O ano que passou e o ano que aí vem

O que a troika disse na sua sexta missão de avaliação em Portugal foi que "o Governo continua empenhado em atingir a meta do défice de 5% do produto interno bruto (PIB), em 2012, e 4,5% do PIB em 2013".

O que ela não disse é se o Governo a vai atingir e, em caso afirmativo, como. As contas feitas com os dados da execução orçamental de Outubro [divulgados na passada sexta-feira] deixam relativamente claro o que se vai passar. O Governo, nestes dois meses finais, precisa ainda de obter, ou em receitas extraordinárias ou em cortes não previstos nas despesas, cerca de meio ponto percentual do PIB, ou seja perto de 830 milhões de euros. 

Este valor peca provavelmente por defeito, pois há riscos adicionais que podem agravar o défice, nomeadamente no sector empresarial com as imparidades que poderão ser registadas em 2012 nas duas empresas (Parvalorem e Parups) que foram criadas na altura da privatização do Banco Português de Negócios (BPN). Este banco, apesar de já não existir, continua a ameaçar o bolso dos portugueses. 

O que correu mal no ano que passou está também já suficientemente diagnosticado, nos dados que aqui têm sido trazidos mês após mês e que estão agora relativamente estabilizados.  

No essencial, o Orçamento de Estado de 2012 era irrealista, quer do lado da receita quer do lado da despesa, embora em sentido contrário. Do lado da receita, em particular das receitas fiscais, é natural que haja maior incerteza. De qualquer modo, a quebra muitíssimo superior no IRC e a quase estagnação no IVA (quando o Governo previa um aumento de 11,6%), para além do optimismo em relação aos demais impostos, só mostram que o Ministério das Finanças e a troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) têm subestimado o efeito negativo da recessão no saldo orçamental.

Do lado da despesa, o Governo criou duas "boas almofadas" no OE2012, ao suborçamentar as despesas de pessoal e em pensões (sobretudo da Caixa Geral de Aposentações). Sem estas almofadas, a execução orçamental ainda teria sido pior. O resultado conjunto destes efeitos de sentido contrário é, ainda assim, um agravamento do défice público português em mais de um ponto percentual em relação ao objectivo inicial que era de 4,5% (e que foi revisto para 5%).  

Um optimismo excessivo no cenário orçamental tem pois consequências nefastas e pode derivar, entre outras razões, de dois factores distintos: um cenário macroeconómico demasiadamente optimista ou da utilização de "multiplicadores" subestimados (por exemplo o efeito do agravamento da carga fiscal na recessão).  

Em relação ao OE2013, o cenário macroeconómico parece optimista para uns (Budget Watch- ISEG, Conselho de Finanças Públicas, etc.), embora para outros seja realista (Governo e troika). Gostaríamos muito que o Executivo tivesse razão, mas temos fortes razões para suspeitar que não.

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