Júlio Magalhães vai à ERC explicar quem lhe paga e ligação do Porto Canal ao FC Porto

A entrada do FC Porto no capital da proprietária do canal em Julho de 2011 não foi comunicada à entidade reguladora. ERC diz que Porto Canal é o serviço de programas oficial do clube.

Foto
Adriano Miranda

O jornalista e director-geral do Porto Canal, Júlio Magalhães, vai hoje à ERC – Entidade Reguladora para a Comunicação Social explicar as suas funções naquela televisão, assim como a hierarquia a que responde dentro da empresa Avenida dos Aliados, que gere o canal, e, em última instância, quem lhe paga o salário. A ERC abriu um processo para verificar se o canal mudou o projecto inicial sem a aprovação do regulador e se mudou o proprietário ou a entidade que explora o canal.

A mudança de gestão, que inclui a entrada do FC Porto no capital da proprietária do canal em Julho de 2011, não foi comunicada à entidade reguladora. Mas também é certo que não consta dos registos do Portal da Justiça ou da informação económica que o PÚBLICO consultou, apesar de ter havido mudanças nos corpos gerentes da Avenida dos Aliados. Esta empresa é detida pela Media Luso (15%) e pela FBX, Lda (82%), mas não está identificada a propriedade dos restantes 3%. A FBX e a Avenida dos Aliados têm sede na mesma morada, no Porto, e os corpos gerentes são comuns, ainda que em funções diferentes.

O PÚBLICO tentou obter um comentário de Júlio Magalhães, mas não conseguiu chegar à fala com o director do canal.

A ERC diz que houve “mudanças profundas [no canal] que foram sendo anunciadas” nos cargos de direcção, assim como na gestão, e também as alterações nos conteúdos “são públicas e notórias”. E realça a “ideia que circula no espaço público, e não é contestada, de que o Porto Canal é o serviço de programas oficial do Futebol Clube do Porto”. Esta gestão do clube, que se traduz pelo menos na escolha do director-geral e do director de Informação e na “orientação imprimida à informação e aos conteúdos” deixa o regulador “preocupado”, que alega que pode estar em causa “a transparência da propriedade e da gestão”.

O canal arrisca duas coimas cumulativas que podem ir dos 75 mil aos 375 mil euros cada e à suspensão do sinal por um período entre um e dez dias.

O antigo director de Informação da TVI é o director-geral do canal portuense desde Fevereiro de 2012, tendo substituído na altura Rui Cerqueira, que era também director de comunicação do clube azul e branco, e que ficou como director de conteúdos FC Porto do canal.

Esta audição na ERC vem na sequência de uma deliberação de Junho passado, em que o conselho regulador analisou uma queixa sobre uns protocolos do canal com duas comunidades intermunicipais e em que se levantaram dúvidas sobre a relação da televisão com o Futebol Clube do Porto. Em Julho de 2012, a ERC questionou a dona do canal sobre se tinha havido alguma alteração ao projecto inicial e à estrutura accionista e de gestão e a companhia, a Avenida dos Aliados, respondeu que se mantinha tudo igual. Ora, o regulador mostrou que está atento, lembrou as notícias saídas na imprensa sobre as mudanças de estratégia do Porto Canal e resolver abriu um processo. Que hoje conhece nova etapa.

Na deliberação sobre os dois protocolos do canal com as comunidades intermunicipais do Tâmega e Sousa e do Minho-Lima, que envolviam a produção e emissão de conteúdos informativos em troca de compra de espaço publicitário, a ERC considerou que os contratos estavam envolvidos em “grande opacidade”, que colocavam em causa a autonomia editorial e que mostravam que não havia a fronteira exigida por lei entre a informação (liberdade editorial) e o poder administrativo da empresa, abrindo um processo de contra-ordenação que pode significar uma coima de entre 20 mil a 150 mil euros. E abriu outro por a Avenida dos Aliados não ter comunicado as alterações à estrutura accionista, órgãos sociais e responsáveis editoriais, como a lei manda, cuja coima vai de 250 a 499 euros.

No final de Novembro de 2011, quando se soube que Júlio Magalhães iria trocar a TVI pelo Porto Canal, falou-se na sua ida para um cargo na SAD do Futebol Clube do Porto, com responsabilidades na estação de televisão. Há muito que se conhecem as suas preferências futebolísticas por aquele clube – e o jornalista nunca o escondeu.

O Porto Canal foi lançado em Setembro de 2006 com uma programação baseada na informação regional, sobretudo do Grande Porto. Três anos depois abriu-se mais à região Norte e no Verão de 2011 passou a ser gerido pelo FC Porto, que assinou uma parceria com a dona do canal, a espanhola Media Pro. Os azuis e brancos compraram 97% da quota pertencente à Media Luso, uma participada da Media Pro, e o acordo previa a aquisição completa do capital ao fim de três anos – o clube queria primeiro apurar a viabilidade do projecto e perceber se conseguia assegurar o financiamento de um orçamento de grelha de cinco milhões de euros anuais - e também o fornecimento de conteúdos de programação (pelo menos 60% da grelha) durante quatro anos. Desde então, a programação é dominada pelos conteúdos relativos ao clube portista – há muitas transmissões de jogos de várias modalidades, por exemplo - e os painéis de comentadores são compostos por nomes ligados ao FC Porto.
 

Sugerir correcção
Comentar