Oposição síria diz que "laxismo internacional" deixa Assad de mãos livres

Um dia depois da descoberta de dezenas de corpos em Alepo, o enviado especial da ONU avisou que o país “está a desmoronar-se à vista de todos”. Conferência de doadores reúne mil milhões de dólares para ajuda à população.

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A oposição síria pediu à ONU um inquérito internacional ao massacre de Alepo Jum Lopez/AFP

Ninguém poupa nas palavras para descrever o que está a acontecer dentro das fronteiras sírias. “A situação é catastrófica e piora de dia para dia”, alertou o secretário-geral da ONU, enquanto o enviado especial da organização, Lakhdar Brahimi, avisa que a Síria “está a desmoronar-se à vista de todos”. Mas ninguém parece disposto a agir para resolver a situação e o “laxismo internacional” deixa o regime de Bashar al-Assad de mãos livres, acusou a oposição, um dia depois de conhecido mais um massacre no país.

Os corpos – mais de cem segundo activistas locais, 80 de acordo com a Coligação Nacional Síria, que agrega as forças da oposição – foram descobertos num canal que atravessa Alepo, cidade que foi o grande pólo industrial da Síria e é hoje o principal campo de batalha entre os homens de Assad e a rebelião armada. É o mais recente de muitos massacres cometidos nos últimos meses, mas desta vez o mundo pode ver as imagens dos corpos, enlameados e inchados pela água. Muitos de mãos atadas. Quase todos com feridas de bala na cabeça, a provar a execução.

Em Damasco, o regime culpou a Frente al-Nusra, movimento islamista suspeito de ligações à Al-Qaeda, lembrando que os corpos apareceram numa zona controlada pelos rebeldes. A oposição acusa as forças leais a Assad pelo massacre – alguns dos mortos, dizem, tinham sido presos dias antes em checkpoints do Exército.

“O laxismo internacional face às violações dos direitos humanos na Síria encoraja os assassinos a continuarem a cometer crimes e a extrema complacência da maior parte dos países é uma luz verde dada aos autores do genocídio”, afirma a Coligação, num comunicado em que pede ao Conselho de Segurança que ordene um inquérito internacional. "Para que Assad e todos os que contribuíram para este massacre respondam por crimes contra a humanidade.”

 Horrores intermináveis”
Repudiando os “horrores intermináveis” de que a Síria tem sido palco, o secretário-geral da ONU abriu uma conferência de doadores no Kuwait com um apelo “a todas as partes e, em particular, ao Governo sírio”, para que se comprometam com o fim da violência. “Em nome da humanidade, parem com as mortes”, pediu Ban Ki-moon, ao mesmo tempo que admitia que não há um fim à vista para a catástrofe em curso.

Em Nova Iorque, Brahimi dirigiu os apelos para os países com responsabilidade na região. “Só a comunidade internacional pode ajudar” a evitar o colapso do país – um cenário com consequências a que “nenhuma das nações vizinhas ficará imune”, avisou.

O enviado especial da ONU relatou ao Conselho de Segurança a total ausência de resultados dos contactos que fez nas últimas semanas, numa comunicação que um dos diplomatas presentes descreveu à Reuters como a mais sombria desde que foi nomeado para o cargo, no ano passado. “Disse ao Conselho que me sinto envergonhado por estar sempre a repetir a mesma coisa” e a não obter resultados, disse Brahimi, sublinhando que a “Síria está a ser destruída, pedaço a pedaço”, sem que as potências internacionais se entendam sobre o que fazer para resolver o conflito.

E tão urgente como parar a violência é prestar ajuda a milhões de sírios. A Cruz Vermelha Internacional alerta que a situação atingiu “níveis sem precedentes de sofrimento”, com o Inverno a agravar as condições de vida, quer de quem está preso pelos combates quer de quem foi obrigado a fugir do país. “Assistimos a uma tragédia humana que se desenrola à nossa vista”, acrescentou Valerie Amos, responsável pela assistência humanitária da ONU, num apelo à solidariedade internacional.

As Nações Unidas dizem precisar de 1500 milhões de dólares para levar ajuda a quatro milhões de sírios que se encontram em situação desesperada e aos 700 mil que estão refugiados nos países vizinhos. Antes da conferência do Kuwait, tinha conseguido angariar apenas 18% desse montante, mas nesta quarta-feira as promessas de ajuda superavam já os mil milhões, dos quais 900 mil oriundos dos países do Golfo.
 
 
 
 
 

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