Governo prepara intervenções em arribas instáveis

Autarcas de zonas mais afectadas pela erosão costeira criticam atraso nas intervenções a cargo da tutela. Apesar do perigo, muitos banhistas ignoram avisos e continuam a frequentar praias em risco.

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Banhistas continuam a ignorar avisos em praias com arribas instáveis Enric Vives-Rubio/Arquivo

O Governo vai fazer derrocadas controladas de arribas instáveis em algumas praias portuguesas para assegurar uma normal época balnear, indicou à Lusa fonte do Ministério do Ambiente. Os autarcas dos concelhos mais afectados criticam atrasos nas obras previstas.

A época balnear já começou em Cascais e nalgumas praias do Algarve, devendo começar no resto do país no início de Junho. Até lá, o Governo prevê avançar com algumas operações de desmoronamento controlado de arribas.

A Praia de Valmitão, na Lourinhã, é um dos locais onde estas operações vão decorrer. A praia dos Lavadores, em Vila Nova de Gaia, também terá de ser alvo de uma intervenção para não “comprometer o normal funcionamento da época balnear”.

O ministério prevê ainda uma “intervenção de emergência” na praia da Bafureira, em Cascais, que consistirá na “estabilização do troço de arriba adjacente” ao acesso à praia, por causa do agravamento das condições de estabilidade da arriba depois dos temporais no Inverno.

Na zona do Tejo, desde Outubro registaram-se 15 derrocadas entre São Pedro de Moel (Marinha Grande) e o Cabo Espichel (Sesimbra), disse o ministério à Lusa. No Alentejo, a situação é mais pacífica, tendo apenas sido detectados junto a Vila Nova de Milfontes alguns “indícios de instabilização” em arribas fora das zonas balneares, que são “merecedores de acompanhamento continuado”.

No litoral algarvio há dois locais que necessitam de recurso a derrocada controlada: as praias de Santa Eulália e da Maria Luísa, em Albufeira – onde há quatro anos morreram cinco pessoas devido à queda de uma arriba.

Décadas de atraso
No Algarve há outros locais à espera da intervenção do Governo nesta área. É o caso da praia de Dona Ana, em Lagos, para onde está prevista desde 1999 uma obra de consolidação de arribas, para minimizar os efeitos da erosão. O presidente da Câmara, Júlio Barroso, acusa o Governo de “negligência” e pede celeridade para evitar eventuais acidentes “com consequências graves”.

A obra está prevista no Plano de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) Vilamoura/Burgau e inclui o alargamento do areal em cerca de 25 metros, com a recarga de cerca de 150 mil metros cúbicos de areia. Os trabalhos chegaram a arrancar em 2009 mas foram suspensos pouco depois devido a um erro no projecto.

Segundo Júlio Barroso, apesar da delimitação das várias zonas de risco, os banhistas “têm sido expostos às ameaças e aos perigos” de derrocada das arribas. Em declarações à Lusa, Sebastião Teixeira, director da Administração da Região Hidrográfica (ARH) do Algarve, disse que a intervenção naquela praia deverá iniciar-se depois da época balnear, estando já garantido financiamento comunitário.

Em Ovar, também se pede ao Governo que cumpra o que prometeu. “Já chega de anúncios. Governar não é fazer anúncios, até hoje não houve uma única obra”, critica o presidente da Câmara, Manuel Alves de Oliveira.

No ano passado a ministra do Ambiente, Assunção Cristas, apresentou um plano de acção que anunciava um investimento de cinco milhões de euros na defesa da costa de Ovar, entre 2012 e 2015, lembra o autarca. Esse montante serviria para estabilizar as dunas em Cortegaça, criar uma nova protecção marginal no Furadouro, reabilitar passadiços, construir novas protecções em Maceda e recuperar as defesas aderentes em Cortegaça, Esmoriz e no Furadouro.

Para além desses cinco milhões, Ovar deveria ainda receber “parte dos 10 milhões anunciados para o programa Polis da Ria de Aveiro, para equilíbrio das frentes de mar”, e ainda uma parcela dos “100 milhões que, há cerca de um mês, o ex-secretário de Estado da Economia prometeu para toda a costa”, afirma Manuel Alves de Oliveira.

 “Nós asseguramos a parte da protecção civil, arranjamos os passeios, repomos o que podemos e cada vez temos mais despesa porque o avanço do mar continua e vai destruindo tudo o que fazemos”, prosseguiu o autarca.

Para o presidente da Câmara de Ovar, o atraso nessas obras tem a agravante de se verificar naquela que é apontada como a porção de costa mais sujeita aos perigos do mar em todo o país. “No caso concreto de Ovar, está demonstrado que as causas do problema são o défice de sedimentos, que deixaram de depositar-se aqui devido às obras na barra do Douro, no porto de Leixões e na defesa de Espinho”, lembrou o autarca.

Perigo iminente
Apesar do perigo, assinalado em muitos casos, os banhistas ignoram avisos e utilizam praias com arribas instáveis. Algumas nem sequer são consideradas zonas balneares, pelo que não são contempladas no plano de investimento para resolver a instabilidade das arribas.

É o caso das praias de Porto do Barril e de Coxos, em Mafra. “O mar é bom, porque as rochas fazem aqui pequenas lagoas e os pais com crianças pequenas normalmente vêm para aqui porque o mar é seguro”, explica à Lusa Nuno Sardinha, presidente da junta de freguesia da Encarnação, a que pertence a praia de Porto do Barril.

“Nunca houve problemas, mas pode haver”, teme o autarca, devido às “pedras que se vão soltando todos os anos” numa praia que é muito frequentada também por pescadores durante o ano inteiro.

Na praia dos Coxos, que pertence à freguesia de Santo Isidoro, também espreita o perigo. “A falésia é muito arenosa e tem muitas escorrências de água, por isso devia ter obras de consolidação”, reclama o presidente da junta, Hélder Ramos.

Ambos os autarcas recordam que, desde há mais de uma década, quando entraram para as juntas de freguesia, que alertam o Ministério do Ambiente para o problema. Contactada pela Lusa, a tutela não deu quaisquer esclarecimentos.

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