Milhares de pessoas continuam sem água, luz e comunicações

Mau tempo do fim-de-semana provocou estragos que ainda estão a ser reparados. Agricultores cujas culturas foram afectadas podem recorrer aos fundos do Proder, disse a ministra.

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Chuvas e ventos fortes afectaram todo o país, sobretudo o litoral Adriano Miranda

Milhares de pessoas continuam sem água, luz e comunicações. Equipas da EDP Distribuição e da PT continuam no terreno para tentar resolver as situações provocadas por quedas de árvores e de postes de electricidade.

O presidente da EDP Distribuição, João Torres, assegurou no domingo, ao final da noite, que 90% dos clientes afectados pelo temporal de sábado já tinham abastecimento eléctrico e que as reparações na rede eléctrica deveriam ficar concluídas na madrugada desta segunda-feira. Contudo, há zonas, como na região Centro, onde a normalidade só será reposta na terça-feira de manhã.

João Torres revelou no domingo que ainda existiam cerca de 100 mil casas afectadas pela falta de energia eléctrica. "A nossa melhor previsão aponta para a reposição da rede de alta e média tensão durante a próxima madrugada, permitindo, então, mobilizar as equipas para atender à rede de baixa tensão” nas zonas “mais críticas”: Aveiro, Leiria, Coimbra e Santarém, adiantou. O temporal deste fim-de-semana danificou condutores numa extensão de 11 mil quilómetros da rede de alta e média tensão.

Num ponto de situação feito ao final da manhã nesta segunda-feira, a EDP prefere não adiantar números sobre as casas ainda sem energia, prometendo essa informação para o final do dia. Mas informa que os clientes ainda sem energia concentram-se nas zonas do Pinhal Litoral, Pinhal Interior, Baixo Mondego e Baixo Vouga, locais onde já foram ligados à rede 100 geradores, em articulação com os municípios.

No terreno estão 1000 técnicos e 400 viaturas, ajudados pelos técnicos da Protecção Civil. "A perspectiva de conclusão da reparação a curto prazo das redes de média tensão vai permitir que, durante o dia de hoje, todos os nossos esforços estejam concentrados na reparação de avarias na rede de baixa tensão", acrescenta a EDP em comunicado. "A reposição do serviço está a ser efectuada de forma gradual, à medida que os trabalhos ficam concluídos", lê-se na nota.

A Portugal Telecom tem equipas no terreno a tentar resolver problemas de comunicações, disse ao PÚBLICO fonte do gabinete de comunicação da empresa. "A interrupção de serviços é maioritariamente  provocada pela falta de energia em algumas centrais fixas e estações-base móveis", disse a mesma fonte, acrescentando que "os constrangimentos relacionados diretamente com a PT estão em fase de resolução".

Sem energia, falha abastecimento de água
Em Leiria, há várias localidades sem água, o que levou a câmara a emitir um comunicado solicitando às pessoas que não foram afectadas para moderarem o consumo. Os cortes no abastecimento de água ficaram a dever-se às falhas de energia eléctrica, que provocaram falhas nos sistemas de bombagem das captações e reservatórios de elevação de água. Os técnicos municipais estão no terreno a tentar restabelecer o abastecimento.

Algumas escolas dos concelhos de Leiria e Ourém suspenderam mesmo a actividade lectiva por falta de água e eletricidade, alegando falta de condições para assegurar a higiene e a confecção das refeições escolares. “Estamos a fazer um levantamento das escolas, mas pela amostra, para já, cerca de metade não tem condições para garantir as aulas, sem luz e sem água”, disse nesta segunda-feira à Lusa o director do Agrupamento de Escolas de Marrazes, Leiria.

Sem fornecimento de água, a Escola Secundária Afonso Lopes Vieira, na mesma freguesia, pondera também suspender a actividade lectiva. Em Ourém, a Escola EB2,3 de Freixianda, não está a funcionar devido à falta de energia, disse à Lusa o vice-presidente da autarquia, José Alho.

Agricultores podem recorrer ao Proder
Esta segunda-feira começa também a avaliação dos estragos na agricultura. Na Póvoa do Varzim, os horticultores queixam-se de prejuízos na casa dos cinco milhões de euros devido à destruição das estufas e respectivas colheitas. Também a região Oeste foi afectada. 

À margem de uma conferência sobre o mar, organizada pelo Diário de Notícias, na Póvoa do Varzim, a ministra da Agricultura e do Mar, Assunção Cristas, disse que os agricultores podem recorrer ao PRODER e a linhas de crédito bancário para pagar os prejuízos provocados pelo mau tempo, mas não adiantou valores. “Há a possibilidade de accionar o Proder, nomeadamente a medida de reposição da capacidade produtiva, o que já aconteceu noutras situações em que estufas ficaram danificadas pelo mau tempo”, afirmou.

Segundo a ministra, podem também “ser mobilizadas para estas situações” as linhas de crédito que foram previstas para apoiar projectos no âmbito do Proder e que resultam de protocolos recentemente assinados entre o Governo e alguns bancos. Sobre os estragos, que já foram contabilizados pelos directores regionais de agricultura num primeiro levantamento, a ministra considerou que "é prematuro avançar números”.

