Júri que avaliou propostas para venda da colecção Miró apontou fragilidades na Christie's

O processo da primeira providência cautelar interposta pelo Ministério Público para suspender a venda da colecção Miró foi consultado pela Agência Lusa e inclui além do relatório final do júri, correspondência interna da Secretaria de Estado da Cultura sobre este caso.

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A exposição das obras na leiloeira Christie’s Reuters

A leiloeira Christie’s foi escolhida para vender a colecção Miró por se destacar em vários critérios, como o sucesso de vendas e comissões, mas mostrou fragilidades nas “formalidades contratuais”, segundo o júri que avaliou as quatro propostas.

A empresa Parvalorem - detentora das 85 obras de Joan Miró cujo leilão foi esta semana cancelado pela Christie´s - tinha recebido mais três propostas das leiloeiras internacionais Bonhams, Phillips e Sotheby’s, para realizar a venda.
A avaliação das propostas, pedida pela Parvalorem a um júri de avaliação, através da sociedade de advogados PLMJ, está incluída no processo da primeira providência cautelar interposta pelo Ministério Público para suspender a venda, indeferido esta semana pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.

No processo, que a agência Lusa consultou no Tribunal, a Christie’s e a Sotheby’s aparecem como as leiloeiras que obtiveram melhor pontuação das quatro, ficando quase a par uma da outra.
No relatório final do júri, é apontado que “a análise comparativa é favorável à Christie´s, que se destaca em quase todos os critérios, exceptuando o das formalidades contratuais”.

“O seu departamento jurídico não foi considerado tão claro na exposição, nem tão pouco existiu o cuidado de responder a todos os pedidos de esclarecimento em português, como o fez a concorrente Sotheby’s”, assinala o júri.

No entanto, sublinha-se que a Christie´s se destacava particularmente nas categorias de comissões de venda, valor de estimativa, e histórico de vendas, com mais obras de Miró vendidas e menos obras retiradas de leilão.

No processo é indicado que, das 40 obras de maior valor vendidas em leilão - entre dois milhões e 20 milhões de dólares - , 22 foram vendas feitas pela Christie´s e 16 pela Sotheby´s, mais duas obras vendidas por outras leiloeiras.
Na escolha da leiloeira para a venda das obras avaliadas em 35 milhões de euros também pesou a estratégia de marketing “mais agressiva” da Christie´s.

Quanto à vertente financeira, no relatório final, o júri indica que, num cenário de venda de 75 por cento das obras acima dos 50.000 euros e 25 por cento acima de um milhão de euros, a comissão da Sotheby’s seria de cinco por cento do valor de martelo, no total do leilão. No caso da Christie’s, indica o relatório que a estimativa de venda era mais baixa, compensada pela proposta de comissões de 13,5 por cento.

Entre outros documentos sobre a Parvalorem e sobre a colecção, no processo do Tribunal é incluída vária correspondência interna da Secretaria de Estado da Cultura sobre este caso.
Há várias comunicações enviadas para o secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, pela então directora-geral do Património Cultural (DGPC), Isabel Cordeiro, sublinhando o facto de as obras de Miró terem saído do país sem as devidas autorizações.

Isabel Cordeiro pediu reiteradamente a localização das obras de Miró para serem observadas por técnicos habilitados da DGPC, e também assinalou que não havia precedente na concessão, à posteriori, de licenças de saída de obras de arte.
Há cartas - quase todas com carácter urgente - alertando para “a sensibilidade da questão face à relevância cultural da colecção e às demais circunstâncias de que se reveste este processo”.

Actualmente, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa está a apreciar uma segunda providência cautelar apresentada pelo Ministério Público para suspensão das deliberações e actos referentes à alienação das obras de Miró, que ainda se encontram em Londres, e cuja intenção de venda é mantida pelo Governo.

A Christie´s cancelou a venda das obras, depois de o caso ter chegado às instâncias judiciais portuguesas, sustentando que não havia condições de segurança para avançar.

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