PSD dividido sobre referendo da co-adopção por casais homossexuais

CDS abstém-se na proposta dos deputados da JSD, que corre riscos de chumbar.

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A JP-Porto entende que estão a ser usadas crianças para outros interesses Miguel Manso

Paulo Portas recusou correr riscos constitucionais e decidiu distanciar-se da proposta de referendo do PSD sobre a co-adopção e adopção por casais do mesmo sexo. O CDS-PP anunciou a abstenção no projecto e deixou bancada do PSD isolada (e dividida) na defesa da iniciativa. É muito pequena a margem para a proposta de consulta popular ser aprovada esta sexta-feira, depois de somados os votos contra de toda a oposição e eventuais furos da disciplina de voto ou simples ausências no plenário.

Os centristas não gostaram de saber que ficariam com o peso da responsabilidade de aprovarem a proposta de referendo, depois de a bancada do PSD se ter decidido na quarta-feira à noite pela disciplina de voto. Filipe Lobo d’Ávila, deputado e porta-voz do CDS, anunciou que o partido “não inviabilizaria” a proposta de referendo, ou seja, abstém-se, mas avisou não estar disponível para aprovar o aumento de despesa correspondente à realização do referendo, “que não é prioritário nem urgente”, caso venha a ser aprovado.

“O destino desta proposta de referendo dependerá exclusivamente da bancada do PSD”, rematou Filipe Lobo d’Ávila, numa intervenção em plenário já no final do debate sobre o referendo, que deixou a bancada do PSD gelada, apesar de a direcção ter sido informada previamente pelo CDS sobre o sentido de voto.  

O deputado centrista alertou para o risco constitucional sobre a segunda pergunta que incide sobre a adopção por casais do mesmo sexo e sobre a qual não existe um projecto legislativo em curso. Os juristas dividem-se sobre se as duas perguntas (a primeira é sobre a possibilidade da co-adopção) são referentes a matérias conexas, mas o CDS entendeu que pode ser travada pelo Tribunal Constitucional e decidiu não correr riscos, deixando a responsabilidade para o PSD.

Depois do balde de água fria do CDS, as direcções das bancadas do PS e do PSD já começaram a fazer contas sobre o número de deputados presentes nas votações desta sexta-feira. No PSD houve o cuidado de enviar sms aos deputados a chamar para a votação desta sexta-feira. Os votos contra do PS, PCP e BE somam 98 deputados, menos dez do que os 108 parlamentares do PSD. Mas na bancada do PSD há pelo menos um caso de doença justificada e outros que podem sair da sala antes da votação. Receia-se ainda que Mota Amaral, antigo presidente da Assembleia da República, se possa abster, já que foi esse o sentido da sua votação interna na bancada, depois de ter defendido que, por princípio, um deputado vota livremente e a disciplina de voto é uma excepção.

Apesar de a maioria dos deputados do PSD se ter pronunciado a favor da disciplina de voto em prol do referendo, há vozes discordantes e a própria direcção da bancada parlamentar está dividida.

Luís Montenegro, líder do grupo e que não assinou a proposta, não tomou posição na reunião da bancada, nem deu um argumento a favor do referendo. Já Teresa Leal Coelho, que é vice-presidente do partido, votou contra. Ao PÚBLICO a dirigente não quis confirmar essa posição, mas assume, a título individual, que a questão não deve ser objecto de referendo. “Esta realização individual não provoca nenhum dano, todas as crianças devem ser salvaguardadas pelo legislador”, sustenta. As restrições a que “estas crianças estão sujeitas devem ser eliminadas pelos actores políticos”, acrescentou, consciente de que “não é uma visão maioritária” no PSD.

Outro vice-presidente da bancada do PSD, Miguel Frasquilho, escusou-se a falar do referendo, mas deixou clara a sua posição a favor da adopção e co-adopção por casais do mesmo sexo. “Devia legislar-se sobre isso que era o que se estava a fazer”, afirmou ao PÚBLICO o deputado, referindo-se ao projecto do PS sobre a co-adopção que estava prestes a ser sujeito a votação final global, quando em Outubro os oito deputados da JSD apresentaram a proposta de referendo. Uma terceira vice-presidente, Mónica Ferro, também partilha da ideia de que “o processo legislativo devia ter seguido até ao fim”, mas garante que é solidária com a decisão da bancada de votar a favor do referendo.

Posições que contrastam com a de Hugo Soares, líder da JSD e também vice-presidente da bancada, que justificou o referendo com necessidade de levar o debate para lá das quatro paredes do Parlamento e de ouvir os portugueses. Mas muitos deputados, mesmo dentro da bancada, questionam-se sobre se esta iniciativa não teria sido imposta por altos dirigentes do partido, pressionados por uma ala mais conservadora, para travar uma possível aprovação do projecto do PS. Confrontado com esta hipótese, Hugo Soares garante não ter sofrido quaisquer pressões do PSD para avançar com a iniciativa. Nesta quinta-feira, no debate em plenário, o líder da JSD esteve debaixo de fogo da oposição, que o acusou de lançar uma “fraude” e de fazer “manobras dilatórias” para travar o projecto socialista, aprovado na generalidade por uma escassa margem em Maio de 2013.

Caso venha a ser aprovada, a proposta de referendo segue para a Presidência da República, que, por sua vez, pede ao Tribunal Constitucional para se pronunciar. Se for considerado inconstitucional, o diploma é devolvido ao Parlamento para permitir alterações. No caso de estar conforme à Constituição, o diploma regressa a Belém, que decide se convoca ou não o referendo.

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