Sírios foram encaminhados por uma rede para Portugal

O destino dos 74 cidadãos era um país do Norte da Europa.

Foto
Inspector do SEF não foi autorizado a entrar no aeroporto de Bissau Rui Gaudêncio

Os 74 cidadãos sírios que chegaram na manhã de segunda-feira ao aeroporto da Portela foram encaminhados para Portugal através de uma rede de imigração ilegal. Foi esta estrutura que lhes municiou passaportes turcos falsos e que os guiou através da Turquia e Marrocos até à Guiné-Bissau, onde tomaram o voo TP202 da TAP para Lisboa.

Ainda não foi apurado o montante que pagaram para, com a chegada à capital portuguesa, terem acesso a território da União Europeia. Aliás, o seu destino final não é ficarem em Portugal, mas dirigirem-se para um país do Norte da Europa. Este método já foi utilizado há alguns meses por outro grupo de emigrantes árabes que saíram de Bissau, passaram por Lisboa e rumaram a vários países europeus.

Se tudo indica que a guerra civil na Síria está na origem da sua saída clandestina daquele país, por vezes este tipo de emigração com destino a outros países europeus tem sido aproveitada por elementos com antecedentes de radicalismo. Consciente deste risco, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) está analisar com cuidado os pedidos de asilo feitos pelos 74 cidadãos sírios, que serão ouvidos individualmente. Um dos objectivos das autoridades nacionais é perceber quanto e a quem pagaram os passageiros para conseguirem chegar a Lisboa. A rota utilizada passou pela Turquia, onde os sírios embarcaram num voo que fez escala em Marrocos e seguiu para a Guiné-Bissau. Aí apanharam o voo para Lisboa. Uma fonte do SEF explicou ao PÚBLICO que esta rota tem sido utilizada pelos sírios para chegar à Europa, sublinhando que este tipo de operação implica um gasto avultado.  

Os serviços de segurança portugueses consideram a ligação aérea Bissau-Lisboa como a mais problemática, pela sua utilização pelas redes de narcotráfico sul-americanas, especialmente de colombianos e mexicanos, de tráfico de armas brancas e de mulheres que depois são exploradas sexualmente, em redes de prostituição na Europa – o que determinou medidas acrescidas, como um maior controlo dos agentes do SEF naquela ligação aérea.

Ao oficial de ligação do SEF em Bissau não foi autorizada a entrada no aeroporto momentos antes da partida do voo TP202. As autoridades guineenses confirmaram ao PÚBLICO este episódio, alegando que tal agente não tinha visto de entrada, pelo que não podia sair do avião. Uma situação que não é inédita, assegura o ministro que tem a função de porta-voz do Governo de transição, Fernando Vaz, e que visa impedir os inspectores do SEF de verificarem a documentação dos passageiros que embarcam para Lisboa em território da Guiné sem terem poderes legais para o fazer. No passado, explica o mesmo responsável, os inspectores portugueses chegavam a fazer triagem de passageiros à porta do aeroporto.

Segundo Fernando Vaz, o Governo guineense – cuja legitimidade não é reconhecida nem por Portugal nem pela União Europeia, por ter resultado de um golpe de Estado – não foi contactado até agora pelos seus homólogos portugueses para discutir caso. "Diz-se em Portugal que a situação põe em causa as relações diplomáticas entre os dois países. Mas quais relações, se elas não existem?", observa o mesmo porta-voz. O assunto foi, porém, debatido na reunião de hoje do Conselho de Ministros guineense, tendo os titulares das pastas da Administração Interna e dos Negócios Estrangeiros sido encarregados de apresentar relatórios sobre o sucedido no aeroporto de Bissau "o mais brevemente possível".

Os 74 cidadãos sírios estão agora entregues ao Conselho Português para os Refugiados (CPR) e à Segurança Social, que informou nesta quarta-feira que está a proceder à sua avaliação e caracterização individual e familiar.

A presidente do CPR, Teresa Tito Morais, disse entretanto à agência Lusa que os refugiados — 51 adultos e 23 menores — já pediram asilo político a Portugal, adiantando que vão ficar no país à espera que lhes seja garantido o estatuto de refugiados.

“O processo pode demorar um ou dois meses. Vão começar a ser ouvidos para se perceber os motivos e depois será emitida uma decisão. Para já foram admitidos, depois vamos ver se têm acesso ao estatuto de refugiado, a uma protecção humanitária ou se, pelo contrário, há algum de entre eles que não reúne condições para o estatuto”, referiu.

Até lá, e nos próximos dias, ficarão alojados em centros da Segurança Social, da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e na Colónia Balnear O Século.
 
 

Sugerir correcção
Comentar