Mutilação Genital: sensibilização é prioridade, mas Governo admite aumentar punição

A primeira abordagem à mutilação genital feminina deve ser “o mais amigável possível”, mas, se a sensibilização não funcionar, uma maior penalização “é uma hipótese que não pode ser de todo afastada”, diz a secretária de Estado da Igualdade.

“Gostaria que a abordagem penal continuasse a não ser a primeira abordagem. A primeira coisa a fazer é sensibilizar as famílias e dar-lhes informação de forma a evitar que essas crianças saiam do país, para irem de férias, e regressem excisadas”, afirmou Teresa Morais.

A secretária de Estado falava no final de uma sessão que assinalou hoje, no Hospital Garcia de Orta, em Almada, o Dia Internacional de Tolerância Zero à Mutilação Genital Feminina (MGF), prática que já afectou 130 milhões de mulheres e que põe em risco três milhões de meninas anualmente.

Teresa Morais destacou, porém, que a moldura penal da MGF pressupõe a “aplicação extraterritorial”. Ou seja, “as pessoas podem ser punidas por actos que são praticados lá fora sobre crianças que são residentes, e em muitos casos nascidas, em Portugal”, explicou, frisando que “este dever de protecção existe em relação a elas mesmo quando saem do território nacional”. Reconhecendo que impedir que as meninas em risco saiam do país “pode ser difícil”, sobretudo se elas forem acompanhadas pelos pais, a governante admite “estudar mecanismos” que passam por penalizar “as famílias que permitam a excisão”. Esta medida já foi adoptada em alguns países, nomeadamente Suíça e Espanha. No entanto, a secretária de Estado reconhece que tem por estes mecanismos de vigilância “alguma repugnância”. Mas, reconheceu, “é uma hipótese que não pode ser de todo afastada” se se verificar que “não se consegue erradicar” a prática “de outra maneira”.

“Gostaria que não precisássemos de medidas deste carácter tão repressivo, porque acho que, se o problema em Portugal não tiver uma dimensão alarmante e for controlável por outro tipo de intervenções, designadamente de sensibilização e intervenção com as famílias e comunidades, podemos não precisar de chegar aí.”

Envolver as comunidades e organizações locais, ao mesmo tempo que se sensibiliza as várias autoridades - de saúde ou de segurança - é a receita para uma “luta de paciência”, propõe Teresa Morais, admitindo que os resultados práticos serão “lentos”.

A secretária de Estado reconheceu as dificuldades decorrentes da falta de estatísticas, defendendo, ao mesmo tempo, uma “sinalização rigorosa dos casos”, nomeadamente por iniciativa dos profissionais de saúde. “Ninguém tem números”, apenas “cálculos por aproximação”, reconheceu, acrescentando que se deve tentar conhecer a “verdadeira dimensão” do fenómeno.

Admitindo que há “trabalho feito” sobre a MGF, Teresa Morais considerou, porém, que este “não foi suficiente” e lamentou que não se tenha feito “a avaliação” do I Programa para a Eliminação da MGF, que terminou em 2010, sem que fossem apurados resultados. Esta “avaliação” está agora em curso, adiantou, reconhecendo que “há mecanismos que podem ser melhorados.

No entanto, sublinhou, “o essencial” dos planos para a igualdade herdados do anterior Governo - onde se inclui a estratégia para a MGF - “será para cumprir”, se possível indo “mais além”, nomeadamente na tentativa de realizar “um embrião de estatística”.

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