VIH/sida, as vitórias e os retrocessos

Este é um retrocesso que nos pode sair caro e para o qual teremos, mesmo, de arranjar soluções.

Trinta anos é demasiado tempo e, ao mesmo tempo, tão pouco, para tudo o que neles se deu depois de ter sido detectado em Portugal o primeiro caso de VIH. Desde os primeiros tempos que a luta não tem sido apenas contra a doença, mas também contra o estigma, os medos, as violências associadas à marginalização dos infectados.

Tal como outrora o cancro (hoje já encarado como uma doença transversal a toda sociedade e a todas as classes), também a sida foi vista como uma espécie de peste moderna, difundindo-se sobre ela inúmeras falsidades que provocaram, para os que com elas sofreram, danos irreparáveis. E se isto foi assim em Portugal, ainda é assim em muitas zonas do globo, onde a exclusão e a perseguição são “leis” da rua para os que, por infelicidade sua, contraíram o vírus da imunodeficiência humana (VIH), que está na origem da síndrome da imunodeficiência adquirida (a sida), o grau mais elevado deste tipo de doença. Mas é de uma doença que se trata, não de uma praga ou de uma nova espécie de peste. Com os anos e o cair das barreiras e dos medos, fomos aprendendo isto, mas nem todos, nem todas à mesma velocidade e com as mesmas consequências sociais. Pelos números que hoje divulgamos (e há sempre nesta data, 1 de Dezembro, Dia Mundial de Luta contra a Sida, a tentação de rever os números), o número de infectados no mundo aumentou 17,7% desde o início do milénio (30 milhões em 2001 contra 35,3 milhões em 2012), mas o número de novas infecções baixou 32,4% (de 3,4 milhões para 2,3 milhões). Causa primeira: menos mortes (1,9 milhões em 2001 contra 1,6 milhões em 2012) e uma capacidade, sobretudo nos países mais ricos, de sobreviver mais anos com a doença.

Mas se olharmos para África o cenário é bem mais grave: a Suazilândia, o Botswana e o Lesoto têm taxas de infecção acima dos 20%, enquanto África do Sul (17,8%), Zimbabwe (14,7%), Namíbia (13,3%), Zâmbia (12,7%), Moçambique (11,1%), Malawi (10,8%) e Uganda (7,2%) completam o quadro dos dez países mais infectados do mundo. A par disto, mantém-se ainda “o estigma da discriminação”, como fez questão de acentuar ontem o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, na sua mensagem a este propósito. “Ainda há sinais preocupantes”, disse ele, “de que algumas regiões e países estão a ficar para trás” em relação aos sinais de progresso dados em “grande parte do mundo”. E, a pensar nesses países, Ban Ki-moon falou na necessidade de “quebrar as barreiras ainda existentes, incluindo leis punitivas e exclusão social, para que possamos chegar a todas as pessoas que não têm acesso ao tratamento e serviços” de VIH.

Sem acesso aos tratamentos: é isto que agora, num país como Portugal, onde os números de infecções têm vindo a diminuir, surge como problema do momento. Devido à crise e ao preço dos transportes, já há muitos os doentes que não vão buscar os medicamentos de que necessitam aos hospitais. O risco é, como dizem os especialistas, levar o VIH a um estádio mais grave, a sida, necessitando de medicamentos mais fortes e mais caros. Este é um retrocesso que nos pode sair caro e para o qual teremos, mesmo, de arranjar soluções.
 
 
 

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