Percurso pedonal da Baixa ao Castelo de S. Jorge recebe maior prémio de arquitectura ibérico

Projecto de João Pedro Falcão de Campos para o centro histórico, encomendado pela autarquia, distinguido com o prémio FAD 2014.

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Percurso Pedonal Assistido da Baixa ao Castelo de São Jorge JOSÉ MANUEL RODRIGUES
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As obras na rua da Vitória NUNO FERREIRA SANTOS

O mais importante prémio ibérico de arquitectura pertence este ano ao português João Pedro Falcão de Campos, cujo percurso pedonal assistido que liga o Castelo de São Jorge à Baixa de Lisboa foi distinguido com o prémio FAD 2014. Tanto o júri quanto o premiado frisam a importância do programa na sua origem - o percurso pedonal é parte do projecto da autarquia para a revitalização do centro histórico - e os jurados destacam ainda o resultado prático desta obra pública “capaz de sintetizar as virtudes da reabilitação e da técnica”. Falcão de Campos fala ao PÚBLICO da influência de Álvaro Siza, de trabalho de equipa e dos moradores que todos os dias partilham os seus elevadores com turistas e lisboetas sortidos .

“O programa deste projecto é merecedor de um aplauso, tendo em conta a sua capacidade transformadora e os recursos disponíveis”, avaliou o júri numa declaração revelada esta sexta-feira em Barcelona. O projecto, promovido pela Câmara Municipal de Lisboa, abarca edificado na rua da Vitória, na rua dos Fanqueiros (do n.º 170 ao 178) e na rua da Madalena (147 a 155), e visa ligar a Baixa à colina do Castelo através de elevadores e passagens. Num prédio dos Fanqueiros – “o edifício que serve de charneira da cota alta para a cota baixa”, descreve Falcão de Campos -, o miolo deu lugar a três elevadores e ali foi recentemente instalada a sede da Junta de freguesia de Santa Maria Maior, além de existir uma passagem para outro edifício, desta feita o da rua da Madalena. Atravessando o Largo Adelino Amaro da Costa (conhecido como Largo do Caldas), acede-se ao antigo Mercado do Chão do Loureiro, cujos elevadores integram também o percurso assistido. Depois, é tudo uma questão de pisos e pavimentos até ao castelo.

Inicialmente orçado em nove milhões de euros (contrapartidas do Casino de Lisboa), o projecto resultou de um convite ao atelier de João Pedro Falcão de Campos e data de 2009, tendo o grosso das obras terminado no ano passado. Ao telefone a partir de Barcelona, o arquitecto reage “com enorme satisfação” e frisa “o trabalho verdadeiramente de equipa” na origem do percurso pedonal agora premiado com o Fomento das Artes e do Desenho (FAD) de 2014. “A escolha do programa e a sua componente social foi do arquitecto Manuel Salgado [vereador Urbanismo e Planeamento Estratégico e número dois de António Costa na Câmara de Lisboa] e um desígnio da própria câmara de Lisboa”, lembra. “É um processo de programa.”

"O júri premiou não só a qualidade do projecto de um arquitecto português que se afirma internacionalmente, como também destacou a importância social desta intervenção na melhoria da qualidade de vida das pessoas, ao tornar a colina do Castelo mais acessível ao centro da cidade, aos transportes públicos e às pessoas com mobilidade reduzida", reage por seu turno Manuel Salgado. O arquitecto e vereador recorda que este "é o primeiro de outros quatro sistemas de elevadores: Alfama/Castelo, Campo das Cebolas/Castelo, Martim Moniz/Castelo e Mouraria /Graça que, em conjunto, representam um projecto com grande importância para uma Lisboa mais inclusiva para todos".

