Avaliação de impacte ambiental – uma medida legislativa da maior relevância

Parece-me inquestionável que o novo regime de AIA seguiu uma estratégia correcta. Mas também entendo que a reforma poderia ter sido mais ambiciosa e estruturante.

Com aquela discrição e ausência de mediatismo que, habitualmente, caracteriza boa parte das salutares iniciativas deste Governo, entrou em vigor, no dia 1 de Novembro de 2013, o Decreto-Lei n.º 151-B/2013, de 31 de Outubro, que aprovou o novo regime jurídico da avaliação de impacte ambiental (AIA), transpondo para o direito interno a directiva 2011/92/UE do Parlamento e do Conselho.

Trata-se de uma medida legislativa da maior relevância, nomeadamente para os agentes económicos, já que introduz diversas alterações ao regime anteriormente vigente.

Desde logo no que respeita à tipologia dos projectos sujeitos a AIA, detectam-se diferenças substanciais quer no tocante aos projectos do Anexo I, quer relativamente aos projectos do Anexo II, uma vez que determinados empreendimentos não abrangidos pelo Decreto-Lei n.º 69/2000, passam, agora, a estar sujeitos a AIA (como é o caso dos loteamentos, dos conjuntos comerciais e dos parques de estacionamento, ainda que previstos em plano municipal de ordenamento do território). E, em sentido inverso, regista-se uma potencial diminuição do número de projectos submetidos a AIA. Veja-se, a título exemplificativo, que os aldeamentos turísticos com área igual ou superior a cinco hectares estavam sujeitos a AIA, tendo, agora, aquele limiar passado para 10 hectares, o mesmo sucedendo com os estabelecimentos hoteleiros, cujo limiar passou de 200 para 300 camas.

Igualmente os prazos procedimentais e de decisão, nomeadamente para prolação da Declaração de Impacte Ambiental (DIA), são alterados, com redução substancial dos mesmos. A DIA deve, agora, ser emitida no prazo máximo de 100 dias (reduzidos para 80 no caso de projectos industriais), quando no anterior diploma tal prazo era de 140 ou de 120 dias.

Por outro lado, o prazo de validade da DIA é alargado de dois para quatro anos, sendo certo que o referido alargamento também se aplica às DIA já emitidas, ao abrigo do anterior regime jurídico.

Por último, igualmente merecem aplauso as seguintes inovações: i) o procedimento (administrativo) de AIA poderá decorrer em simultâneo com o procedimento de licenciamento/autorização da construção/instalação do empreendimento; ii) é instituída a figura de “entidade acreditada”, presumivelmente de natureza privada, à qual incumbirá praticar actos até agora da exclusiva competência da administração pública, como a certificação da conformidade do estudo de impacte ambiental(EIA); iii) a desconformidade do projecto com os planos de ordenamento do território não condiciona o sentido da DIA, o que, à primeira vista, equivale a dizer que tal desconformidade não constitui, por si só, fundamento bastante para emissão de DIA desfavorável.

Parece-me inquestionável que o novo regime de AIA seguiu uma estratégia correcta. Mas também entendo que a reforma poderia ter sido mais ambiciosa e estruturante, de tal sorte que, por exemplo, ficassem consagradas as seguintes orientações: i) os efeitos jurídicos da DIA deveriam repercutir-se nos procedimentos sectoriais de licenciamento/autorização das actividades económicas, beneficiando os projectos tributários de DIA favorável de um regime aligeirado de controlo administrativo, já que nada justifica que, em sede daqueles procedimentos sectoriais, voltem a ser apreciadas e decididas, pela administração, matérias de natureza ambiental já resolvidas em sede do procedimento de AIA (e por força da DIA emitida) – tal como pouco sentido faz que um projecto que tenha obtido DIA favorável possa vir a ser inviabilizado por razões ambientais, no âmbito de outros procedimentos administrativos, como sejam os respeitantes à Reserva Ecológica Nacional, à Reserva Agrícola Nacional ou à Rede Natura; ii) os projectos inseridos em plano municipal de ordenamento do território que tenha sido objecto de avaliação ambiental estratégica deveriam ficar sujeitos a um procedimento aligeirado de AIA; iii) criação de um único procedimento administrativo unificado para efeitos de AIA e de licenciamento ambiental (regime de prevenção e controlo integrados da poluição constante do Decreto-Lei n.º 127/2013), possibilidade esta expressamente admitida pelo n.º 3 do artigo 2.º da directiva agora transposta; iv) criação de um regime especial de AIA, exclusivamente aplicável às instalações preexistentes, carecidas de DIA para efeitos de regularização administrativa das respectivas actividades, pois não adianta “tapar o sol com a peneira” e fazer de conta que o problema não existe, porque ele é real e tem que ser solucionado, já que afecta, gravemente, inúmeras empresas, nomeadamente por lhes vedar o acesso aos apoios comunitários.

Assim, o regime de AIA deveria ter uma função central e determinante no âmbito dos procedimentos administrativos de aprovação de projectos. Nos tempos que correm e numa lógica de desenvolvimento sustentável, pouco sentido fará a inviabilização de investimentos por razões que não sejam de natureza estritamente ambiental, da mesma forma que mal se compreenderá que “fique na gaveta” um qualquer empreendimento, apesar do mesmo não comportar impactes ambientais significativos. 

Conferir à AIA aquele papel, a par de uma maior articulação dos regimes jurídicos de licenciamento e de uma decisiva unificação de procedimentos administrativos, é não só desejável como indispensável à criação de um clima propício ao investimento, de que o país está tão carecido.

Advogado, sócio da MLGTS Sociedade de Advogados

 

 

 

 
 
 
 
 

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