Lei permite que assassino seja herdeiro do cônjuge que matou

Mulheres Socialistas querem resolver lacuna legal para que assassinos deixem de receber pensões das mulheres e maridos.

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Foi detectado pelo menos um caso em que o marido ficou com a pensão da mulher que matou Paulo Pimenta

Um cônjuge que mate o outro pode permanecer o herdeiro da vítima e ainda receber uma pensão de sobrevivência da Segurança Social devido a uma lacuna da lei que as Mulheres Socialistas criticam, defendendo uma alteração legislativa “urgente”.

“Isto não pode acontecer. É perverso, quase imoral. O homicida pode ser herdeiro legal do cônjuge que matou e ainda receber uma pensão de sobrevivência”, alertou Catarina Marcelino, presidente das Mulheres Socialistas (MS).

A revelação é feita no Dia Internacional da Eliminação da Violência contra Mulheres e justifica-se por existirem “mulheres que não têm família nenhuma a não ser o homicida”. Se nada for feito, “o assassino tem direito à herança e, em alguns casos, à pensão de viuvez, o que é uma imoralidade”, lamenta Catarina Marcelino.

“Há casos destes. Não sabemos quantos. Detectámos pelo menos um, em que uma pessoa condenada por homicídio é herdeira legal da vítima, que era casada com ele e não tinha mais família. É inaceitável”, critica a responsável.

Uma consulta ao Observatório da UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta mostra “vários casos em que a mulher não tinha família para além do homicida”, pelo que é “grande a possibilidade” de existirem mais homicidas herdeiros das vítimas. Explicando que “uma pessoa que mata outra não pode ser herdeira da que matou”, Catarina Marcelino indica que, para que tal aconteça, não basta a condenação por homicídio, “é preciso intentar uma acção para declaração de indignidade”.

“Quando a vítima não tem ninguém, o Ministério Público (MP) devia avançar com a acção para declaração de indignidade. Mas a herança é processo civil e o crime um processo penal e falta articulação”, observa, esclarecendo que ser herdeiro “não é só ter direito à pensão”, é também “ter direito legal sobre tudo o que envolva o nome da vítima”.

Proposta de alteração legislativa

Para contornar a lacuna legal, as MS vão, junto do grupo parlamentar do PS, “fazer todas as diligências para uma proposta de alteração legislativa”. A intenção é que os tribunais passem a “ter de, obrigatoriamente, comunicar as sentenças” relacionadas com o homicídio de cônjuges ao MP, para que este possa activar a figura legal que impede o direito do assassino à herança da vítima.

O problema prende-se com dois artigos do Código Civil. Um deles estipula a incapacidade sucessória, dizendo que “carecem de capacidade sucessória, por motivo de indignidade, o condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o autor da sucessão ou contra o seu cônjuge, descendente, ascendente, adoptante ou adoptado”.

Apenas num outro artigo se esclarece que “a acção destinada a obter a declaração de indignidade pode ser intentada dentro do prazo de dois anos a contar da abertura da sucessão, ou dentro de um ano”, a contar da condenação pelos crimes que a determinam ou “do conhecimento das causas de indignidade”.
 
 
 
 

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