A exposição permanente do Mude vira o disco e toca o Lado B

Mais peças de design português e mais de 90 peças nunca mostradas do acervo do Museu do Design e da Moda, em Lisboa, da cozinha de Daciano Costa ao esqui da Hermès.

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Peças Chanel, Madame Grès e um BMW Isetta de 1953 Daniel Rocha
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No núcleo dedicado aos anos 1960/70, a Vespa da Piaggio junto a peças Emilio Pucci Daniel Rocha
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A renovação da exposição permanente acontece perto do 5.º aniversário do museu Daniel Rocha
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O percurso sugerido pelo piso térreo continua o mesmo, mas há novas peças para ver Daniel Rocha
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A cadeira Osaka de António Garcia em primeiro plano, peça de Eduardo Anahory e, ao fundo, as cadeiras Sena e a linha Cortez de Daciano Costa Daniel Rocha
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As conservadoras-restauradoras ainda trabalham nos último pormenores Daniel Rocha
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Uma das mais reconhecíveis peças da mostra, o cadeirão pontilhado de Alessandro Mendini de 1978 Daniel Rocha
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Ao fundo, Big Easy de Ron Arad Daniel Rocha
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Um coordenado Dior, de 1950, três anos depois do New Look Daniel Rocha

Uma máquina de costura, uma cadeira de assento de palhinha, uma torradeira e um fato de esqui Hermès dão-nos as boas vindas. É aqui que se começa a notar a diferença entre Único e Múltiplo versão 2009-2014 e Único e Múltiplo versão actual. O Museu do Design e da Moda (Mude) inaugura esta quinta-feira a sua nova abordagem da exposição permanente, com o mesmo título mas com novas peças e mais design português. Vemos também objectos menos conhecidos de designers muito conhecidos e mais peças iniciáticas do que imediatamente reconhecíveis. É o Lado B dos greatest hits do Mude.

“Renovar, mas mantendo o mesmo discurso histórico” era o objectivo, diz a directora do Mude, Bárbara Coutinho, mas se ali está o emblemático sofá Big Easy (1989) de Ron Arad, ou um vestido provocador da Moschino (Puta, puta, pero muy católica, de 1989/90), também se contam agora “pequenas histórias menos consagradas da evolução do design”. A ideia é “valorizar as peças que temos em colecção de autores marcantes que, não sendo as mais conhecidas, são outras, mais iniciais” dos seus trabalhos, explica a responsável e comissária da mostra com Anabela Becho, da equipa de conservação do museu e especialista em moda.  

E o descubra as diferenças começa logo nos primeiros núcleos, com a máquina de costura Pfaff de 1915 e o raro fato de esqui dos anos 1930 da refinada Hermès a assinalar não só as maravilhas da técnica mas a mudança dos estilos de vida, da valorização do sportswear aos novos hábitos domésticos. Uma torradeira da AEG ou a cadeira n.º 14 (1859) de Michael Thonet (depositada no Mude pelo Museu Nacional de Arte Antiga), “peças absolutamente pioneiras do design moderno”, completam a nova entrada evocando “o debate e investigação” que esteve na sua origem e que considera ser “fundamental para os alunos” que visitam o museu, exemplifica Bárbara Coutinho.  

O percurso no piso térreo do museu municipal, que completa cinco anos em Maio com uma nova mostra sobre Os Iconoclastas dos Anos 80, é o mesmo: ver passar o design e a história do mundo desde o final do século XIX em núcleos feitos de roupa e objectos, sofás e candeeiros, jarras, enceradoras e cinzeiros, continuando a viagem até aos anos 2000. Mas se antes reconhecíamos a colorida Bibliothèque Méxique de Charlotte Perriand ou o móvel de assento Living Tower de Verner Panton, por exemplo, agora vemos a cadeira Gonçalo – a icónica peça portuguesa de mobiliário de cafés e esplanadas fez 50 anos em 2013 e o original de Gonçalo Rodrigues dos Santos, junto com a sua versão reinterpretada por Alexandre Paulo Caldas por ocasião da efeméride, estão agora no núcleo do pós-II Guerra do Mude.

Além da cadeira que gerações de portugueses reconhecem do seu quotidiano, há ainda peças de Filipe Alarcão, Marco Sousa Santos, Fernando Brízio, Pedro Silva Dias, Eduardo Anahory e outras preciosidades como a cadeira e secretária da linha Cortez de Daciano Costa, as cadeiras escolares empilháveis de Sena da Silva ou a cadeira Osaka de António Garcia. “Parte da missão do Mude é também, na sua exposição permanente, começar a fazer a evolução do design em Portugal”, integrando por “direito próprio” alguns dos “pioneiros do entendimento moderno do que era a prática projectual”.

A estas peças da vida portuguesa junta-se, por exemplo e por doação da sua família, a cadeira desenhada pelo arquitecto dos hotéis Ritz e Tivoli Porfírio Pardal Monteiro (1930), vivida mas digna num dos primeiros núcleos da mostra entre um Dior (1950) e um impecável carrinho de chá de Alvar Aalto. E nada mais vivido do que o modelo de um trem de cozinha desenhado por Daciano, que o designer usava em sua casa, e que também é mostrado pela primeira vez.

São 190 peças, 160 das quais da colecção Francisco Capelo que constitui a base do acervo do Mude (cerca de 2500 peças de design industrial, de equipamento e de moda) e 30, sobretudo de design português, vindas das aquisições, depósitos e doações ao museu – a Fundação Gulbenkian depositou no Mude cerca de 30 peças de Aalto, Mies van der Rohe ou Le Corbusier, compradas para a inauguração do Centro de Arte Moderna em 1983. Das peças da colecção Capelo, 93 são mostradas ao público pela primeira vez. A exposição reflecte “uma maior maturação dos conteúdos e a integração das peças do acervo”, admite a sua directora.   

Com algumas peças entregues a conservadores e restauradores portugueses – um plissado de Madame Grès demorou mais de um mês a recompôr -, as comissárias frisam o seu contentamento com os novos diálogos criados em cada núcleo. E, assim, um coordenado da colecção Oversized (2000) da maison Martin Margiela conversa com a cadeira Tavares (2009) de Marco Sousa Santos, com o candeeiro Desque de Pedro Silva Dias (2005) a dar o seu palpite e a muito amarela cadeira Fibreglass de Marc Newson (1989) a dizer algo à sua congénere brasileira Taquaral (2000), dos irmãos Campana, e a Empty Chair (1994) de Ron Arad a rematar a coisa. 

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