Portugal entre os países europeus com maior taxa de novos casos de VIH/sida

Organização Mundial da Saúde divulga relatório que deixa Portugal numa má posição. Taxa de diagnósticos tardios está acima da média. E pode estar a aumentar.

Fotogaleria
Dados da estudo da Organização Mundial de Saúde PÚBLICO
Nos últimos 30 anos foram notificados em Portugal 42.350 casos de infecção por VIH
Fotogaleria
Nos últimos 30 anos foram notificados em Portugal 42.350 casos de infecção por VIH PÚBLICO/Arquivo

A prevenção está a falhar. Quase 54 mil novos casos de VIH/sida foram notificados no ano passado na chamada Região Europeia da Organização Mundial da Saúde (OMS), que inclui um total de 53 Estados. Portugal é o sexto da lista. O director-geral da Saúde, Francisco George, usa a expressão “epidemia concentrada”.

A incidência da infecção é de oito a 10% entre homens que fazem sexo com homens e entre profissionais do sexo. “É um número brutal”, comentou na quinta-feira em Lisboa, na mesma conferência organizada pela Abraço, o médico e deputado do PSD Baptista Leite. A prevalência entre a população geral é de 0,6%.

Na conferência, Baptista Leite, coordenador do grupo de trabalho de acompanhamento da problemática VIH/sida, indicou que Portugal estará ainda em pior posição no número de novos casos de infecção, sendo o terceiro país da Europa com maior incidência.

O director do Programa Nacional para a Infecção VIH/sida, António Diniz, traçou a evolução: entre 1983 e 31 de Outubro de 2012 foram notificados em Portugal 42.350 casos de infecção por VIH. Registou-se uma subida de dez mil em apenas cinco anos, tendo em conta que em 2007 havia em Portugal 32.491 infectados.

O mapa revela três grandes focos. António Dinis apontou-os: 40% dos casos de infecção são registados na zona de Lisboa, 20% na área do Porto e 15% em Setúbal. A percentagem tem aumentado entre heterossexuais e homossexuais. Orientação sexual à parte, a diminuição nota-se entre consumidores de drogas injectáveis.

Em Portugal, uma em cada três pessoas infectadas nem imagina que contraiu o vírus, referiu Baptista Leite. E esse desconhecimento potencia novos casos. Pode até pôr em causa a vida dos infectados que ignoram a sua condição.

 

Diagnóstico tardio

Não é só em Portugal. Não há sinais de estar a abrandar o ritmo da transmissão de VIH/sida na Europa. Até está a crescer no Leste, alerta o relatório que lançado esta sexta-feira pelo Centro Europeu de Prevenção e Controlo de Doenças e pela OMS. Entre utilizadores de drogas injectáveis, mesmo em países com números tradicionalmente baixos, pode disparar, como aconteceu ainda há pouco na Roménia e na Grécia.

Faltam dados recentes sobre o Liechtenstein, o Mónaco, a Rússia e Uzbequistão. Na lista, oito países aparecem com uma taxa superior a sete novos casos diagnosticados em 2011 por cada cem mil habitantes: Estónia (27,3), Letónia (13,4), Bélgica (10,7), Reino Unido (10,0), Luxemburgo (8,6), Portugal (8,5), Espanha (8,4) e Grécia (7,4).

Numa nota sobre o relatório, o director do Centro Europeu, Marc Sprenger, enfatiza: “Exemplos recentes de diferentes países da UE mostram que o falhanço na quebra da cadeia de transmissão do VIH conduzirá inevitavelmente a uma alta prevalência de VIH a longo prazo”. Pelos dados de que dispõe, metade fez o teste tarde. “Se queremos reduzir e prevenir a transmissão do VIH em toda a Europa, temos de investir e de promover o aconselhamento e a despistagem”, avisa. “Dessa forma, garantimos o diagnóstico precoce, bem como o acesso e a adesão ao tratamento, diminuímos o número de diagnosticados tardios e melhoramos os resultados do tratamento a longo prazo. “

A taxa de diagnósticos tardios do VIH/sida em Portugal está acima da média: 65%. E pode estar a aumentar. Em 2010 realizaram-se 23.966 testes numa fase precoce, no ano seguinte 19.620.“Não tenho uma justificação estudada para apontar”, disse Diniz, citado pela agência Lusa. “Não foi falta de testes, não encerraram nem houve alterações nos CAD [Centros de Aconselhamento e Detecção]”.

“Sem terapêutica adequada, as pessoas morrem em média em 24 meses”, frisou Baptista Leite. A esse respeito, Kamal Mansinho, do Hospital Egas Moniz, lembrou que, nos últimos dez anos, mais de metade das pessoas a quem a infecção foi diagnosticada no Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental já estaria “infectada há mais de uma década”. Geralmente, este é o período em que a infecção não produz sintomas.

Nos países industrializados, um jovem de 20 anos infectado, quando tratado em tempo útil, pode viver mais 50 anos. Quer isto dizer, explicou Kamal Mansinho, que “pode viver 70 anos com qualidade e autonomia”. “É importante que a comunidade, as seguradoras, os empregadores saibam disto.”

“A crise financeira mundial está a desafiar os governos a investir”, advoga também Zsuzsanna Jakab, directora regional da OMS para a Europa, na nota já referida. Apenas um em cada quatro pacientes recebe o tratamento anti-retroviral na Europa de Leste, uma taxa que está entre as mais baixas do mundo. No seu entender, “precisamos urgentemente de aumentar os recursos, especialmente na Europa de Leste e na Ásia Central — cada euro gasto na resposta ao VIH agora será em grande parte pago com a poupança nos custos em tratamento no futuro, sem contar com os ganhos sociais por manter as pessoas saudáveis e produtivas”.

 
 
 

Sugerir correcção
Comentar