Congresso lança a confusão ao insistir em votar nova proposta orçamental

Quando se esperava um acordo no Senado para pôr fim à crise orçamental e reabrir o Governo federal, as negociações foram suspensas com a apresentação de uma nova versão republicana.

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A liderança republicana do Congresso desenhou uma nova versão de acordo orçamental Mark Wilson/AFP

Numa jogada de antecipação aos seus correligionários do Senado, os republicanos da Câmara de Representantes decidiram avançar com a sua própria proposta orçamental para pôr fim à paralisação do Governo federal dos Estados Unidos e, a dois dias do fim do prazo, evitar o "default" do país por exaustão da sua capacidade de endividamento.

Na verdade, tratava-se de uma "contraproposta" – prontamente rejeitada pela Casa Branca e pelos legisladores do Senado, que estavam à beira de fechar um compromisso temporário para o financiamento do Governo até Janeiro e o aumento do tecto da dívida até Fevereiro. "Essa lei não pode passar no Senado e não vai passar no Senado", garantiu o líder da maioria democrata, Harry Reid.

Em mais uma drástica reviravolta do processo legislativo, a liderança republicana do Congresso desenhou uma nova versão de acordo orçamental, que pegava nos termos negociados pelos democratas e republicanos do Senado e acrescentava-lhes a sua principal exigência da facção do Tea Party: um corte nas verbas para o funcionamento da reforma do sistema de saúde aprovada pelo Presidente Barack Obama (e baptizada de Obamacare).

"O nosso projecto melhora de forma significativa a proposta que está a ser discutida no Senado", considerou o congressista republicano da Califórnia, Darrell Issa, no fim da reunião da bancada conservadora em que o novo plano foi apresentado. Mas alguns dos seus colegas de bancada não ficaram nada satisfeitos com a solução posta em cima da mesa pelo speaker John Boehner. "Fomos de mal para pior", comentou o congressista Blake Farenthold, do Texas.

Ao princípio da manhã, a grande incógnita era saber se o senador republicano Ted Cruz aceitaria votar o plano (praticamente fechado) do Senado – recorde-se que foi um "filibuster" do texano que inviabilizou a votação do orçamento. Mas rapidamente a dúvida passou a ser até onde o Tea Party está disposto a ir no seu braço-de-ferro com a Casa Branca: arriscará a queda no precipício?

A diferença entre os membros da bancada republicana ilustrava as dificuldades do speaker do Congresso para garantir a passagem da sua própria solução de compromisso: no fim da reunião, era claro que Boehner não tinha os 217 votos necessários. "Ainda não decidimos o que vamos fazer. Estamos a fazer todos os possíveis, a falar com todos, para ver se ainda é possível votar alguma coisa hoje", admitiu, desolado, numa conferência de imprensa que durou menos de quatro minutos e enfureceu a Casa Branca.

Obama recusa chantagem
"O Presidente já disse repetidamente que os membros do Congresso não podem exigir um resgate pelo cumprimento das suas responsabilidades básicas. Mas infelizmente, a última proposta dos republicanos é mais uma jogada partidária do pequeno grupo ligado ao Tea Party que forçou o encerramento dos serviços do Governo", criticou a porta-voz do Presidente, Amy Brundage.

A mensagem da Casa Branca nas entrelinhas não podia ser mais clara: o Presidente jamais aceitará uma proposta orçamental que faça chantagem com o Obamacare ou com o risco de "default". E a parada não podia ser mais alta, conforme lembrou a mesma assessora. "Dentro de dois dias, os EUA vão chegar ao limite do endividamento. Os democratas e republicanos do Senado têm estado a trabalhar de boa-fé, num esforço louvável para acabar com esta crise totalmente fabricada e que já causou sérios prejuízos às famílias e empresas americanas. Era bom que o Congresso fizesse o mesmo", advertiu.

Para poder cumprir as suas obrigações financeiras até ao fim do ano, o Governo precisa de uma autorização para alargar a capacidade de endividamento em pelo menos 1,1 biliões (milhões de milhões) de dólares. Segundo as estimativas, o limite de 16,9 biliões de dólares da dívida pública será alcançado nesta quinta-feira: a partir de então, o país não poderá recorrer ao financiamento dos mercados para proceder a pagamentos que vão dos juros dos títulos do Tesouro, aos salários dos funcionários públicos, reembolsos da Segurança Social e contratos do sector da defesa.

Boehner sob fogo
Do lado do Senado, o optimismo com uma solução breve para a crise esfumou-se assim que os congressistas republicanos deram conta da sua intenção de votar uma proposta alternativa. "Não podemos falar num plano, mas antes num ataque ao bi-partidarismo", reagiu Harry Reid, que acusou o speaker do Congresso de ter cedido à pressão da ala radical do seu partido "para se preservar no cargo à custa do país".

As negociações em curso foram temporariamente suspensas, à espera do próximo passo da Câmara. "A bola agora está do lado deles, só nos resta esperar pela sua jogada", confessou o senador republicano Roy Blunt.

Os líderes democratas de ambas as câmaras do Congresso foram chamados para uma reunião de emergência com o Presidente Barack Obama, para discutir uma saída para o impasse.

Para muitos comentadores, a única solução possível depende da vontade de Boehner em fazer frente à insurreição interna do seu partido. Se o speaker não for capaz de alcançar os votos necessários para aprovar a sua versão, a única alternativa que lhe resta é convocar o hemiciclo e colocar a proposta do Senado à votação.

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