Petro Poroshenko: um "rei do chocolate" numa fábrica de oligarcas

As sondagens dão quase 50% ao experiente empresário e político de 48 anos que foi o único oligarca a entrar na Praça da Independência.

A provável vitória de Petro Poroshenko nas eleições presidenciais deste domingo na Ucrânia começou a desenhar-se muito antes de alguém imaginar que o país iria a votos ainda este ano.

Há quase seis meses, na viragem de Novembro para Dezembro, quando as manifestações populares em Kiev a favor da assinatura de um acordo com a União Europeia começavam a tornar-se violentas, o experiente e bem-sucedido político e homem de negócios (ou "oligarca", se quisermos poupar nas palavras) foi rápido a pegar no megafone que estava à disposição dos descontentes com o então Presidente Viktor Ianukovich.

Poroshenko atirou-se de cabeça para o meio da confusão entre manifestantes e polícia, e a todos pediu calma. Ao lado de outras destacadas figuras da improvisada coligação de oposição a Ianukovich – como o pugilista Vitali Klitschko e Arseni Iatseniuk, o actual primeiro-ministro interino da Ucrânia –, Petro Poroshenko foi sendo reconhecido pelos milhares que ocupavam a Praça da Independência como um dos seus.

Conhecido no país como o "rei do chocolate", por ter feito fortuna com as centenas de toneladas de chocolates, biscoitos e bolos que vende todos os anos através da empresa Roshen, Poroshenko foi o único oligarca a pôr-se ao lado dos que protestavam contra Viktor Ianukovich.

É esse o principal trunfo do homem de 48 anos que se foi tornando, nas últimas semanas, numa espécie de Presidente antes de tempo – as sondagens dão-lhe quase 50% das intenções de voto, contra valores abaixo dos 10% dos seus mais directos adversários, Iulia Timoshenko e Sergei Tigipko.

Mas as sondagens reflectem mais o desespero de muitos ucranianos com a actual divisão do país entre pró-europeístas e pró-russos do que uma esmagadora aprovação das capacidades de Petro Poroshenko para devolver ao país a paz perdida – e muito menos para dar a volta a um sistema político assente, em grande parte, na corrupção e no longo banquete que senta à mesma mesa políticos e homens de negócios há mais de duas décadas.

O especialista em assuntos ucranianos Taras Kuzio, colaborador de universidades como a de Alberta, no Canadá, ou a Johns Hopkins, no estado norte-americano do Maryland, revelou mesmo a sua surpresa com a súbita popularidade de Poroshenko.

"O Euromaidan foi um levantamento de massas contra muitos aspectos da má administração de Ianukovich, mas uma das principais queixas foi o abuso de poder em larga escala e a corrupção. O elevado nível de aprovação de Poroshenko é, por isso, especialmente surpreendente, porque ele está associado perante a opinião pública ao 'lobby do gás', em representação do sector das economias ucraniana e euroasiática que mais alegações de corrupção tem suscitado”, escreveu Kuzio no Financial Times.

Mas o capital de popularidade conquistado na Praça da Independência parece ser mais forte do que qualquer amnésia selectiva. Para além de ter sido o único oligarca a dar a cara nos primeiros tempos da mais recente revolução na Ucrânia, Poroshenko soube também manter-se à margem das negociações directas com Viktor Ianukovich.

Em finais de Fevereiro, no dia em que o então Presidente anunciou ao mundo que tinha chegado a acordo com a oposição, o documento que viria a ser repudiado pelos manifestantes da Euromaidan não estava manchado com o seu nome. Numa altura em que a crise política se tinha tornado inevitável, figuras como Vitali Klitschko e Arseni Iatseniuk saltavam para a fogueira dos revolucionários ao tentaram chegar a um compromisso com Viktor Ianukovich.

Com o passar do tempo, a popularidade de Klitschko – que chegou a ser o candidato preferido da chanceler alemã, Angela Merkel – desceu ao ponto de o obrigar a desistir da corrida às presidenciais, anunciando o seu apoio a Poroshenko. Já Iatseniuk, o primeiro-ministro interino de um "Governo kamikaze", segundo as suas próprias palavras, é tolerado no Este e odiado no Leste.

À imagem dos compromissos que foi fazendo ao longo dos 16 anos de carreira política, o "rei do chocolate" aproveitou a campanha para distribuir rebuçados para todos os gostos – sempre foi favorável à entrada da Ucrânia na NATO, mas agora defende que esse assunto não deve ser sequer discutido porque não recolhe a maioria do apoio popular; quer uma autonomia muito vincada para todas as regiões do país, mas afasta a hipótese de federalização nos moldes em que ela é defendida pelos separatistas pró-russos e pela própria Rússia; e é um conhecido pró-europeísta, mas os seus interesses económicos na Rússia fazem dele uma espécie de mal menor para o Presidente Vladimir Putin.

"A ideia é que Poroshenko é um pragmático, e fez parte do Governo de Ianukovich. É um negociador. Deste ponto de vista, pode significar que Putin está disposto a esperar para ver se consegue tirar partido disso", comentou Adrian Karatnicki, especialista em assuntos ucranianos na organização Atlantic Council, com sede em Washington, nos EUA.

Um homem pragmático ou um "salta-pocinhas", conforme as opiniões dos seus apoiantes e dos seus detractores, Petro Poroshenko sempre se movimentou bem nos corredores da política ucraniana – em 16 anos de carreira, foi apoiante de Leonid Kuchma até 2001; fundou o Partido das Regiões; esteve com Viktor Iushenko na Revolução Laranja, entre 2004 e 2005; fez parte do primeiro Governo liderado por Iulia Timoshenko, entre 2009 e 2010, embora sempre tenha mantido com ela uma profunda disputa; e ainda passou pelo Ministério do Desenvolvimento Económico nomeado por Viktor Ianukovich, em 2012, de onde saiu um ano antes do início das manifestações na Praça da Independência.

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