"Será difícil começar a privatização da TAP por uma venda em bolsa"

Fernando Pinto diz que há investidores de fora da Europa interessados na privatização da empresa, que poderá ser relançada no próximo ano.

Foto
Fernando Pinto diz que a prioridade da companhia é assegurar o transporte de passageiros que tinham comprado voo para o Natal. Público (arquivo)

O presidente da TAP não tem dúvidas de que os portugueses estão ávidos por entrar na empresa, mas acredita que a venda da companhia em bolsa não é uma hipótese, pelo menos não na fase inicial da privatização, como aconteceu recentemente com os CTT. Em entrevista conjunta ao PÚBLICO e ao Dinheiro Vivo, Fernando Pinto diz que a dispersão no mercado de capitais traria "dificuldades adicionais" e avança que há manifestações de interesse no processo por parte de investidores não-europeus, para além do eterno candidato Gérman Efromovich, cuja proposta foi rejeitada pelo Governo no final de 2012.

Que balanço faz do desempenho da TAP em 2013? O grupo vai voltar a registar prejuízos?
Neste momento ainda é difícil prever se vamos ter lucros. Tenho muita esperança, mas não tenho certezas. O Verão foi excelente, muito melhor do que o do ano passado. Mas o que mais nos surpreendeu foi Setembro e Outubro, que foram excepcionais.

O que está a complicar as contas e o impede de ter certezas de que haverá bons resultados?
O mês de Dezembro. Temos de ver como vai ser. Tal como Novembro, é um mês fundamental para fechar as contas do ano. Posso dizer que estamos melhor até agora do que estávamos no ano passado por esta altura. Até ao final de Outubro, o crescimento no número de passageiros foi em redor de 5%.

Mas pressente que este Dezembro vai ser pior do que o ano passado?
Não, mas há muitos pontos de interrogação. Por exemplo, Novembro foi muito bom em termos de ocupação, mas não acreditamos que tenha tido o mesmo desempenho ao nível das tarifas. Provavelmente não e, por isso, será um mês negativo como nos outros anos. Mas a questão não é só de tráfego, é de fecho de todas as contas do grupo. Há uma série de factores que só entram no final do ano.

Como o caso da deficitária empresa de manutenção no Brasil? Os resultados sempre serão melhores este ano?
Continua a melhorar todos os meses face ao ano passado. Tem havido progressos constantes, mas infelizmente ainda não vamos atingir um resultado positivo. Definitivamente vamos estar melhores do que no ano passado, agora se vamos alcançar a meta é uma dúvida.

Em relação à empresa de handling Groundforce, já será um ano de lucros?
Já será um ano de equilíbrio. Estamos satisfeitos com a parceria [firmada em 2012 com a venda da maioria do capital ao grupo Urbanos]. Desde o ano passado já tínhamos um grau de satisfação grande com o desempenho da empresa e 2013 tem sido um ano de consolidação. Há muito para fazer e melhorar, mas tem tido uma evolução muito boa. É preciso lembrar a situação que houve anteriormente [quando o parceiro era o grupo espanhol Globalia], em que houve uma terrível degradação e problemas muito grandes.

O seu mandato já terminou há algum tempo. Já foi informado pelo Governo sobre a continuidade da actual equipa de gestão?
Para ser muito sincero, não perguntei. O que estou a fazer é continuar com o objectivo da privatização. Se o Governo pensar de forma diferente, tudo bem.

Mas já é certo que a privatização vai recomeçar em 2014?
Há essa intenção, sem dúvida. O Governo mantém esse objectivo, como tem dito.

Como encarou as recentes declarações do primeiro-ministro sobre a TAP, quando se referiu à privatização da companhia como "um problema sério”?
Ele não disse bem isso. O que ele disse é que tem a preocupação de fazer um bom processo de privatização. A TAP não é um problema. É uma boa solução para Portugal e ele sabe disso. É só compará-la com todas as empresas do Estado, nomeadamente as do sector dos transportes. A TAP é um grande ganho para Portugal.

O problema é a privatização?
O problema é fazer uma boa privatização. É um problema que ele tem na mão e eu concordo com ele.

Sente que há melhores condições agora para vender a empresa?
É difícil de dizer. Se perguntar se a empresa está melhor, a resposta é sim, tem vindo a melhorar ano após ano. Se isso valoriza a empresa, é discutível, porque tem muito a ver com o mercado.

Mas as previsões parecem indicar que a indústria da aviação também está a melhorar.
A situação geral das restantes empresas europeias não mudou muito. Continuam a ter os seus problemas para resolver. Basta olhar para as três grandes e percebe-se que ainda estão nessa fase de processo interno. Mas que existem outras hipóteses, existem.

Há companhias de fora da Europa a manifestar interesse?
Sim, há. Há outras discussões e negociações. Parece-me que agora está a correr melhor, mas a verdade é que o processo ainda nem recomeçou. Quando recomeçar, aí sim, vai assumir outra dimensão.

O Governo tem dito que não avançará se só houver um interessado. Concorda?
Isso permite ter uma maior escolha. Agora o mais importante de tudo é que o interessado seja alguém que realmente interessa em termos estratégicos para a empresa e para o país.

