A utopia revolucionária da Fundação para a Ciência e a Tecnologia

As áreas científicas que a fundação decidiu apoiar nos novos programas de doutorais, cujos primeiros resultados foram divulgados em 2013, são “subsubáreas” da ciência e da tecnologia.

Sou totalmente adverso a esta mania revolucionária (que estranho surgir num Governo PSD/CDS) de destruir o que existe e de fugir para uma utopia mirabolante. Os países mais desenvolvidos são aqueles que constroem de forma sólida e rigorosa sobre uma base que já exista. Que preservam o que já têm. E que, passo a passo, de forma clara e bem planeada, avançam em direcção ao futuro.

O problema das bolsas (ou falta delas) da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) não surgiu há uns dias, começou nos programas doutorais, com orçamentos milionários, que são os flagships da FCT na era de Miguel Seabra. Quem quiser saber quais foram as “subsubáreas” da ciência e da tecnologia que a FCT de Miguel Seabra decidiu financiar com estes programas de doutoramento milionários, estão todas aqui.
É claro nesta listagem e nos resultados dos concursos de bolsas recentes que os temas que ganharam a lotaria dos programas de doutoramento da FCT são claramente minoritários, que estes programas doutorais minoritários são a aposta para os próximos anos em detrimento das bolsas de mérito individual, como o próprio primeiro-ministro foi levado a defender no Parlamento, que em todos os outros temas ficou um deserto de bolsas, pois a FCT gastou a maior parte do seu orçamento nestes programas e noutros projectos de âmbito muito restrito, e que os temas que foram excluídos correspondem à maioria da ciência e da tecnologia.

Concluímos assim que a estratégia para bolsas de doutoramento do Governo/FCT não vai desenvolver a economia nacional, nem agora nem no futuro, nem vai aproximar a ciência das empresas, mas vai atrofiar a maioria das áreas tecnológicas – que são todas igualmente importantes – e, como tal, vai fazer regredir a economia nacional.

Num caminho reformista (que seria o que se esperaria de um Governo PSD/CDS), saliento que as universidades portuguesas, pelo menos as melhores, já têm todas cursos de doutoramento, há dezenas de anos, ligados aos seus departamentos. Esses cursos de doutoramento é que são a base da tecnologia portuguesa, e estão naturalmente associados aos melhores centros de investigação. Funcionam bem e todos cumprem os critérios para funcionarem com qualidade. Poderiam ser melhorados? Claro que poderiam, principalmente se tivessem estabilidade e tivessem um número mínimo de alunos, que teriam se a FCT e instituições privadas atribuíssem bolsas aos alunos dos cursos de doutoramento das universidades – e não a estes enxertos que são os programas doutorais da FCT.  E poderiam ser guiados pela FCT no sentido que o Governo achasse estratégico.

Mas esta “revolução” de Miguel Seabra, esta “lotaria”, é um desperdício dos (excessivos) impostos pagos pelos contribuintes.


Professor e físico do Instituto Superior Técnico
 
 
 
 

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