Governo prepara nova linha de apoio para empresas em dificuldades financeiras

Ministério da Economia está a desenhar o projecto em conjunto com a troika para arrancar no final de Março.

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Pires de Lima diz que no PSD “também há vozes que defendem a descida fiscal o mais depressa possível”. Rui Gaudêncio

O Governo vai lançar em breve uma nova linha de apoio para empresas em dificuldades financeiras, com o objectivo de incentivar a reestruturação de dívidas e de travar a falência de negócios viáveis. Os primeiros passos deverão ser dados já em Março, acelerados pelas críticas da troika aos mecanismos criados pelo actual executivo para aumentar a recuperação de empresas pré-insolventes. Este projecto, espelhado no relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre a décima avaliação ao programa de ajustamento, vem recuperar uma ideia antiga que tinha sido posta de parte por causa de dúvidas da Comissão Europeia.

No documento, conhecido na passada quinta-feira, a instituição presidida por Christine Lagarde refere que “na sequência de uma revisão profunda do sistema nacional de garantia mútua, foi desenhada uma nova linha de apoio para empresas viáveis que tenham completado com sucesso processos de reestruturação de dívida e reduzido os níveis de endividamento”.

Mais à frente, no memorando que acompanha o relatório, o Governo escreve que esta linha servirá para “apoiar negócios viáveis em dificuldades financeiras” e para “encorajar as empresas a renegociarem a dívida em tempo útil”, ou seja, antes de serem arrastadas para a insolvência. À semelhança do FMI, o executivo calendariza a “finalização das linhas gerais de orientação e o arranque do projecto-piloto, dentro do envelope orçamental existente, para o final de Março”. O PÚBLICO contactou o Ministério da Economia para obter mais esclarecimentos, mas não obteve resposta. Foi, no entanto, possível confirmar que a tutela de António Pires de Lima está de facto a estudar este tema, em conjunto com a troika.

A ideia não é nova. Já em 2012, quando o Governo lançou o programa Revitalizar, criando um mecanismo de negociação extrajudicial de dívidas alternativo à insolvência, o objectivo era associar-lhe um pacote de fundos para injectar dinheiro nas empresas que saíssem destes processos. Nessa altura, o ex-secretário de Estado da Economia e Desenvolvimento Regional, hoje presidente da Câmara Municipal de Viseu, garantia que 220 milhões de euros iriam ser destinados a apoiar negócios em dificuldades.

O executivo acabou, no entanto, por recuar, já Almeida Henriques tinha sido substituído no cargo, cujo raio de acção foi repartido por diferentes membros do Governo. Os fundos Revitalizar são hoje da responsabilidade do secretário de Estado da Inovação, Investimento e Competitividade, Pedro Gonçalves, mas foram reconvertidos numa linha destinada a empresas em fase de arranque ou expansão de actividade, não apoiando negócios em dificuldades financeiras.

O travão de Bruxelas

Esta mudança não poderá ser dissociada do facto de a Comissão Europeia ter levantado dúvidas sobre o projecto inicial do Governo. Tal como o PÚBLICO noticiou, em Julho de 2012 (antes de terem sido escolhidas as entidades gestoras dos fundos), Bruxelas enviou uma carta a pedir esclarecimentos sobre o destino destas verbas, chamando a atenção para o facto de estarem proibidos, ao abrigo das regras comunitárias, auxílios estatais a empresas em dificuldades. Na missiva, o Governo era instado a provar que o dinheiro não seria usado para reestruturar dívida.

Em resposta, o executivo garantiu que os 220 milhões não seriam usados para pagar dívidas, mas sim para salvaguardar a continuidade de projectos viáveis. Mas a verdade é que a ideia acabou por não avançar. Mais de um ano depois de Almeida Henriques ter anunciado verbas para apoiar empresas em dificuldades, os fundos Revitalizar para negócios financeiramente viáveis foram lançados, em Agosto último. Até Dezembro, 55,5 dos 220 milhões alocados ao programa (em que 110 milhões são suportados por fundos comunitários e outros 110 milhões por sete instituições financeiras) já estavam comprometidos junto de 16 empresas. Do valor comprometido, 25,5 milhões tinham sido executados.

Importa referir que, no memorando que acompanha o relatório sobre a décima avaliação, o Governo esclarece que a linha de apoio que está agora em estudo estará “em linha com as regras europeias sobre auxílios estatais”. Já o FMI associa este novo projecto ao facto de Portugal estar “a passar ao lado de um catalisador de reestruturação da dívida” das empresas, acrescentando que “os dados sobre o recurso aos mecanismos de reestruturação [criados pelo Governo] mostram que não há um elevado número de empresas a utilizá-los”.

O fundo refere-se ao Revitlizar e ao Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (Sireve), que também foi criado como alternativa à insolvência e substituiu um programa que já existia, permitindo a negociação com os credores fora dos tribunais. Até agora, cerca de 1500 empresas aderiram ao primeiro e pouco mais de 300 ao Sireve. O FMI deixa, por isso, um aviso: “É essencial promover a reformulação dos incentivos para promover uma maior utilização dos mecanismos de reestruturação e melhorar as perspectivas de recuperação das empresas”. Com Luís Villalobos

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