Loteamento de armazéns ameaça zona das antigas salinas de Alverca

Foto
A avifauna do estuário do Tejo costuma frequentar as antigas salinas de Alverca Daniel Rocha

O projecto de construção de um conjunto de armazéns e espaços multiusos na zona das antigas salinas de Alverca, a sul da Ogma-Indústria Aeronáutica de Portugal, está a gerar controvérsia. O movimento de cidadãos Xiradania afirma que está em causa um dos espaços naturais mais importantes da margem norte do Tejo e a CDU aponta irregularidades no processo.

As salinas de Alverca e do Forte da Casa são consideradas, desde 2002, um local de importância ambiental para aves (IBA), segundo a BirdLife Internacional – uma federação de organizações não-governamentais para a protecção da ornitologia. No entanto, esta classificação ambiental não confere qualquer protecção. “Existem mais de cem áreas IBA, em Portugal, e em 70% dos casos, estas áreas estão englobadas pelas zonas de protecção especial da rede Natura 2000”, explica Joana Andrade, da Sociedade Portuguesa de Estudo das Aves (SPEA). Contudo, em Alverca não existe essa protecção.

O empreendimento da Arco Central (empresa ligada ao grupo Obriverca e ao Banco Espírito Santo) pode ser aprovado com base no antigo Plano Director Municipal (PDM) de Vila Franca de Xira, uma vez que à luz do novo PDM o loteamento não poderia avançar. A votação final no executivo, que esteve prevista para 25 de Julho, foi adiada para uma próxima sessão, porque a CDU contestou o facto de o relatório final da consulta pública da proposta de loteamento não contemplar uma exposição do movimento Xiradania.

Em causa está um loteamento para 41 hectares, entre a linha férrea, a Ogma e o rio da Verdelha. Em Junho, a câmara despachou favoravelmente o estudo de loteamento que prevê cerca de 94.600 metros quadrados de construção, 1342 lugares de estacionamento e 151.000m2 de áreas verdes, para equipamentos colectivos e cedências ao município. Estão previstos três lotes para edifícios multiusos, de comércio e serviços, com dois pisos e dez metros de cércea. No total, ocupam cerca de 270.000m2, com 94 mil de área de construção. O acesso será feito pelo viaduto de ligação à EN116 já existente.

Na reunião camarária de 27 de Junho, PS e Coligação Novo Rumo (PSD/PPM/MPT) votaram a favor do encaminhamento do processo para discussão pública. A CDU votou contra, por discordar da aprovação com base no antigo PDM, quando o actual já está em vigor desde Novembro de 2010. Os socialistas recordam que o loteamento tem por referência o PDM na versão de 1993 e que esteve na base de um protocolo entre os promotores e a autarquia, que levou a empresa a ceder à câmara os terrenos já utilizados na construção da Estação de Tratamento de Águas Residuais de Alverca, da bacia de retenção e do nó rodoviário.

Riscos de indemnizações?

Os serviços de urbanismo atestam que a proposta de loteamento cumpre as opções previstas no PDM de 1993, que preconizava para aquela área grandes equipamentos, instalações do sector terciário, indústrias compatíveis e armazenagem. O estudo tem pareceres favoráveis da Rede Ferroviária Nacional e da Administração da Região Hidrográfica do Tejo e que contempla também a cedência ao município de terrenos para a requalificação da frente ribeirinha.

Já com o novo PDM em vigor, que coloca esta área na estrutura ecológica urbana e sem qualquer construção, os promotores pediram esclarecimentos à autarquia de Vila Franca, em 2010 e 2011, considerando que existem “direitos adquiridos” e que a apreciação do loteamento deve ter por base o antigo PDM. Pareceres jurídicos então solicitados concluíram que o licenciamento deve ser visto à luz do PDM de 1993, e não do de 2010, devido à existência do protocolo. E afirmam que o município pode vir a ser responsabilizado financeiramente por alguma eventual perda de direitos dos promotores devido à existência de uma informação prévia favorável.

Xiradania recusa direitos adquiridos

O movimento cívico Xiradania apresentou a única exposição entregue na consulta pública do loteamento e afirma que, em situações semelhantes, a câmara decidiu “aplicar as normas do actual PDM e não o de 1993”. A aprovação do loteamento da Arco Central, acusa, iria “criar uma situação de profunda injustiça e de clara violação de princípios fundamentais da actividade administrativa: o da imparcialidade e o da igualdade”. O movimento aponta decisões judiciais que concluem que “os protocolos não constituem, no nosso ordenamento jurídico, uma fonte válida de constituição de direitos de edificação”. E, notam, “toda a área de intervenção deste loteamento se encontra dentro dos limites das áreas inundáveis, da estrutura ecológica municipal e na Reserva Ecológica Municipal e, parcialmente, dentro de um corredor ecológico estruturante da Área Metropolitana de Lisboa”.

No entender deste movimento cívico, não fará sentido avançar com mais este loteamento de logística quando a polémica plataforma da Castanheira do Ribatejo e a respectiva área de expansão “são um verdadeiro deserto empresarial de 150 hectares” e existem “inúmeros armazéns vazios distribuídos por todo o concelho”.

Sugerir correcção
Comentar