Ianukovich pede mais apoio a Moscovo: "a Rússia deve agir"

Ex-Presidente diz que mediadores internacionais do acordo que assinou com a oposição foram “enganados” e acusa EUA de terem sido “coniventes” com os opositores.

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Ianukovich apareceu em público pela primeira vez desde que saiu do país Andrey Kronberg/AFP

O ex-Presidente ucraniano, Viktor Ianukovich, afirmou que a sua fuga de Kiev foi motivada pelas ameaças à sua vida e da sua família e culpou as autoridades ocidentais pelo “caos” que domina o país. Também garantiu que nunca teve intenção de pedir uma intervenção militar à Rússia, apesar de estar surpreendido pelo silêncio de Valdimir Putin.

Viktor Ianukovich veio a público, esta sexta-feira, revelar a sua versão dos acontecimentos na Ucrânia desde a sua fuga do país, no fim-de-semana passado. Ao longo de uma conferência de imprensa de uma hora na cidade de Rostov-on–Don (Sul da Rússia), Ianukovich, que se exprimiu em russo, afirmou não reconhecer legitimidade ao actual governo ucraniano e pediu o cumprimento do acordo assinado com a oposição.

Esta era, de resto, uma posição que já tinha defendido na véspera, em declarações à agência noticiosa russa Itar-Tass. Ianukovich referiu que “os mediadores internacionais foram enganados” e que os “representantes dos EUA foram coniventes” com os opositores e devem ser “responsáveis perante os ucranianos”.

Já os novos detentores do poder são descritos por Ianukovich como um grupo de “jovens nacionalistas e pró-fascistas que representam uma minoria absoluta da população ucraniana”. Desta forma, as eleições presidenciais marcadas para 25 de Maio são por si consideradas “ilegais” e às quais se recusa a participar.

A 21 de Fevereiro, Ianukovich assinou um acordo com os líderes da oposição, que foi mediado pelos ministros dos Negócios Estrangeiros da França, da Alemanha e da Polónia e por um emissário russo. Os termos do acordo previam a realização de eleições antecipadas até ao final do ano, mas com a manutenção de Ianukovich no poder.

O então Presidente vem agora dizer que foi obrigado a abandonar o país por causa das ameaças que lhe foram feitas. “Não foi por medo, eu tinha de cumprir as condições de segurança e de mantê-las”, afirmou, questionado pelos jornalistas. Ianukovich garante regressar à Ucrânia assim que forem asseguradas as condições para a sua segurança.

Para Ianukovich, a resolução da crise política na Ucrânia passa pelo cumprimento do acordo que assinou com a oposição e apela aos mediadores internacionais para agirem como “garantes” desse entendimento. “Não vi qualquer desejo de quererem falar comigo”, nos últimos dias, sublinhou.

A reacção não se fez esperar. O ministro dos Negócios Estrangeiros polaco, Radoslaw Sikorski, culpou Ianukovich pela quebra do acordo. Segundo o responsável, um dos requisitos do acordo era o retorno à Constituição de 2004, que deveria ser votado no Parlamento e ratificado pelo Presidente. A votação aconteceu, mas Ianukovich não assinou o documento, pelo que foi ele, segundo Sikorski, a violar o entendimento.

Silêncio de Putin surpreende

À conferência de imprensa, anunciada na véspera, acorreram dezenas de jornalistas, mas vários observadores notaram que aqueles que puderam colocar questões vinham sobretudo de órgãos de comunicação estatais russos. O papel da Rússia na crise ucraniana foi, portanto, um dos pontos mais abordados.

Ianukovich revelou não se ter encontrado pessoalmente com Vladimir Putin, tendo apenas conversado com o Presidente russo por telefone. Garantiu também que não vai aceitar “qualquer tentativa para uma intervenção que quebre a integridade territorial do país”.

O ex-Presidente pareceu querer aproveitar a oportunidade para reclamar maior apoio de Moscovo. “Acho que a Rússia deve agir, e como conheço o carácter de Putin, surpreende-me porque é que ele se manteve em silêncio”, disse.

Desde a sua fuga que mesmo os deputados do Partido das Regiões, que o apoiava, se quiseram afastar de Ianukovich, descrevendo o seu acto como cobardia e apoiando a maioria dos diplomas que foram sendo propostos pela oposição. Ianukovich recusa julgar quem o fez e justifica as suas acções como “forçadas” por ameaças. “Pude falar com alguns deputados e o que eu ouvi foi aterrador”, contou.

Sobre a instabilidade na Crimeia, Ianukovich afirmou ser “a resposta natural” ao que se tem passado em Kiev. “As pessoas da Crimeia não querem seguir nacionalistas e seguidores de [Stepan] Bandera”, o nacionalista ucraniano, identificado com a ocupação nazi durante a Segunda Guerra Mundial.

Ianukovich fez questão também de reagir às recentes notícias sobre o congelamento de bens e fundos em contas bancárias na Europa. “Sou uma pessoa pública, tudo o que tinha foi declarado e estava nas minhas contas”, afirmou. Sobre as acusações de lavagem de dinheiro que recaem sobre o seu filho, Ianukovich disse nunca ter ouvido falar disso.

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