Percentagem de portuguesas fumadoras quase duplicou em cinco anos

Estudo do Instituto Nacional de Saúde Pública que será apresentado no Porto diz também que 55% da população das regiões Norte, Centro e Lisboa tem "dois ou mais" factores de risco vasculares.

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A investigadora lembrou que o tabaco e a pílula juntos são grandes factores de risco para AVC Paulo Ricca

O número de fumadoras entre as mulheres portuguesas passou de 9,5%, em 2008, para 17%. Este é um dos dados do estudo “E-Cor”, que será apresentado na sexta-feira no Porto, que a investigadora do Instituto Nacional de Saúde Pública (INSA) Mafalda Bourbon considera mais "preocupantes" dada a sua relação com o risco de doenças cardiovasculares.

"Se tivermos em conta que, em 2008, os estudos da Direcção-Geral da Saúde [DGS] apontavam que havia 9,5% de mulheres fumadoras, agora estamos a falar de uma percentagem de 17%. O consumo de tabaco tem dados assustadores", disse à agência Lusa a coordenadora do estudo "E-Cor" e que será apresentado no 8.º Congresso do Acidente Vascular Cerebral (AVC) organizado pela Sociedade Portuguesa do AVC entre esta quinta-feira e sábado no Centro de Congressos do Hotel Porto Palácio, no Porto . Para já - ainda que o "E-Cor" se vá estender ao Algarve e Alentejo - o estudo de Mafalda Bourbon tem por base as regiões do Norte, Centro e Lisboa, de acordo com o mapa NUTS II de Portugal Continental.

O estudo prevê a análise de uma amostra nacional de 1700 pessoas, 340 por região. Das 1040 pessoas cujos dados já são conhecidos, 22% são fumadores. Os grupos etários estudados são: 18/34, 35/64 e mais de 65 até 79 anos com "equilíbrio" de sexos. O "E-Cor" revela que as mulheres no Centro fumam menos do que em qualquer uma das outras regiões: 12% no Centro, 20% em Lisboa e 18% no Norte.

"Os dados do tabaco são preocupantes porque, por exemplo, o fumar associado ao consumo da pílula, é explosivo e aumenta muito o risco de ter um AVC em idade jovem (...). E um AVC é muito debilitante", referiu. Outro dado "alarmante" para Mafalda Bourbon é a prevalência de excesso de peso/obesidade. "No geral 65% da população tem excesso de peso ou obesidade, o que quer dizer que das cerca de 1000 pessoas inquiridas, 650 pessoas têm excesso de peso ou obesidade", descreveu a especialista.

No Centro com mais álcool, Lisboa com sedentarismo

Com este estudo, Mafalda Bourbon pretende fazer um diagnóstico geral do país em relação aos factores de risco vasculares, mas também lançar alertas. "O nosso objectivo é produzir dados reais para que depois se possam desenhar políticas de saúde que vão tentar melhorar a realidade. Não é missão do instituto fazer esse caminho porque é a DGS que faz as normativas das várias áreas. Mas é missão do instituto produzir dados que vão depois ao encontro de estratégias de promoção da saúde", disse a investigadora da INSA.

Outros dados do "E-Cor" dão nota de que no Norte há um menor número de pessoas com colesterol elevado. Mas esta é, no entanto, a região que apresenta o menor número de pessoas que cumpre uma regra da Organização Mundial de Saúde sobre o consumo de frutas e legumes. O Centro apresenta a percentagem de dieta mais equilibrada com 37%, face a 32% de Lisboa e a 25% do Norte. O estudo revela, também, que o Centro é mais activo, uma vez que a percentagem de sedentarismo é de 27,8% face a 34% no Norte e a 41% em Lisboa.

Já no consumo excessivo de álcool, o Centro atinge a percentagem maior com 13%, com relevância para a faixa etária dos 65/79, enquanto em Lisboa é de 5% e no Norte de 4%.

"Este estudo foi desenhado para determinar os factores de risco [de AVC] mas é importante que se perceba que esses factores são modificáveis. As pessoas podem fazer a diferença se quiserem", concluiu Mafalda Bourbon.

Metade da população com um ou mais factores de risco vasculares

Cerca de 55% da população das regiões Norte, Centro e Lisboa tem "dois ou mais" factores de risco vasculares. Esta é, para Mafalda Bourbon, uma das outras principais conclusões do trabalho do INSA. "A diferença deste estudo para outros está em ver qual é o número de factores de risco existentes em cada pessoa. E o número é alarmante. Pode ser uma pessoa hipertensa que fuma ou uma pessoa obesa com diabetes", descreveu a coordenadora.

Para a especialista, o que é "ainda mais preocupante" é o facto de esta percentagem dizer respeito a factores de risco como a diabetes, a hipertensão, o colesterol elevado, o tabagismo e o excesso de peso/obesidade, não estando a ser considerados nestes 55% os hábitos de vida como a dieta ou o sedentarismo.

Mafalda Bourbon adianta que "não é faixa etária mais nova que regista mais factores de risco", a dos 18 aos 34 anos, mas considera que a percentagem nos adultos/jovens é igualmente "preocupante" até por que é, diz a investigadora, este o sector da sociedade que descura mais a prevenção. "As pessoas têm de ter noção de que têm de controlar mais a sua saúde. Na faixa 18/34, ninguém está muito preocupado com a saúde. E 20% dos adultos/jovens já têm dois factores de risco. Quantos mais se tem, a probabilidade de ter um evento cardio-cerebro-vascular aumenta exponencialmente", descreveu.

Segundo a investigadora, o que distingue o "E-Cor" de outros estudos é o facto de este conter uma "caracterização bioquímica muito grande", o que permite "determinar a prevalência do número de factores de risco por pessoa".

Os factores de risco analisados no "E-Cor" são os biológicos (diabetes, hipertensão e colesterol elevado), os de estilo de vida (obesidade/excesso de peso, consumo excessivo de álcool, sedentarismo, dieta inadequada e tabagismo) e os genéticos (antecedentes familiares de doença cardiovascular prematura). Estes são factores de risco vasculares idênticos em caso de doença cardiovascular, doença cerebrovascular e doença arterial periférica.

Mafalda Bourbon contou que a faixa etária mais "difícil de motivar a participar no estudo" foi a dos 18/34 que justificava estar a trabalhar há pouco tempo, pelo que não podia faltar ao emprego ou porque, por não se sentir minimamente doente, "não acha que a saúde seja uma prioridade", o que comprova a tese de que os adultos/jovens não apostam na prevenção. "Infelizmente o orçamento que nos deram não deu para incluir as Ilhas [Açores e Madeira]. Estamos à procura de financiamento que possa completar as sete regiões", concluiu a investigadora. Este é um projecto financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, bem como pelo INSA.
 

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