Governo admite rever em alta cenário económico durante a avaliação da troika

Para Paulo Portas, o país está a caminhar para “um ciclo económico melhor”. Para a oposição, o discurso do Governo não cola com a realidade do país.

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“Há uma tendência lenta, mas paulatina, para o desemprego registar uma redução”, diz Paulo Portas Nuno Ferreira Santos

O Governo parte para a 11.ª avaliação da troika ao programa de resgate português com a expectativa de rever em alta o cenário económico que está na base da projecção de crescimento do produto interno bruto (PIB) deste ano, que se mantém inalterada desde o início de Outubro em 0,8%.

No exame regular que se inicia na próxima semana, a 20 de Fevereiro, “é de esperar que se possa fazer uma revisão, visto que os indicadores apontam para um registo de maior confiança, de maior crescimento, de maior desaceleração, embora ainda longe [do esperado], do desemprego”, afirmou nesta sexta-feira o vice-primeiro-ministro, Paulo Portas, durante uma audição parlamentar.

No último exame regular, que terminou em Dezembro, a troika e o Governo deixaram inalteradas as previsões macroeconómicas (PIB, consumo privado, consumo público, investimento ou desemprego, por exemplo), mantendo os números que constavam da proposta de Orçamento do Estado para este ano. O que mudou desde aí? “Há uma tendência lenta, mas paulatina, para o desemprego registar uma redução [para 15,3%]”, enfatizou, referindo como indicadores positivos o crescimento das exportações (4,6% em 2013), os últimos dados do turismo e um aumento da confiança das famílias.

Se, para Portas, o país está a caminhar para “um ciclo económico melhor”, para os deputados do PS, PCP e Bloco de Esquerda que o confrontaram com um cenário bem menos optimista, nomeadamente quanto à dívida pública, o discurso do Governo não cola com a realidade do país.

Em linha com os deputados da maioria PSD-CDS-PP, Portas enfatizou o facto de Portugal ter crescido, segundo a estimativa rápida do INE, 1,6% no quarto trimestre em relação ao mesmo período do ano anterior. E lembrou que, neste momento, a previsão de crescimento do PIB para este ano é ainda de 0,8%. “Quando há crescimento homólogo e crescimento em cadeia e crescimento superior à média da zona euro, eu, senhor deputado, chamar-lhe-ia o início da recuperação”, não de uma estabilização da economia, lançou, respondendo às críticas do deputado do PS Pedro Marques.

A possibilidade de a projecção de crescimento de 0,8% ser revista foi igualmente admitida pelo ministro da Economia, António Pires de Lima. O Banco de Portugal conta igualmente que o PIB cresça 0,8%, mas mostra-se mais optimista em relação à trajectória do consumo privado (0,3%, contra 0,1% projectados pelo executivo).

Para já, o Governo prevê que o consumo público caia 2,8% este ano, aponta para um crescimento de 1,2% do investimento, para uma queda de 0,3% da procura interna, para um aumento de 5% das exportações de bens e serviços, e para uma aceleração das importações, para 2,5%.

Em relação à taxa de desemprego, o executivo previa um aumento para 17,4% da população activa em 2013, quando o valor anual estimado pelo INE acabou por se fixar em 16,3%. E para este ano a projecção do Governo é de uma subida para 17,7%, quando outras análises apontam já para um recuo (o departamento de estudos do BPI, por exemplo, estima  uma descida do desemprego para 15% da população activa, embora a projecção do PIB seja inferior à do Governo).

Vigilância da troika no pós-resgate
Quando questionado pelo deputado Miguel Tiago, do PCP, sobre “que parcela de soberania é que o Governo vai recuperar” a partir de Maio com o fim do actual resgate, o vice-primeiro-ministro defendeu que, actualmente, para obter os desembolsos do empréstimo de 78 mil milhões de euros, Portugal tem de “concordar com uma missão externa em políticas” que são submetidas ao Parlamento. Não referiu, no entanto, que, independentemente da estratégia que optar para terminar o actual programa, Portugal continuará sob vigilância da Comissão Europeia, do BCE e do FMI, tal como a Irlanda, que optou por fechar o resgate sem uma linha de crédito cautelar. “Autorizações que continuam, obviamente, a ser de protectorado”, referiu o deputado Luís Fazenda, do Bloco de Esquerda.

Antes, Portas apenas admitira que, “seja qual for a saída, com ou sem linha de crédito cautelar”, Portugal viverá “no quadro do tratado orçamental”, que impõe limites ao défice estrutural e à dívida pública. E, referindo-se a uma notícia avançada na quinta-feira pelo Diário Económico, Portas disse ter visto “por aí” que Portugal já comunicou à troika a forma de saída do actual resgate. Mas avisou: “Não é de todo verdade”.

A deputada do CDS-PP e ex-secretária de Estado do Turismo, Cecília Meireles, disse lembrar-se de quando o ponto de comparação de Portugal era a Grécia, quando, agora, a discussão “é radicalmente” com a aproximação do fim do actual resgate financeiro, que termina formalmente a 17 de Maio.

Para o PS, o Governo tem de fazer uma “avaliação séria” das condições de saída do programa. Referindo-se à emissão e dívida a dez anos desta semana, em que Portugal conseguiu 3000 milhões de euros a uma taxa de juro de 5,112%, Pedro Marques acusou o Governo de querer seguir o exemplo da Irlanda procurando obter recursos “a todo o custo” mas a juros “absolutamente insustentáveis”.

O vice-primeiro-ministro acredita que, em 2015, seja possível baixar o IRS. “Não porque seja o ano das eleições [legislativas]”, mas por “não ser possível” desagravar o impostos antes desse ano, justificou, admitindo que “a margem de manobra não é grande”.

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