e PSD apresentaram, em Janeiro de 2012, dois projectos-lei que, embora menos ambiciosos, convergiam na defesa da ideia de que casais heterossexuais poderiam recorrer às barrigas de aluguer, nos casos em que a mulher não tenha útero ou esteja impedida de engravidar.

A versão final do texto cuja votação em sede de comissão chegou a estar prevista para esta manhã proíbe qualquer tipo de pagamento bem como “a doação de qualquer bem ou quantia dos beneficiários à gestante de substituição pela gestação da criança", exceptuando apenas o pagamento das despesas médicas devidamente comprovadas. Os casos em que haja lugar aos pagamentos considerados ilegais são punidos com penas até dois anos de prisão ou pena de multa até 240 dias. O PÚBLICO tentou, sem sucesso, falar com os deputados do PSD da comissão de Saúde.

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