Atribuídos os primeiros Prémios Neurociências da Misericórdia de Lisboa

Duas equipas, uma da Universidade do Minho e a outra da Universidade de Coimbra, vão receber 200 mil euros cada uma para desenvolver projectos de investigação, respectivamente na área das lesões vertebro-medulares e das doenças neurodegenerativas ligadas ao envelhecimento.

A célula amarela no centro apresenta uma acumulação anormal da proteína defeituosa responsável pela doença de Huntington
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A célula amarela no centro apresenta uma acumulação anormal da proteína defeituosa responsável pela doença de Huntington Steven Finkbeiner/Wikimedia Commons
A equipa de António Salgado quer integrar várias abordagens terapêuticas das lesões vertebro-medulares
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A equipa de António Salgado quer integrar várias abordagens terapêuticas das lesões vertebro-medulares DR
Visão artística de um hidrogel com células encapsuladas, material que a equipa de António Salgado vai testar
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Visão artística de um hidrogel com células encapsuladas, material que a equipa de António Salgado vai testar Harvard Bio-Optics Lab

Os dois vencedores, entre 79 candidaturas, da primeira edição dos Prémios Santa Casa de Neurociências, atribuídos pela Misericórdia de Lisboa, foram anunciados esta quinta-feira.

Um dos galardões, o Prémio Melo e Castro, no valor de 200 mil euros, pretende promover a descoberta de potenciais soluções terapêuticas para as pessoas afectadas por lesões vertebro-medulares traumáticas. Foi atribuído à equipa liderada por António Salgado, do Instituto de Investigação em Ciências da Vida e Saúde da Universidade do Minho, pelo seu projecto de desenvolvimento de uma terapêutica que integrará várias abordagens, até agora utilizadas de forma isolada, para obter “algum impacto na qualidade de vida” dos doentes com lesões congénitas ou adquiridas da espinal medula.

Mais precisamente, explicam os cientistas na apresentação do seu projecto, o trabalho irá consistir em conjugar a administração de anti-inflamatórios e de uma enzima que reduz a “cicatriz” provocada pela lesão; e o implante, no local da lesão, de hidrogéis nos quais se encontram encapsuladas células estaminais (para ajudar a regenerar os tecidos) e células da mucosa olfactiva (para promover a formação do invólucro, cujo principal ingrediente é uma proteína chamada mielina, que reveste as fibras nervosas e permite a transmissão dos sinais entre neurónios).

Os cientistas deverão realizar estudos em animais que permitam por um lado melhorar os resultados obtidos com os fármacos e, por outro, a eficácia dos hidrogéis, aos quais tencionam acrescentar ainda substâncias biológicas que promovam a migração das fibras nervosas e a diferenciação neuronal.

O outro galardão, o Prémio Mantero Belard, igualmente de 200 mil euros, tem como objectivo promover a investigação científica e clínica das doenças neurodegenerativas associadas ao envelhecimento, tais como a doença de Alzheimer. Nesta primeira edição, o prémio contempla um projecto de investigação sobre a doença de Huntington desenvolvido pela equipa de Ana Rego, do Centro de Neurociências e Biologia Celular da Universidade de Coimbra. Esta doença genética, hereditária e incurável, é causada por um defeito no gene de uma proteína chamada huntingtina que destrói progressivamente certas regiões do cérebro – nomeadamente o córtex, a camada exterior do cérebro responsável pelas funções intelectuais humanas –, levando as suas vítimas à demência e à morte.

Os cientistas tencionam estudar um potencial mecanismo responsável pela neurodegenerescência característica desta doença: o chamado “stress oxidativo” – que produz, entre outros, radicais livres tóxicos para os neurónios – causado pelo mau funcionamento das mitocôndrias (as “baterias” das células). Aos estudos em animais, que envolverão técnicas de imagiologia cerebral, seguir-se-ão, explicam os cientistas no resumo do seu projecto, análises por ressonância magnética do cérebro de pessoas em estados pré-sintomáticos e sintomáticos da Huntington, “para estudar o impacto do stress oxidativo nas funções dos circuitos” cerebrais afectados pela doença.

O Prémio Mantero Belard deve o seu nome ao benemérito que, em 1974, deixou à Misericórdia de Lisboa uma parte significativa dos seus bens, com a obrigação, nomeadamente, de conceder três prémios pecuniários anuais distintos, os prémios Nunes Correa Verdades de Faria, destinados a galardoar as pessoas que mais tenham contribuído para o cuidado dos idosos desprotegidos, para os progressos na medicina na terceira idade e para o tratamento das doenças do coração.

Por sua vez, o Prémio Melo e Castro deve o seu nome ao antigo provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e ex-subsecretário de Estado da Assistência, que, em 1955, planeou um projecto que visava o tratamento de deficientes motores. Por sua iniciativa, foi inaugurado, em 1966, o Centro de Reabilitação de Alcoitão, em Cascais.

O júri dos prémios, presidido pelo neurocirurgião João Lobo Antunes, integra personalidades científicas como Alexandre Quintanilha (ex-director do Instituto de Biologia Molecular e Celular da Universidade do Porto), Paulo Correia de Sá (Universidade do Porto), Catarina Resende de Oliveira (Universidade de Coimbra), Jorge Laíns (Sociedade Portuguesa de Medicina Física e de Reabilitação), José Pimentel (Sociedade Portuguesa de Neurologia), Rui Costa (Sociedade Portuguesa de Neurociências e Fundação Champalimaud) e ainda George Perry, da Universidade do Texas, especialista mundial da doença de Alzheimer.

A Misericórdia de Lisboa tem como parceiros científicos nos novos prémios as universidades de Lisboa, do Porto e de Coimbra, a Sociedade Portuguesa de Neurologia, a Sociedade Portuguesa de Neurociências e a Sociedade Portuguesa de Medicina Física e de Reabilitação.

A cerimónia de entrega dos prémios decorreu esta quinta-feira ao fim da tarde no Pavilhão Meo Arena, em Lisboa.
 
 

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