O mau tempo afectou ainda a circulação de barcos, comboios e aviões, assim como a circulação rodoviária com várias estradas cortadas por todo o país. As travessias do Tejo, na região de Lisboa, estiveram interrompidas durante sábado devido à forte ondulação e ao vento. Várias linhas ferroviárias tiveram a circulação interrompida por causa da queda de árvores e de postes de alta tensão. E dezenas de voos com destino a Lisboa foram desviados para os aeroportos de Faro e de Madrid devido às fortes rajadas de vento. Esta segunda-feira pelo menos 13 voos foram cancelados, nos aeroportos de Lisboa e do Porto, também por causa das condições climatéricas que se fazem sentir na Europa, nomeadamente em Inglaterra e em França, onde a forte queda de neve, durante o fim-de-semana, não permite que os aviões levantem voo em condições de segurança.

Monumentos encerrados em Sintra
O vento forte provocou estragos consideráveis também na serra de Sintra, onde terão caído pelo menos duas mil árvores, algumas centenárias, segundo fonte do gabinete de comunicação da Parques de Sintra, empresa pública que gere os principais monumentos do concelho.

A mesma fonte adianta que o acesso aos parques deverá ficar cortado por "pelo menos mais uma semana". O Palácio da Pena reabre na terça-feira, mas o parque em volta do monumento não está visitável. O mesmo acontece com o parque de Monserrate, onde o palácio já está aberto ao público nesta segunda-feira.

"Calculamos que o Convento dos Capuchos e o Castelo dos Mouros reabram ainda esta semana, mas há que retirar e cortar muitas árvores, não temos certezas", disse a responsável pela comunicação da Parques de Sintra, Maria do Céu Alcaparra. O jardim e o chalet da condessa D'Edla, recuperados há dois anos, ficaram muito danificados: além das árvores caídas, verificou-se também a deslocação de algumas pedras de várias toneladas e a destruição parcial da Casa do Guarda, onde funciona a bilheteira.

Numa visita ao local na manhã desta segunda-feira, o secretário de Estado das Florestas, Daniel Campelo, assegurou que o Governo vai "agir em conformidade com as responsabilidades da sua empresa". Por seu lado, o presidente da Câmara Municipal de Sintra, Fernando Seara, disse que esta foi "porventura uma das maiores ou a maior catástrofe natural em Sintra nos últimos 50 anos" e adiantou que irá pedir apoio ao Estado para a reabilitação da zona.

Como a Lusa constatou no local, a destruição de árvores e partes de casas é visível por toda a serra. A zona das sequóias "está totalmente intransitável e sem condições de segurança", descreveu Fernando Seara.

Em Sines, a cobertura do armazém onde estavam a ser construídos os carros alegóricos para o Carnaval foi arrancada pelo vento no sábado. Quase todos os carros ficaram danificados, mas nenhum vai ter de ser reconstruído, e portanto a realização do evento está assegurada.

E nem os cemitérios foram poupados: em Évora, uma dezena de campas de dois cemitérios ficaram danificadas por terem sido atingidas por ávores, que caíram devido ao mau tempo. No sábado foram registadas cerca de 120 ocorrências no concelho, sendo que a mais grave foi a destruição total de uma tenda instalada no aeródromo municipal e que servia de instalações provisórias de uma empresa de pára-quedismo.

Ainda no Alentejo, o mau tempo causou "prejuízos significativos" no sector pecuário, tendo provocado a morte de "vários animais", segundo o presidente da Associação de Agricultores do Distrito de Portalegre (AADP), António Bonito. Olivais destruídos, barracões agrícolas danificados e cercas arrancadas por causa das enxurradas são outras consequências do temporal.

No Norte, em Esmoriz, o parque de campismo foi também danificado pelo temporal. O presidente do Clube de Campismo do Porto estima que os prejuízos sejam superiores a 500 mil euros. "Esta foi a pior situação de que temos registo", disse à Lusa Carlos Américo, acrescentando que será necessário cortar cerca de 100 árvores. "Desde 1953 que não se via aqui nada assim", afirmou.

As áreas mais afectadas são as que ficam perto da praia, com pinheiros altos derrubados e estragos em caravanas, atrelados e blocos sanitários. Ainda assim, o parque mantém-se operacional, mas acolhe neste momento apenas duas famílias.

Durante o fim-de-semana, a Autoridade Nacional de Protecção Civil contabilizou um morto, 22 feridos e 46 deslocados. No total foram registadas 9463 ocorrências em todo o país. O vento forte com rajadas até aos 130 km/h provocou a queda de árvores e de estruturas, 6018 e 2425 ocorrências respectivamente.

A chuva provocou 534 inundações e 279 deslizamentos ou desabamentos. Envolvidos nos trabalhos estiveram 35.263 operacionais e 10.984 veículos. Registaram-se ainda 207 limpezas de vias. Os distritos onde se verificaram mais pedidos de ajuda contabilizados foram Lisboa (2623 ocorrências), Coimbra (957), Porto (775) e Aveiro (584).

 

 
 
 
 

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