Rublo e bolsas russas afundam-se com ameaça de sanções

Subida de taxas de juro de emergência não conseguiu conter fuga de capitais. A perspectiva de uma crise financeira grave é um dos principais entraves à acção de Putin.

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Divisa russa está a cair para níveis inferiores aos da crise de 2009 AFP PHOTO / ALEXEY SAZONOV

A acção militar da Rússia na Ucrânia pode não estar a encontrar muita oposição no terreno, mas nos mercados Moscovo foi esta segunda-feira fortemente penalizado à medida que a perspectiva de um conflito armado e de sanções económicas por parte do Ocidente colocaram a divisa e as bolsas russas em queda livre.

Até ao início da tarde de hoje, o rublo já tinha registado uma quebra de 2,5% face ao dólar. Um euro superou logo pela manhã os 50 rublos, algo que nunca tinha acontecido desde a criação da moeda única na Europa.

Esta quebra aconteceu apesar do banco central da Rússia ter decidido, ainda antes da abertura dos mercados, realizar uma subida "temporária" da sua taxa de juro de referência de 5,5% para 7%. A autoridade monetária, que apenas tinha uma reunião agendada para o próximo dia 14 de Março, tentou contrariar a previsível fuga de capitais da economia russa, reforçando a rentabilidade potencial dos investimentos feitos em rublos. "A decisão é destinada a contrariar os riscos que surgiram no que diz respeito à inflação e à estabilidade financeira, ligados a uma subida da volatilidade nos mercados financeiros durante os últimos tempos", explicou em comunicado o banco central.

Durante o dia a autoridade monetária gastou, de acordo com a Reuters, cerca de 10 mil milhões de dólares das suas reservas a tentar defender a divisa nos mercados financeiros.

O problema é que o medo que a actual conjuntura está a provocar nos investidores superou largamente as vantagens que uma subida de taxas de juro poderia trazer. Um sentimento que provocou também uma queda abrupta da bolsa de Moscovo, que ao início da tarde tinha o seu principal índice a descer 11,3% face ao valor de fecho de sexta-feira, uma perda equivalente a 60 mil milhões de dólares no valor das empresas russas num só dia.

Esta resposta dos mercados à situação na Ucrânia acontece não só pelo clima de incerteza que um conflito armado sempre traz, mas também por causa da ameaça de sanções económicas feitas pelos líderes políticos do Ocidente à Rússia. John Kerry foi o mais claro na altura de explicar aquilo que os EUA estariam dispostos a fazer e fez questão de explicar, com detalhe, de que forma é que Rússia poderia vir a sofrer com as medidas a tomar pelas maiores potências mundiais. “Eles [o G7 e outros países] estão preparados aplicar sanções, estão preparados para isolar a Rússia do ponto de vista económico. E o rublo já está a cair, a Rússia tem desafios económicos de grande dimensão”, afirmou Kerry em entrevista ao canal de televisão norte-americano ABC.

Entre as sanções que poderão ser aplicadas, o responsável norte-americano falou especificamente da saída forçada da Rússia do G8, do recuo das empresas norte-americanas em investimentos realizados na Rússia e no congelamento de activos de cidadãos russos no estrangeiro. Esta última medida é destinada à elite política e económica russa, conhecida por ter uma grande parte da sua riqueza colocada fora do país.

Do lado europeu, as ameaças de sanções económicas são, para já, bastante mais prudentes. A isto não será estranho o facto de as relações económicas entre a UE e a Rússia serem muito mais estreitas, com importantes relações de dependência dos dois lados. A Alemanha, em particular tem muito a perder com um isolamento económico forçado da Rússia. Os investimentos das empresas alemãs na Rússia atingiam em Outubro do ano passado cerca de 16 mil milhões de euros, com participações em mais de 6000 empresas russas.

Além disso existe a questão energética. A Alemanha obtém cerca de 40% do gás que consome e 35% do combustível dos produtores russos. Tudo isto faz com que Angela Merkel tenha optado, ns sua estratégia para resolver o conflito, por não falar por enquanto da aplicação de sanções. À Agência Reuters, um diplomata alemão que não quis ser identificado deixou claro que nesta questão “os Estados Unidos tem muito menos a perder” do ponto de vista económico, justificando assim a ameaça rápida de sanções feita por John Kerry.

Rússia em posição débil
Embora seja neste momento difícil antecipar uma frente unida de sanções por parte das potências ocidentais, o que é certo é que a Rússia se encontra numa situação particularmente frágil, que pode limitar o espaço de manobra de Vladimir Putin.

Desde o início do ano que a divisa russa tem vindo a perder terreno face às principais moedas mundiais. Os investidores têm, num cenário de instabilidade em todos os mercados emergentes, retirado uma parte significativa dos seus activos da Rússia.

A subida de taxas de juro do banco central na manhã desta segunda-feira mostra a preocupação com que Moscovo assiste a estes desenvolvimentos. A continuação da queda do rublo pode significar a entrada da Rússia numa espiral incontrolada de aumento da inflação e de fuga ainda maior de capitais, que coloque o país numa situação semelhante à vivida em 2009.

O único factor positivo para a Rússia na actual conjuntura é que, por causa da ameaça de um conflito militar, o preço do crude nos mercados internacionais está a registar uma subida. Aqui, a Rússia, como um dos maiores produtores mundiais, pode vir a ganhar.

Nos países do Leste Europeu, todos eles com fortes laços económicos com a Rússia, as consequências também podem ser negativas. Isto para além da Ucrânia, que continua à espera que um pacote de financiamento do FMI salve o país da falência.

Neste cenário, não é de espantar também que nas principais praças bolsistas da Europa e dos Estados Unidos, esta segunda-feira tenha sido de perdas acentuadas. Na Alemanha, o Dax, o principal índice da bolsa de Frankfurt, encerrou a perder 3,44%. Em Londres a descida foi de 1,12%. O Dow Jones da Bolsa de Nova Iorque começou o dia com uma queda de 0,9% e seguia, perto do fecho da sessão, a perder 1,2%. Em Lisboa, o índice PSI 20 agravou a tendência negativa da abertura, de 2,1%, ao encerrar a perder 2,57%.

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