O mundo mudou assim tanto em 15 dias?

É justo não sacrificar sempre os mesmos. Mas é injusto fazer promessas e não as cumprir.

Há 15 dias, Passos Coelho, a propósito do Documento de Estratégia Orçamental (DEO), afirmava que aquilo que iria ser divulgado pelo Governo não seriam “medidas que incidam em matéria de impostos, salários ou pensões”. Na mesma altura, a ministra das Finanças, ainda a propósito do DEO, dizia que “as medidas duradouras em preparação não se traduzem em qualquer contributo adicional para a consolidação orçamental, ou seja, não implicam sacrifícios adicionais”. E as promessas não ficaram por aqui. Também o ministro da Presidência, Luís Marques Guedes, garantiu que "não haverá aumento de impostos em 2015 ou esforços adicionais sobre salários ou pensões”.

Quinze dias volvidos, o mundo mudou. Afinal haverá mais impostos. Afinal haverá mais sacrifícios. O Governo cumpriu quando prometeu aos pensionistas e aos funcionários públicos que as medidas permanentes que iriam substituir a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (CES) e os cortes salariais no Estado não iriam ser mais gravosas. A generalidade dos pensionistas que pagava uma CES de 3,5% a 10%, a partir dos 1000 euros, vai passar a pagar uma nova CES, rebaptizada de “contribuição de sustentabilidade”, de apenas 2% a 3,5%. Aos funcionários públicos, em 2015, vai-lhes ser restituído 20% do valor do corte que estão actualmente a sofrer.

Quando o Governo prometeu, e cumpriu, que os reformados e pensionistas não iriam ser tão sacrificados, pensava-se que o Governo teria uma folga orçamental. Até porque quando, há 15 dias, anunciou as medidas de consolidação para baixar o défice em 2015, apenas fez referência a cortes de 1400 milhões de euros na máquina e nas gorduras do Estado. Mas, afinal, não tinha folga nenhuma. Para dar essa “benesse” aos pensionistas e aos trabalhadores do Estado, o Governo vai buscar o dinheiro a quem, há apenas 15 dias, prometeu que não iria “sacrificar” nem exigir mais impostos.

A taxa normal do IVA sobe 0,25, para 23,25%. A TSU, a parte da contribuição que os trabalhadores fazem para o sistema de previdência social, aumenta 0,2 pontos, para os 11,2%. E o Governo vai ainda agravar a tributação “de impostos específicos sobre o consumo”. Com estas três medidas, as receitas do Estado aumentam em 350 milhões. E é com este dinheiro que o Governo vai desagravar o corte da CES e restituir no próximo ano 20% dos cortes salariais na função pública.

É justo não sacrificar sempre os mesmos, mesmo que esse alívio tenha de ser feito à custa do rendimento de outros portugueses que não sejam funcionários públicos e pensionistas. O que não é justo é criar expectativas de que não haverá mais aumento de impostos e depois agravá-los. O que não é justo, e até é bizarro, é estar agora a anunciar aumentos de impostos para 2015, ao mesmo tempo que alguns membros do Governo, sobretudo os ministros do CDS, prometem uma baixa do IRS para 2015.
 

  



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