Doentes com cancro da pele e da próstata são os que mais esperam por cirurgia

Dados do primeiro semestre de 2013 mostram que há mais operações a doentes com cancro mas que não chegam para a procura, pelo que o tempo de resposta está a aumentar. Uma tendência contrária ao global das cirurgias do país.

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No final de 2014 existiam 2216 portugueses à espera de um órgão. Carlos Lopes

No espaço de seis anos, o número de pessoas a dar entrada na lista de inscritos para uma cirurgia oncológica cresceu quase 25%, ao mesmo tempo que o número de operados fora dos tempos aconselháveis caiu para metade. O problema é que a tendência de descida que vinha a acontecer desde 2007 foi invertida no primeiro semestre de 2013, com os doentes a terem de esperar em média 24 dias, quando no mesmo período do ano anterior só esperavam 19. Os casos com cancros da pele e da próstata são os que mais aguardam.

Os dados são da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) e fazem parte do Relatório Preliminar do SIGIC (Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia), relativo ao primeiro semestre de 2013, que acaba de ser publicado e que mostra que a área da oncologia segue uma tendência diferente do resto das intervenções, nas quais o tempo de espera melhorou. Para a ACSS, “o aumento do número de inscritos é o esperado” tendo em consideração que todos os anos o número de casos de cancro cresce e que há também um “desejável aumento da detecção mais precoce”.

Em relação ao primeiro semestre de 2012, os hospitais públicos fizeram mais 2,9% de intervenções cirúrgicas a neoplasias malignas, com um total de 22.321 doentes operados. Porém, o acréscimo de produtividade não foi suficiente para travar o aumento do tempo de espera que subiu cinco dias, de 19 para 24 dias. Esta derrapagem teve também tradução na percentagem de doentes que ainda são operados foram dos tempos recomendáveis para as doenças em causa: em 2013 eram 22,6%, quando no ano anterior eram 22,4%. Além disso, o número de pessoas que ainda aguardavam operação no fim do semestre é também o mais elevado dos últimos seis anos, já que no primeiro semestre de 2007 eram 3501 e agora eram 3725.

Cirurgias mais complexas
O coordenador do SIGIC, Pedro Gomes, considera que só com os dados anuais fechados se poderá fazer uma análise global, mas defende que o primeiro semestre, “tendo em consideração o contexto de crise em que vivemos, apresentou resultados melhores do que os esperados”, com “uma estabilização em termos de entradas” de doentes para a lista e aumento geral da produtividade. Quanto à área da oncologia em concreto, em declarações ao PÚBLICO, Pedro Gomes admite que “não se está a conseguir dar resposta ao aumento da procura”, e acrescenta que a área precisa de “uma atenção especial”. O responsável sublinha que há operações cada vez mais complexas nos casos de cancro, que tomam mais tempo e mais recursos financeiros, pelo que é necessário ter isso em consideração quando se olha para alguns hospitais que estão a realizar menos cirurgias.

Quanto aos grupos com mais problemas de espera, as neoplasias malignas da pele são as que aguardam mais dias (26) e em que mais gente é operada fora do prazo (32,5%). Segue-se o cancro da próstata, em que a espera em dias é maior, com 34 dias, mas a percentagem de pessoas operada fora do prazo previsto na lei baixa para 29,2%. Alguns cancros da região torácica são os que menos esperam, com uma média de 13 dias e apenas 11,8% de intervenções fora do tempo recomendado. Já os casos de cancro da mama esperam 16 dias, sendo que a percentagem fora do desejável se fica pelos 7,4%.

Olhando para a actividade concreta dos três Institutos Portugueses de Oncologia (IPO) do país, as unidades que mais operam nesta área, verifica-se, pelo contrário, que estão a realizar menos cirurgias. No primeiro semestre de 2013, o IPO do Porto realizou menos 3,5% de operações (tanto a tumores benignos como malignos) do que em igual período de 2012 – apesar de cada cirurgião ter realizado, em média, 96 cirurgias, um número bastante acima das 85 previstas. No IPO de Coimbra, no mesmo período, as cirurgias caíram 6,6% e a média por cada cirurgião é de apenas 65 cirurgias. Já o IPO de Lisboa viu a sua actividade cair 8,4%, com uma média de quase 82 operações por médico.

Doentes encaminhados através de convenções cai para metade
A ACSS apresenta também dados relativos a todas as cirurgias realizadas nos hospitais públicos e que, ao contrário da área oncológica, apresentaram no primeiro semestre de 2013 o “mais baixo tempo de espera” desde 2007, o ano a partir do qual são apresentados os dados neste relatório. Até Junho foram realizadas mais de 281 mil intervenções, o que representa um crescimento de 0,3% em relação ao período homólogo. Aqui, ao contrário dos casos de cancro, houve menos entradas na lista de espera para cirurgia e há também menos gente a aguardar uma vaga. Até Junho o tempo de espera ficou nos 2,9 meses, uma quebra de 12,1% em relação a 2012. Ao todo, 13,4% dos casos foram operados fora do tempo (no ano anterior eram 14,8% e em 2007 eram 44,7%). No que diz respeito a diferenças por zonas geográficas, os doentes do Centro, Lisboa e Vale do Tejo e Algarve são os que mais esperam por uma cirurgia e que mais ultrapassam os tempos previstos na lei.

Ao mesmo tempo que os hospitais públicos viram a sua actividade aumentar, o sector convencionado viu cair quase para metade o número de doentes encaminhados pelo Serviço Nacional de Saúde por terem ultrapassado em 75% o tempo de espera recomendado. No primeiro semestre de 2012 o sector convencionado recebeu 15.166 pessoas nestas circunstâncias e em 2013 apenas 8306.

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