Jornal de Angola condiciona cooperação estratégica a actuação da Justiça em Portugal

Portugal é apontado como “país onde estão a ser cozinhadas todas as campanhas contra a honra e o bom-nome de altas figuras do Estado” angolano, escreve o jornal um dia depois do discurso do Presidente angolano. Rui Machete afirma que vai ser encontrada uma solução para o conflito diplomático aberto.

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O Presidente angolano durante a visita oficial a Portugal em 2009 Nuno Ferreira Santos

O Jornal de Angola elogia, esta quarta-feira, o Presidente José Eduardo dos Santos por denunciar “pela primeira vez” e “corajosamente as fontes de intrigas" que em Lisboa "são lançadas para manchar a honra de altas figuras do Estado”. Já o ministro dos Negócios Estrangeiros português, Rui Machete, se mostra confiante de que vai ser encontrada uma solução para o conflito diplomático aberto.

Num editorial, não assinado e publicado um dia depois de José Eduardo dos Santos dizer num discurso na Assembleia do seu país que “o clima político actual” com Portugal “não aconselha à construção da parceria estratégica antes anunciada”, o Jornal de Angola começa por referir que “os fomentadores do sistema” e as “organizações ocidentais” que impuseram a “democracia representativa” e “a economia de mercado” a Angola, agora, gostando ou não, têm de se “habituar à realidade” e a realidade é aquela que foi “exposta pelo chefe de Estado” no seu discurso sobre o estado da nação.

E a realidade, continua, é que “os angolanos comandam a economia e dominam o mercado”, deixando claro que “em Angola ninguém troca matérias-primas estratégicas” por “elogios enganadores”.

Só na segunda parte do editorial intitulado “A nação é assim”  Portugal é directamente apontado como “país onde estão a ser cozinhadas todas as campanhas contra a honra e o bom-nome de altas figuras do Estado”. E fazem-no, sugere, porque “os representantes dos grandes interesses internacionais não querem a concorrência dos empresários angolanos”, para depois dizer: “Ela existe, está sempre presente. No desespero, aqueles que levam de Angola milhares de milhões de lucros todos os anos mandam também os seus agentes lançar calúnias contra altas figuras do Estado. Isso não pode ser.”

O autor implicitamente sugere que a referência a Portugal no discurso de José Eduardo dos Santos é também um aviso ao poder português, além de ser “um marco histórico na cena política”, porque denuncia “pela primeira vez” e “corajosamente as fontes de intrigas e calúnias que diariamente são lançadas para manchar a honra de altas figuras do Estado”.

O editorial centra o problema numa cooperação estratégica que irá, em muito, depender da postura do Ministério Público e dos titulares do poder judicial em Portugal.

À chegada à Cidade do México, onde acompanha uma visita oficial do primeiro-ministro português, Rui Machete descartou responsabilidades na actual situação diplomática. Questionado sobre se vai ser encontrada uma solução para o problema com Angola, o ministro responde: “Vamos encontrar, vamos.”

Por sua vez, o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, remeteu declarações à comunicação social para mais tarde.

Poder judicial como alvo
Tendo em fundo as notícias da abertura de uma investigação na Procuradoria-Geral da República portuguesa a altos representantes do Estado angolano ou figuras próximas de José Eduardo dos Santos, a partir do final do ano passado, o jornal não ataca directamente o poder judicial português, mas deixa dito que, pela forma como as coisas se estão a desenrolar, “não há condições para prosseguir uma parceria estratégica”.

O jornal, que funciona como órgão oficial do MPLA de José Eduardo dos Santos, conclui que Portugal não é digno de uma relação com Angola, enquanto a situação se mantiver num país onde “os criminosos são impunes e podem caluniar e desonrar altas figuras do Estado angolano” e onde os portugueses “reconhecerem que é impossível impedir o Ministério Público de violar gravemente o segredo de justiça”.

E avisa: “Se em Portugal titulares do poder judicial podem violar o segredo de justiça para desonrar os nossos legítimos representantes, à boa maneira colonialista, então o melhor é os responsáveis políticos assumirem com coragem que Portugal não tem condições para se relacionar, de igual para igual, com Angola.”
 
 
 
 

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