Irlanda vai ter que permitir o aborto quando a vida da mãe está em risco

Governo de Dublin vai legislar para cumprir sentença do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

Foto
O primeiro-ministro Enda Kenny prometeu um debate sobre o aborto no Parlamento Francois Lenoir/REUTERS

A Irlanda vai ter uma lei para permitir o aborto nos hospitais públicos quando a vida da mãe estiver em risco, inclusivamente se esta se ameaçar suicidar. A decisão destina-se apenas a cumprir uma sentença do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos. No geral, a interrupção da gravidez continuará a ser proibida na República da Irlanda.

A legislação será votada no próximo ano, após um debate no Parlamento, prometeu o primeiro-ministro Enda Kenny. Mas se o receio de suicídio da mãe pode vir a ser motivo para permitir o aborto, violação ou abuso sexual pode não ser – porque estes argumentos não faziam parte do Processo X, um caso da década de 1990, ao qual se refere a sentença do Tribunal Europeu de Direitos Humanos a que o Governo está a reagir. 

Esta decisão surge na sequência da sentença de 2010 do tribunal, face à queixa apresentada por três pessoas conhecidas apenas pelas iniciais A, B e C. O tribunal ordenou à República da Irlanda que revisse a sua legislação sobre a interrupção da gravidez.

Na União Europeia, só a Irlanda e Malta têm legislações que proíbem o aborto, mesmo que a sobrevivência da mãe esteja em causa. Desde a década de 1980 já houve vários referendos sobre o assunto, mas a proibição tem-se mantido, ainda que em 1992 o Supremo Tribunal irlandês tenha determinado que o aborto pode ser legal em certas circunstâncias, muito limitadas. Vinte anos depois, no entanto, a dentista indiana Savita Halappanavar morreu num hospital de Galway, em Outubro, com uma septicemia, porque estava a ter um aborto espontâneo e os médicos se recusaram a fazer a interrupção da gravidez que lhe teria salvo a vida. O marido da dentista diz que os clínicos justificaram a sua atitude dizendo que estavam “num país católico.”

O caso de Halappanavar teve grande repercussão internacional e levou o Governo a agir. O relator das Nações Unidas para os Direitos da Saúde, Anand Grover, esteve na segunda-feira em Dublin e confessou-se “particularmente preocupado com a Irlanda”, segundo o Irish Times. O direito da mãe à vida “é mais importante do que o direito à vida de alguém que ainda não nasceu, cuja vida está dependente de um parto seguro”, afirmou Grover.

“Não se podem continuar a perder vidas assim”, disse, referindo-se a Savita Halappanavar. “Isso não aconteceria na Índia”, declarou.

Ainda assim, muitos políticos irlandeses hesitam em dar este passo, temendo a reacção do seu eleitorado arreigadamente católico. Tem havido apelos a que os deputados possam votar consoante a sua consciência, mas o primeiro-ministro cortou quaisquer esperanças: “Não haverá voto livre nisto”, garantiu.
 
 
 
 

Sugerir correcção
Comentar