Rússia responde à ameaça de sanções com um sonoro "Crimeia, estamos contigo"

Observadores da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa continuam a ser impedidos de entrar na península.

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A diplomacia raramente produz resultados de um dia para o outro, e poucos esperavam que a crise na Crimeia fosse ultrapassada horas depois de a União Europeia e os Estados Unidos terem apertado o cerco económico à Rússia. Por agora, as primeiras sanções norte-americanas e a ameaça de “graves consequências económicas” por parte dos líderes europeus não desviaram Moscovo do seu plano nem um milímetro: se o resultado do referendo marcado para o próximo fim-de-semana na Crimeia for favorável à integração na Rússia, a Rússia “respeitará a histórica decisão da Crimeia”.

A garantia foi dada olhos nos olhos aos representantes do parlamento regional da Crimeia que se deslocaram nesta sexta-feira a Moscovo, onde se reuniram com deputados de ambas as câmaras do parlamento russo. O presidente da câmara baixa (Duma), Sergei Narishkin, e a presidente da câmara alta (Conselho da Federação), Valentina Matvienko, fizeram das palavras de cada um deles as palavras do outro. Depois de Narishkin garantir que a Rússia respeitará o resultado do referendo, Matvienko garantiu que a Rússia “apoiará a decisão do povo da Crimeia”.

No próximo dia 16, os cidadãos da península que está no centro do conflito entre a Rússia e a Ucrânia – e que é, mais do que isso, uma luta pela influência política e económica que opõe Bruxelas e Washington a Moscovo – vão decidir se preferem manter-se integrados no território ucraniano, com uma autonomia reforçada, ou se querem mudar-se para a Federação Russa. O problema é que a consulta popular, que foi convocada por um parlamento regional tomado de assalto por meia centena de homens armados em finais de Fevereiro, não tem qualquer validade legal aos olhos da União Europeia, dos Estados Unidos e das novas autoridades da Ucrânia, que chegaram ao poder depois dos confrontos sangrentos em Kiev e da deposição do Presidente Viktor Ianukovich.

O Presidente francês, François Hollande, repetiu ontem o que outros líderes europeus, e o seu homólogo norte-americano, já tinham afirmado: “A integridade territorial e a soberania da Ucrânia não são negociáveis.” Numa reunião no Palácio do Eliseu com o líder do partido ucraniano UDAR, Vitali Klitschko, e com o deputado independente Petro Poroshenko, Hollande declarou que a União Europeia só aceitará um referendo na Crimeia se for o governo da Ucrânia a organizá-lo.

Enquanto Hollande falava aos jornalistas ao lado de dois protagonistas da revolução no poder da Ucrânia, a 2500 quilómetros de distância, no coração de Moscovo, mais de 65.000 pessoas recebiam os deputados do parlamento regional da Crimeia com cartazes e palavras de ordem de apoio à anexação da península pela Rússia.

Ao som de músicas de teor nacionalista interpretadas pelo cantor pop russo Oleg Gazmanov, milhares de manifestantes agitavam cartazes com frases como “Crimeia, estamos contigo" e "A Crimeia é território russo".

As manifestações a favor das políticas do Kremlin, escreve a agência AFP, “são normalmente orquestradas pelas autoridades, que levam os funcionários para os locais de protesto em autocarros”. O correspondente da BBC em Moscovo, Steve Rosenberg, fez a mesma interpretação, ao partilhar uma fotografia no Twitter com a frase “Eles cantam ‘Moscovo! Rússia! Crimeia!’ à passagem pelo Kremlin, nesta manifestação organizada pelas autoridades”.

O Kremlin continua a dizer que as forças russas na Crimeia limitam-se a proteger as suas instalações militares, mas ontem foi o ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergei Lavrov, quem explicou por que é que os observadores da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) continuam a ser impedidos de entrar na península ucraniana. O grupo de 43 representantes de 23 países da OSCE foi barrado por duas vezes por homens armadose não identificados porque a organização não esperou por um convite das autoridades pró-russas da Crimeia, “sem levar em conta os conselhos e as recomendações da Rússia”. “As estruturas executivas e vários Estados-membros da OSCE agiram de acordo com as piores tradições de dois pesos e duas medidas em relação à situação na Ucrânia”, acusou o ministro russo.

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