Tentar de mais cansa

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Se depois de Congratulations, o óptimo segundo álbum, o álbum em que os MGMT mergulharam de cabeça num imaginário de psicadelismo antigo e barroco iluminado a pixéis, ainda suspiram por KidsTime to pretend ou Electric feel, é tempo de os esquecerem de vez. Essas três óptimas canções do álbum de estreia, bizarrias pop incrivelmente contagiantes, sendo as mais célebres da banda americana, são também as cartas fora do baralho na sua discografia. Porque os MGMT, como demonstraram em Congratulations, como acentuam neste álbum homónimo, são, antes de criadores, verdadeiros e apaixonados cultores pop. São melómanos das margens do psicadelismo que apreendem o tempo em que vivem mas que desejam secretamente viver e sentir aquilo que era a música dos seus heróis de tempos idos. Digamos que são historiadores que querem, ao mesmo tempo, fazer história. Até MGMT, essa tensão entre anacronismo e modernidade resultou da melhor forma. Ou melhor, até metade de MGMT, para sermos mais precisos, dessa tensão nasceu alguma da pop desalinhada mais curiosa e estimulante do nosso tempo - verdadeiramente popular e enraizada na história do psicadelismo, mas onde se pressentia sempre um qualquer desejo de desarranjo. É, portanto, um óptimo meio álbum (e uma meia desilusão).

O álbum arranca com uma voz de criança a que se reúne uma voz de (elfo) adulto. A canção em questão chama-se Alien days e é música de baladeiros folk à solta no estúdio com uma tablete de LSD: guitarras dissonantes, melodias certinhas pintalgadas de gotas de sintetizador e os Zombies sorrindo debaixo de todas as camadas sonoras. Uma óptima abertura. Impressão que se confirma na densa Cool song nº2, que nos amarra na linha de baixo circular para que a cabeça rodopie em segurança, qual habitante permanente do mítico UFO, o clube da contracultura da Swinging London, e que se acentua na melhor canção do álbum, Mistery disease, um breakbeat lento e opiáceo, encharcado de mil sons de sintetizadores analógicos, canção cósmica mas perturbadora, física, transportadora. Em Introspection, versão de um original de Faine Jade, músico obscuro da década de 1960 resgatado ao esquecimento pelas compilações Pebbles, a simplicidade pop da melodia é submergida em sintetizadores, ruído branco e um solo de flauta de hippie bêbado mas muito entusiasmado - o que condiz bem com a frase do refrão "there"s a reason, and someday I"ll find the plan".

Música de excessos e de compromisso: é o futurismo do passado resgatado para recomeçar a história agora (a óptima Your life is a lie, por exemplo, é nervo punk traduzido em turbulência pop). Os MGMT, quais cantautores folk com o cérebro sintonizado na benfazeja loucura de Wayne Coyne, mostram-se até aqui, precisamente a metade do seu terceiro álbum, uma banda disposta a fazer da estranheza uma arma - por baixo da canção, uma melodia impoluta; sobre ela, uma vertigem de experimentação sonora que entontece. Depois chega aquilo que, na edição em vinil, será o lado B do álbum. E aí o entontecer passa a tontice. Ouvem-se divagações electrónicas, vagamente synth-pop e de som saturadíssimo, que piscam o olho aos Animal Collective mas que soam a uma banda perdida pela ambição de ser ainda mais desafiante e moderna e provocadora - mas A good sadness ou Astro-mancy não são nada disso, são apenas canções que provocam um rápido coçar de cabeça seguido de prolongado bocejo.

Quando avançamos por Plenty of girls in the sea, percebemos que a banda chocou de frente com o perigo que tão bem havia contornado na primeira metade do álbum. Os MGMT não precisam de tentar tanto, e de forma tão atabalhoada, mostrar que a credibilidade artística (o que quer que isso seja) é a única motivação que os move. As suas canções pop psicadélicas algo perturbadoras e perversamente danificadas são credíveis o suficiente. Confirma-o metade deste bipolar MGMT

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