GNR confirma que deixou de entregar incendiários directamente à PJ

GNR passou a entregar casos ao Ministério Público para uniformizar procedimentos, mas há quem fale em "querelas" com a PJ.

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A GNR também tem competência na investigação de incêndios mas só nos casos de negligência PÚBLICO/Arquivo

A Guarda Nacional Republicana (GNR) confirma que passou a entregar os suspeitos de incêndios florestais ao Ministério Público (MP) em vez de os entregar directamente à Polícia Judiciária (PJ). Contudo, garante que não há qualquer problema entre as duas instituições e que esta foi apenas uma forma de uniformizar os procedimentos em todo o país.

O comandante-geral da GNR, Newton Parreira, terá dado instruções para que os presumíveis incendiários passassem a ser entregues directamente aos tribunais e não à Polícia Judiciária, avança o Jornal de Notícias, desta quinta-feira. Contactado pelo PÚBLICO, o capitão Marco Cruz, das Relações Públicas da GNR, confirmou a mudança nos procedimentos, mas assegurou que “não há nenhum mal-estar entre as duas instituições” e que “continuam a cooperar” na investigação de todos os tipos de crimes.

Segundo o capitão, a alteração teve como objectivo uniformizar procedimentos, já que assim são os próprios tribunais a decidir, caso entendam que deve haver investigação, se esta deve ser feita pela PJ ou pela GNR. A mesma fonte lembra que a GNR tem competência, por exemplo, para investigar incêndios por negligência, mas que os incêndios por dolo, de acordo com a Lei de Organização da Investigação Criminal, são de “competência exclusiva da PJ”.

Para o capitão Marco Cruz, desta forma, evitam-se eventuais erros de análise “e não se tem como objectivo tirar competências a ninguém uma vez que o MP vai depois atribuir essas mesmas investigações”.

PJ sem conhecimento oficial
Por seu lado, o director nacional adjunto da PJ, Pedro do Carmo, também ao PÚBLICO, disse “não ter conhecimento” de qualquer mudança, mas garantiu que as relações com a GNR são “excelentes e de reconhecimento mútuo”. E deu como exemplo mais uma detenção de um suposto incendiário que ocorreu nesta quinta-feira e em que no comunicado da PJ é feita referência à “colaboração do SEPNA da GNR de Lamego”. Questionado sobre a sua posição caso venha a oficializar-se a procedimento, o director nacional adjunto escusou-se a pronunciar-se sobre cenários que desconhece.

Porém, o Jornal de Notícias sublinhava que na base da mudança estariam algumas querelas entre a GNR e a PJ, por esta segunda ficar com os louros de muitas detenções que tinham sido feitas pelos militares. Ainda segundo o mesmo jornal, a orientação violaria a Lei Orgânica da Investigação Criminal que estabelece que a investigação dos casos de fogo posto tem de ser enviada para a PJ. Mas sobre este ponto o capitão Marco Cruz insiste que, numa fase inicial, muitas vezes, há dúvidas sobre se estamos perante “dolo ou negligência”.

Em relação às supostas querelas, o presidente da Associação Sócio-Profissional Independente da Guarda defende que a orientação é “totalmente legal”, ainda que reconheça que existam muitas “quintas” no que diz respeito às polícias. José Alho entende que o mais correcto é que quando a GNR detém um presumível incendiário que o entregue ao Ministério Público e que seja este a dar o caso à PJ, caso assim o entenda.

Sentimento de trabalho pouco reconhecido na GNR
O presidente diz que a situação está longe de ser inédita e dá como exemplo áreas como a droga, em que quando a GNR intercepta uma lancha entrega o material apreendido à PJ e os detidos ao MP. Para evitar as “quintas” e o “sentimento de frustração” dos guardas que vêem o seu trabalho pouco reconhecido, José Alho gostaria de ver todas as polícias sob a tutela do mesmo ministério e que o Presidente da República, Cavaco Silva, “fizesse um referendo para que houvesse uma unificação das polícias para evitar estes problemas”.

O PÚBLICO tentou ouvir a Associação dos Profissionais da Guarda e a Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária (ASFIC), até ao momento sem sucesso. Mas à TSF, um dos membros da ASFIC, além de defender que a alteração é ilegal, disse que está a provocar prejuízos muito grandes devido ao atraso com que os inspectores da PJ acabam por chegar aos locais do crime.

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