Mas o fracasso da primeira tentativa de privatização parece mostrar que isso não chega. O projecto estratégico até foi aprovado pela administração da TAP, mas a proposta feita por Gérman Efromovich acabou por ser recusada.
Houve um problema na negociação com as garantias. Mas, para mim, nem foi nada disso. O que houve foi um problema de timing. O momento para concluir o processo aconteceu no final de Dezembro. Quer pior momento do que esse para se conseguir garantias e tudo o que era necessário, num processo complicado como este? O Governo está plenamente consciente da importância que a TAP tem para o país. Não há dúvidas nenhumas. Somos um dos grandes exportadores, um dos maiores empregadores, uma empresa que cresce na crise, que não depende do Estado em termos financeiros. O empréstimo que teve de ser concedido no final do ano passado [a Parpública concedeu um crédito de 100 milhões de euros à companhia], por causa do processo de privatização, foi pago imediatamente. Hoje não devemos nada. Principalmente, é a empresa que traz turistas para Portugal e que leva e traz negócios. A empresa é fundamental e por isso tem de ser bem privatizada.

A pressão para cumprir o programa de ajustamento não poderá pôr isso em causa?
Não vejo que seja um problema. O Governo não está pressionado. Dentro do contexto europeu, faz sentido que as empresas sejam privatizadas e a TAP precisa de capital. De resto, não há pressa nenhuma. A empresa é auto-sustentável, tem a sua própria estratégia de crescimento.

O sucesso da venda dos CTT em bolsa fez emergir alguma especulação em redor à possibilidade de esse modelo ser adoptado na privatização da TAP. Acredita que poderia ser a solução?
Isso tem de ser perguntado ao Governo. O secretário de Estado Sérgio Monteiro [que tutela as áreas das Infra-estruturas, Transportes e Comunicações] já tem falado sobre isso e eu acho que ele tem razão quando refere que existem dificuldades adicionais no caso da TAP. Mas não tenho dúvidas de que seria o desejo de muitos portugueses ter um pedacinho da companhia.

Essas dificuldades são ultrapassáveis e poderá ser este o caminho?
O futuro é esse, mas talvez não seja a primeira etapa. Será difícil começar-se por aí.

Se a ideia continua a ser a venda directa a um investidor e se há grupos de fora da Europa interessados, ainda há a esperança de que as barreiras que hoje existem que impedem que esses grupos possam ter a maioria do capital de uma empresa europeia sejam derrubadas?
Eu não esperaria por isso. É um longo caminho. Todos sabemos quanto tempo demora uma decisão desse tipo.

Não lhe causa algum incómodo o facto de a venda dos CTT ter sido resolvida em seis meses e a da TAP ser prometida há mais de 20 anos?
É verdade, começou a falar-se do tema antes de eu chegar à TAP [no ano 2000). Mas temos de analisar as várias etapas. Primeiro, a empresa ia ser privatizada através de um acordo com a Swissair e isso não aconteceu por razões que são alheias à TAP. Depois, enquanto continuávamos o processo, ocorreu o 11 de Setembro e ficou tudo parado. E, quando estávamos prestes a recomeçar, vieram os anos de 2008 e 2009, com uma grande crise mundial. No ano passado, reiniciou-se o processo de um modo mais forte. Não vejo nada de estranho. E continuo a dizer: a TAP não foi privatizada ainda não por causa do perfil da empresa, até porque tem uma dívida perfeitamente aceitável dentro dos moldes internacionais. Aliás, é muito menos endividada do que as grandes empresas que conhecemos. Tem o seu mercado de nicho próprio, com uma boa presença em África e na América do Sul, equilibrada com uma óptima presença na Europa. Tudo isso é fundamental. E é uma empresa que tem custos abaixo da média do mercado europeu. Nós temos custos competitivos e por isso conseguimos concorrer inclusivamente com as companhias low cost.

Imagina-se a sair da TAP sem que a empresa esteja privatizada?
A minha meta é essa. Vim para a empresa para isso, mas houve todo um processo de construção que me deixa orgulhoso. Penso que coroar isso seria trazer capital através da privatização. Acho que ninguém duvida de que a TAP é hoje uma empresa melhor. E não é um trabalho meu. É um trabalho de muitas pessoas. Nenhuma empresa da Europa, à excepção da Turkish Airlines, cresceu tanto nesta última década. A TAP é uma referência.

Esse crescimento tem sido mais difícil nos últimos anos, devido às imposições do Orçamento do Estado em relação ao congelamento das contratações. Conseguiram autorização do Ministério das Finanças para recrutar mais trabalhadores ou estão a fazê-lo, mesmo sem luz verde?
Esse processo está numa fase final. Os estudos já foram feitos para que haja cobertura em termos legais. A verdade é que a empresa continua, felizmente, a crescer, o que significa mais emprego e mais oportunidades de turismo. Há um reconhecimento do Governo em relação a isso e nós vamos ter a autorização, não tenho dúvidas.

Mas continuam a contratar sem essa autorização?
Houve uma autorização tácita do Governo para se continuar com esse processo para que a empresa não seja prejudicada, mas nós precisamos de cobertura legal para isso. Já há um trabalho feito, que mostra que, de acordo com a lei, há determinadas condições em que as empresas podem recrutar.

E em relação aos cortes salariais no Estado. Confirma que a TAP manterá o regime de adaptação?
Agora temos de reiniciar um processo de conversas com o Governo, o que ainda não aconteceu. Estamos a fazer os nossos estudos e vamos entregá-los obviamente ao Governo. Mas até ao final do ano é impossível. Há todo um trabalho de casa muito difícil de fazer.

Vão voltar, portanto, a pedir um regime de adaptação aos cortes, como fizeram em anos anteriores?
Sim. São 70 páginas de Excel, para se ter uma ideia. Estávamos a aguardar [pela aprovação do Orçamento do Estado].

A jornalista viajou a convite da Star Alliance

 

 

 


 
 
 
 

Sugerir correcção
Comentar