Teatro Praga entre as companhias afectadas pelos protestos em França

Companhia portuguesa foi apanhada na luta dos intermitentes do espectáculo. Já no fim-de-semana os três Concertos para Bebés, da companhia Musicalmente, dirigida por Paulo Lameiro, foram cancelados.

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Todos os dias são agendados novos protestos e greves AFP

O Teatro Praga, que deveria ter estreado esta terça-feira no Théâtre de la Ville, em Paris, o seu mais recente trabalho, Tear Gas, é mais uma das muitas companhias e artistas afectados pelas manifestações e greve dos intermitentes do espectáculo em França. Desde o início do mês que acontecem cancelamentos e adiamentos de espectáculos e de festivais importantes. O Governo francês está a ser cada vez mais pressionado pelos trabalhadores do sector cultural que não estão dispostos a aceitar as novas regras de acesso à protecção no desemprego aprovadas a 22 de Março pelos parceiros sociais.

Tear Gas, do Teatro Praga, é um dos destaques da edição deste ano dos Chantiers d’Europe (Estaleiros da Europa), que acontece durante o mês de Junho no Théâtre de la Ville, em Paris, mas acabou por ver a sua estreia adiada pelo menos um dia, depois de a montagem do espectáculo se ter atrasado com a greve dos intermitentes do espectáculo, que aconteceu na segunda-feira. Esta foi mais uma greve de muitas que têm acontecido, estando outras prometidas pelos trabalhadores enquanto o Governo francês não tomar uma posição sobre o assunto.

Em causa está a alteração nas regras de acesso à protecção no desemprego acordadas no final de Março pelos parceiros sociais e que, a serem aprovadas, significam um corte de 10% no subsídio de desemprego e o corte do subsídio de desemprego a cerca de 10% das pessoas que trabalham no sector. Em França há cerca de 220 mil intermitentes do espectáculo, entre artistas, técnicos e outros trabalhadores da Cultura. O que acontece até agora é que estes trabalhadores têm direito ao subsídio de desemprego nos períodos em que estão sem trabalho.

É para não perderem estes direitos que milhares de pessoas têm saído às ruas, um pouco por todo o país, fazendo pressão sobre o Governo de François Hollande para que não ratifique o acordo. E em solidariedade são muitos os trabalhadores da Cultura que se lhes têm juntado, tendo já vários eventos sido cancelados em protesto, do Printemps des Comédiens, em Montpellier, ao Rio Loco, em Toulouse, passando pelo Uzès Danse. O teatro Odeon em Paris também encerrou à semelhança do que tem acontecido em outras instituições um pouco por toda a França.

Nesta onda de contestação, também os Praga acabaram afectados. Tear Gas, peça que nasce da residência de Pedro Penim, fundador da companhia, em Atenas, deveria ter estreado esta terça-feira mas foi adiada para quarta-feira às 20h30. Ao PÚBLICO, Penim explicou que mesmo assim a estreia poderá não ser certa uma vez que todos os dias existem protestos. “Os protestos generalizaram-se e acabaram por nos afectar, fomos apanhados no meio da confusão”, conta o actor, explicando que sem os intermitentes não é possível que os espectáculos aconteçam. “Na segunda-feira [dia de greve] não tínhamos ninguém para nos ajudar na montagem do espectáculo e isto acabou por atrasar tudo”, continua Pedro Penim, acrescentando que o que está a acontecer é que “quem não é intermitente solidariza-se”.

Pedro Penim percebe, no entanto, a situação. “As pessoas estão a lutar pelos seus direitos, é preciso perceber que a falta destas pessoas compromete a viabilidade dos espectáculos”, diz o fundador do Teatro Praga, descrevendo o “clima de tensão” que existe neste momento em França. “Sente-se o nervosismo de todos os lados, em causa estão vários espectáculos e festivais de referência.”

Mas não foram os Praga os primeiros portugueses a serem afectados. Por exemplo, no último fim-de-semana em Paris o Concerto para Bebés, da companhia Musicalmente, dirigida por Paulo Lameiro, não aconteceu. Ainda no âmbito dos Chantiers d’Europe, vários concertos do ciclo de Flamenco no La Villette também foram já cancelados.

Em comunicado, os trabalhadores do Théâtre de la Ville lamentam a alteração na programação ao mesmo tempo que pedem ao Governo para não aceitar este acordo "que enfraquece todas as categorias dos trabalhadores precários". E avisam: "A intransigência do Governo nesta questão põe em perigo o espectáculo Palermo Palermo, uma coreografia de Pina Bausch para a companhia Tanztheater Wuppertal de 21 de Junho a 5 de Julho".

A pressão é por isso cada vez maior, até porque é preciso que exista uma decisão até ao final do mês de forma a não comprometer o Festival de Avignon, o mais importante acontecimento cultural do Verão francês que arranca a 4 de Julho e neste momento está em risco.

A ministra da Cultura e da Comunicação Aurélie Filippetti promete novidades para breve. Numa entrevista ao Le Monde, Filippetti lembrou que o Governo nomeou um mediador, o deputado socialista Jean-Patrick Gille, que tem estado reunido com as partes envolvidas para desbloquear o conflito. “Até ao final da semana, Jean-Patrick Gille deverá apresentar as suas propostas”, disse a ministra. Mas se a ministra defendeu Jean-Patrick Gille, o deputado não fez o mesmo e esta terça-feira no Twitter publicou uma infografia defendendo que qualquer que seja o caminho a tomar, a decisão será sempre explosiva. No desenho da infografia estão representadas as três partes envolvidas (os intermitentes, os parceiros sociais e os ministérios da Cultura e do Trabalho) e independentemente da solução apresentada, todos os caminhos vão dar a bombas prestes a explodirem. Resta agora saber que medidas o deputado vai apresentar para que este cenário não aconteça.

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