Famílias: da promessa "felizes para sempre" caiu o "para sempre"

Quase 15% das famílias são constituídas por um pai ou uma mãe sós. A ruptura conjugal é o principal factor que explica a monoparentalidade.

Foto
Famílias perdem na dimensão institucional, mas afirmam-se cada vez mais enquanto lugar de afectos Jeff Belmonte/Flickr/Creative Commons

Recompostas, monoparentais, sem papel passado, voláteis, com filhos mas cada vez mais em versão mini: as famílias portuguesas são o espelho perfeito das mudanças registadas na sociedade portuguesa nas últimas décadas.

Desde logo, porque o casal, apesar de continuar a ser a figura predominante de organização familiar, tem vindo a perder terreno para as famílias monoparentais. Em 2011, 14,9% das famílias eram constituídas por pai ou mãe sós com filhos. Vinte anos antes, em 1991, havia apenas 9,2% de famílias nesta situação.

Os dados divulgados nesta quarta-feira pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), a propósito do Dia Internacional da Família que se comemora amanhã, mostram ainda que, entre 1991 e 2011, a monoparentalidade por ruptura conjugal (divórcio ou separação) subiu de 21,9 para 43,4%. Algumas décadas antes, os núcleos monoparentais existiam também, mas decorriam sobretudo de situações de viuvez ou emigração de longo prazo.

Não quer isto dizer que a família esteja em crise. Quer apenas dizer que na promessa do “felizes para sempre”, caiu o “para sempre”. “As pessoas continuam a considerar a família a primeira prioridade das suas vidas”, enfatiza a socióloga Anália Cardoso Torres, para quem “há até uma revalorização dos laços familiares”.

Recuperando os dados do European Social Survey, cujos inquéritos se têm repetido de dois em dois anos, Anália Torres recorda que, na escala de prioridades dos inquiridos, surge a família em primeiro lugar, depois o lazer e depois o trabalho. “Primeiro vêm os afectos, depois o tempo para curtir esses afectos e só depois o trabalho, porque é preciso pagar isso tudo”, brinca a socióloga.

Longe de considerar o crescente número de divórcios e separações como sinal de crise da família, a socióloga entende que aqueles representam quase sempre uma insistência na família enquanto lugar de afectos. “As pessoas não suportam que essa dimensão das suas vidas corra mal precisamente porque ela é central. E por isso é que os primeiros casamentos descem, dando lugar a outras formas de viver em conjugalidade, mas os segundos casamentos de divorciados tendem a aumentar”, sublinha.

Efectivamente, os núcleos de casais reconstituídos (com pelo menos um filho não comum) representavam em 2011 6,6% do total de casais com filhos. Dez anos antes, o seu peso era de 2,7%, o que, segundo o próprio INE, “evidencia que a recomposição familiar após um divórcio ou separação se tornou uma prática mais comum nas famílias portuguesas”.

Ainda sobre as famílias de pais ou mães sós, o INE mostra que as famílias de mães sós representam 86,7% dos núcleos monoparentais. E, se estivermos a falar só dos núcleos monoparentais com filhos menores de 18 anos, a proporção dos núcleos femininos sobe para os 89,2%.

Quanto à dimensão institucional, aqui sim, pode-se dizer-se que a família se precarizou. Nos últimos 20 anos, o peso dos casais em união de facto quase quadruplicou. Passou de 3,9%, em 1991, para 13,3%, em 2011.Esta crescente informalização dos laços familiares acompanha quer as famílias sem filhos, quer as famílias com filhos.

Sem surpresas, as famílias numerosas continuam a perder importância numérica. Em 2011, apenas 7,4% das famílias tinham três ou mais filhos (eram 16,8% em 1991). Em consonância, e sem surpresas também, numa altura em que a queda na natalidade se assumiu como emergência nacional, o número médio de filhos por mulher em idade fértil desceu para um mínimo histórico (1,35 filhos em 2011 para 3,2 filhos em 1960).

Sugerir correcção
Comentar