Sobre o local da sua intervenção, Falcão de Campos sublinha que a sua equipa tentou “fazer simples” e “dar continuidade aos ensinamentos fabulosos de Álvaro Siza” no seu trabalho na Baixa e no Chiado, dando o exemplo inspirador que foram as escolhas do Pritzker para as saídas do metropolitano – que ligam zonas baixas e altas do centro histórico. O tema da ligação da cota alta e cota baixa, que é fulcral neste projecto do percurso pedonal assistido entre a Baixa e o castelo, “é muito interessante”, destaca o arquitecto.

A utilização turística do percurso e os cruzamentos que ela tem com “as pessoas que vivem na cidade”, no fundo ver os residentes e os outros explorar estes novos caminhos sulcados na capital, “é extremamente gratificante” para João Pedro Falcão de Campos, que já tinha sido finalista dos FAD em 2007 na categoria de Interiores. Questionado sobre esse equilíbrio entre programa e prática, entre soluções para a reabilitação e execução, o arquitecto considera que o modus operandi ideal é “nunca ter uma decisão final”. Recorda a descoberta de “uma cave, uma espécie de cripta” no edifício da rua dos Fanqueiros durante a obra e a necessidade de adaptação subsequente, tal como no seu projecto de remodelação da sede do Banco de Portugal se descobriu parte da muralha de D. Dinis. O caminho, no fundo, “é nunca terminar os projectos, deixar sempre o programa em aberto”, sorri ao telefone.

“É um circuito através de dois edifícios, com seus pátios e suas gentes. É uma solução muito inovadora, além de que muito mais barata do que as habituais, e muito mais respeitosa”, disse ao El Pais o presidente do júri dos FAD,  Ramon Sanabria. Uma intervenção considerada “um bom exemplo do que se pode fazer se houver acordo entre público e privado”, completou ainda Sanabria. “Unidade, serenidade” são algumas das palavras de Falcão de Campos para descrever o percurso pedonal, que concorria com outros dez projectos, entre os quais os portugueses a Casa da Severa da José Adrião Arquitectos e o Centro Escolar da Gafanha da Boa Hora, por António Portugal e Manuel Reis.

Falcão de Campos sucede como vencedor nesta categoria dos FAD a João Luís Carrilho da Graça, com o Pavilhão do Conhecimento (1999), a Souto de Moura, cujo Estádio de Braga foi premiado em 2005, a João Maria Trindade, vencedor do FAD de Arquitectura em 2009 com a Estação Biológica do Garducho em Mourão, a Ricardo Bak Gordon (2011) e, em 2013, a Pedro Domingos pelo projecto da Escola Básica e Secundária de Sever do Vouga. Noutras categorias, João Mendes Ribeiro venceu o FAD de Arquitectura e Interiorismo em 2004, e Pedro Gadanho, actual curador no Museum of Modern Art de Nova Iorque, foi vencedor do prémio de ensaio e crítica em 2012.

Além do prémio máximo dedicado à arquitectura, os FAD são também entregues nas categorias de Arquitectura de Interiores (o vencedor de 2014 é a casa Entremurs, em Olot, dos arquitectos Rafael Aranda, Carme Pigem e Ramon Vilalta), Intervenções Efémeras (vencedor Wild Furniture - La Auténtica silla de Barcelona, de Ariane Patout e René Müller) e Cidade e Paisagem (distinguida a intervenção no vale Trenzado del Vinalopó, em Elche), além do prémio de Pensamento e Crítica (Juan Domingo Santos, por La tradición innovada. Escritos sobre regresión y modernidad, e Nieves Fernández Villalobos, com Utopías domésticas. La casa del Futuro de Alison y Peter Smithson).

O júri geral deste prémio criado em 1958 pela associação espanhola Arquinfad e que teve este ano a sua 56.ª edição foi presidido por Ramon Sanabria e contou com os vogais Ángela García de Paredes, Marcos Catalán, Francesc Belart, Esther Brosa e o arquitecto português Ricardo Bak Gordon. 
 

Notícia actualizada às 14h45 de 5 de Julho: adicionado nome de galardoado português com o prémio FAD em 2013

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