EUA falam em ciberguerra do Irão mas há quem queira ver as provas

Sempre que se fala sobre armas nucleares, é natural que o primeiro país a surgir no mapa do cérebro seja o Irão. Mas nos últimos meses tem começado a formar-se uma outra associação, que poderá tornar-se tão imediata como a primeira: para os EUA, o Irão está a caminho de se tornar numa das maiores potências no mundo dos ataques informáticos.

Os media norte-americanos têm multiplicado as notícias sobre alegados ataques orquestrados por grupos de hackers iranianos, alegadamente apoiados pelo Governo de Teerão. Ainda na segunda-feira, a CNN escrevia que Barack Obama e Mitt Romney têm debatido o programa nuclear iraniano, mas "raramente discutem o perigo mais iminente que o Irão representa para os Estados Unidos: a ciberguerra".

De acordo com Roger Cressey, vice-presidente da empresa Booz Allen Hamilton – uma das mais prestigiadas na área da consultoria em segurança tecnológica –, "o Irão está a tentar mostrar que tem capacidade para perturbar a vida no Ocidente. O argumento deles é: "Saibam que tudo o que vocês nos podem fazer terá consequências"".

Entre Setembro e Outubro, ataques contra os sites de algumas das mais importantes instituições financeiras norte-americanas, como o Bank of America e o JPMorgan Chase, e contra o sistema da maior empresa petrolífera do mundo, a Saudi Aramco, levaram os media dos EUA a escrever títulos como "Principais bancos afectados pelo maior ciberataque da história" (CNN) e "EUA interpretam ataque contra empresa saudita como um contra-ataque do Irão" (The New York Times).

Na sequência dos ataques contra bancos norte-americanos, o senador Joe Lieberman foi o único responsável a implicar publicamente Teerão: "Acredito que foi obra do Irão e acredito que foi uma resposta às sanções económicas decretadas pelos EUA e pelos nossos aliados europeus."

Para além das declarações de Joe Lieberman, nenhum responsável da Administração Obama ou dos serviços secretos veio a público acusar Teerão de estar a travar uma guerra informática contra os EUA, o que levou Sean Lawson, professor na Universidade do Utah e especialista em ciberguerra, a propor um outro título para as notícias sobre o alegado envolvimento do Irão, num texto publicado no site da revista Forbes: "Fontes anónimas não apresentam provas de ciberataques do Irão."

O jogo das alegações sem provas já tinha sido referido pelo site da Bloomberg, no dia 25 de Outubro: "Apesar de responsáveis norte-americanos anónimos terem sugerido que o Irão é o responsável pelo ataque de 15 de Agosto [contra a Saudi Aramco], o código do vírus não continha nenhum elemento sofisticado que pudesse sugerir o envolvimento de programadores apoiados por um Estado." A informação da Bloomberg, baseada em testemunhos dos responsáveis – também eles anónimos – pela investigação ao vírus que atacou a Saudi Aramco, foi desmentida pelo secretário da Defesa dos EUA, Leon Panetta, que descreveu o ataque como "altamente sofisticado", salientando que "há poucos países com tal capacidade".

Para o especialista Sean Lawson, a contradição entre o que dizem as fontes anónimas das autoridades norte-americanas e as fontes anónimas das equipas de investigação tem várias explicações: "A mais óbvia é que os iranianos estão a ser usados para que a Administração decrete uma ordem executiva sobre cibersegurança, em defesa de uma nova legislação. Mas também contribui para o sentimento comum de medo e suspeita à volta do Irão." O professor da Universidade do Ohio termina o texto a recordar uma citação do ex-secretário da Defesa Donald Rumsfeld, quando em 2002 foi questionado sobre a ausência de provas de que o Iraque tinha armas de destruição maciça: "A ausência de provas não prova a ausência."

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