Poemas e canções numa pequenina manifestação pela Feira do Livro do Porto
Nem sessenta pessoas foram à concentração, esta tarde, nos Aliados. No Facebook mais de dois mil "prometiam" aderir.
No Facebook prometiam ser mais de dois mil, mas na Praça da Liberdade, no Porto, não estiveram mais que 60 pessoas a manifestar-se esta sexta-feira à tarde pela continuação da Feira do Livro da cidade, cujo cancelamento foi anunciado este mês.
Ana Maria Pinto, que convocou o protesto, não se surpreendeu com a pouca participação. “Activistas do Facebook… Quando é para vir para a rua é o que se vê. Por isso é que não gosto de criar muitas expectativas”, disse. Mas, quem foi, protestou. Da forma que estava prevista.
Cantou-se a Pedra Filosofal (poema de António Gedeão, imortalizado por Manuel Freire), o Ser Poeta (de Florbela Espanca, que os Trovante cantaram como “Perdidamente”) e também as habituais músicas do maestro Fernando Lopes-Graça, Firmeza e Hino ao Homem. Para isso, lá estavam os membros do Coro de Intervenção do Porto, que Ana Maria criou em Janeiro, e quem mais quis juntar-se a ele.
Havia gente anónima e eleitos autárquicos da CDU e do Bloco de Esquerda (BE), incluindo os candidatos dos dois partidos à presidência da Câmara do Porto, Pedro Carvalho (CDU) e José Soeiro (BE). Os dois salientaram a incompreensão pelo facto de a câmara não ter conseguido chegar a acordo com a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL), de modo a garantir que a 83.ª edição da Feira do Livro do Porto se realizasse.
“Não conseguimos entender que por 75 mil euros este evento não se realize. Independentemente de outras questões relacionadas com a APEL ou com o acesso dos pequenos livreiros, não se percebe que não se consiga garantir a realização de algo que faz parte do imaginário de todos os portuenses”, salientou o vereador e candidato comunista. José Soeiro salientou “o absurdo” de a feira não se realizar. “O valor em causa é metade do que a câmara diz que gasta em tinta, para cobrir murais e arrancar cartazes”, disse.
A APEL e a Câmara do Porto anunciaram, este mês, o cancelamento da Feira do Livro do Porto deste ano, depois de não terem conseguido chegar a acordo sobre o financiamento do certame. Domicília, 67 anos, e ainda com o cravo ao peito da manifestação do 25 de Abril do dia anterior, lamenta o cancelamento, mas não o estranha. “Já nada me surpreende. É o normal aqui no Porto com a cultura”, diz.
Lourdes Costa, 68 anos, usou o megafone de Ana Maria para ler um poema de sua autoria, chamado “Naquela Praça” e que se reporta, precisamente, à Praça da Liberdade. O que se perde com a ausência da feira? Ela explica, devagar: “Em primeiro lugar, perde-se cultura, perde-se o encontro das pessoas com os escritores, com todos os que fazem cultura, com o ombro que se toca, a palavra que se transmite”.
Na praça, ouviram-se poemas de José Carlos Ary dos Santos, Jorge de Sena, José Régio… E por lá continuavam enquanto o sol se escondia.