Secretário de Estado do Tesouro nega envolvimento na proposta de swaps a Governo de Sócrates

Num briefing nesta sexta-feira, Joaquim Pais Jorge não se cansou de repetir que não tinha responsabilidade sobre a concepção e negociação de produtos financeiros como os swaps.

O secretário de Estado do Tesouro negou nesta sexta-feira ter estado envolvido na elaboração, na negociação ou na entrega de qualquer proposta de swaps do Citibank Coverage Portugal ao Governo de José Sócrates em 2005.

Num briefing realizado na Presidência do Conselho de Ministros em que havia limitação de perguntas dos jornalistas aos governantes presentes, Joaquim Pais Jorge não se cansou de repetir que durante o tempo em que trabalhou naquela instituição financeira foi sempre “responsável pela relação com clientes e não tinha responsabilidade sobre a concepção e negociação” dos produtos financeiros como os swaps.

Questionado directamente sobre se entregou ou não alguma proposta ao Governo de José Sócrates, Joaquim Pais Jorge respondeu: "Nego que entreguei essa proposta, sim."

Admitiu, porém, que participava nas reuniões entre o banco e os clientes, incluindo em encontros com a Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública - IGCP, com a qual o então responsável do Citigroup se recorda de ter tido inúmeras reuniões. "A minha função era conhecer os clientes em Portugal, tentar conhecer as áreas de actuação que lhes poderiam interessar e conhecer os limites dessa actuação", descreveu.

Em seguida, o secretário de Estado quase entrou em contradição. Primeiro, questionado sobre se apresentara aos clientes alguma proposta que não fora elaborada por si ou se não sabia o que estava a sugerir aos clientes [do Governo ou entidades públicas], Joaquim Pais Jorge disse que não podia "evidenciar que tenha estado sequer nessa apresentação [da proposta de swap do Citigroup]. A seguir, quando lhe foi pedido que explicasse o que queria dizer "não podia evidenciar" respondeu: "Não me lembro se estive nessa apresentação." Acrescentou de seguida: "Não posso confirmar [se a apresentação aconteceu] se eu não estive lá."

Pressionado, afirmou em seguida: "Admito que a apresentação existiu, uma vez que consta do ficheiro do IGCP. Mas mais uma vez sublinho: não tenho responsabilidade na apresentação dessa proposta, nem na sua eventual negociação."

"As responsabilidades sobre concepção, elaboração e negociação de produtos derivados não eram e nunca foram da minha competência”, garantiu Joaquim Pais Jorge numa declaração inicial. “É imprópria e abusiva a leitura feita pela [revista] Visão e retomada hoje em vários órgãos de comunicação social. O meu passado é amplamente conhecido e está na nota curricular divulgada publicamente [pelo gabinete do primeiro-ministro]”, afirmou Joaquim Pais Jorge, visivelmente nervoso.

Questionado sobre se considera ter condições políticas para se manter no cargo, o secretário de Estado contou que discutiu, na quinta-feira, a questão do artigo da revista Visão com a ministra de Estado e das Finanças, Maria Luís Albuquerque – também ela alvo de contestação pela oposição devido à forma como tratou os processos dos swaps nos últimos dois anos. “Uma vez que mantenho o seu apoio, penso que tenho as condições necessárias para o exercer”, acrescentou.

A revista Visão publicou, na quinta-feira, um artigo em que dizia que Joaquim Pais Jorge, em 2005, quando era gestor do Citigroup, e Paulo Gray, actual gestor da Stormharbour (contratada pelo actual executivo para assessorar o IGCP na renegociação de contratos de swaps de empresas públicas), tentaram vender ao Governo de José Sócrates contratos swaps que permitiam fazer descer o rácio da dívida pública sobre o PIB, colocando os valores “fora do balanço”, sem que fossem contabilizados pelo Eurostat.

A operação consistia na contratação pelo IGCP de três swaps com maturidades a 30 anos que fariam com que as taxas de juro (relativas à média do mercado) a pagar quanto às obrigações do tesouro em 2005 e 2006 fossem pagas ao longo de um período de tempo maior, divulgou a agência Lusa, que teve acesso à proposta entregue então ao Governo. Esses pagamentos seriam feitos até 2036, o que tornava o negócio mais rentável para o banco no longo prazo. O executivo de Sócrates recusou.

Ontem, o PÚBLICO tentou obter uma reacção de Joaquim Pais Jorge, sem sucesso. O governante acabou por reagir hoje através do briefing do Governo.

Paulo Gray confirma apresentação
Conforme afirmou ontem Paulo Gray num comunicado enviado ao PÚBLICO através de uma agência de comunicação, a apresentação referida pela Visão e pela Lusa no tempo do Governo de José Sócrates “consistia numa base preliminar para a discussão de um possível financiamento ou cobertura de taxa de juro, que teria os seus impactos nas contas nacionais, quer ao nível contabilístico, quer económico”.

Para o gestor, “qualquer operação financeira, da mais simples à mais complexa, está enquadrada legalmente”. Assim, defende, se esta viesse a realizar-se, “estaria condicionada à divulgação dos seus impactos financeiros às entidades competentes, de acordo com a legislação em vigor”. “A operação referida incorporava financiamento do Estado português e cobertura de taxa de juro, não podendo assim ser classificada como tóxica”, garante Paulo Gray.

Sublinhando que o documento referido data de há oito anos, e que não pertence ao Citigroup há dois anos, o gestor afirma não dispor da informação em causa, pelo que diz não conseguir pronunciar-se “em detalhe sobre a mesma”. Apesar desse facto, acrescenta que "a interpretação que lhe está a ser dada sugere a existência de motivos ou intenções, que, segundo entendo, se prendem mais com questões fora do âmbito do potencial contrato financeiro”.
 
 
 
 

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