Liga Árabe suspende missão na Síria e oposição pede "protecção" à ONU

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Um forca para Bashar al-Assad e o seu pai Hafez num cartaz em Hama Patrick Baz/AFP

Devido à escalada de violência na Síria, a Liga Árabe suspendeu no sábado a sua missão de observadores naquele país. Ao mesmo tempo, o Conselho Nacional Sírio, um dos maiores grupos da oposição, vai pedir às Nações Unidas "protecção" para os civis atacados pelas forças governamentais.

Na sexta-feira à noite, o chefe da missão árabe na Síria, o general sudanês Mohamed al-Dabi — o homem que quando chegou a Homs, no final de Dezembro, disse não ter visto situações “preocupantes” —, informara a Liga de um aumento da violência no país. “Houve um forte incremento da violência”, disse, citado pela AFP, sobretudo em Homs, Hama e Idlib.

Na noite de quinta para sexta-feira, os corpos de 17 opositores de Hama que tinham sido detidos pelas forças governamentais, fora encontrados espalhados por ruas da cidade. Tinham buracos de bala na cabeça, o que indiciava terem sido executados.

"Foram executados, a maior parte deles com uma bala na cabeça. Deixaram-lhes nas pernas as correntes de ferro que os prendiam, uma mensagem a dizer ao povo para deixar de resistir", disse à Reuters um activista da cidade, Abu al-Walid. Outro activista, contactado por telefone, disse que as mãos dos prisioneiros mortos estavam atadas com plástico e que os corpos foram espalhados por cinco bairros.

"Tinham idades diversas. Há um homem na casa dos 60 anos, outro na de 40 e a maior parte estaria nos 20 anos", disse a fonte da Reuters. Acrescentou que só três corpos estavam identificados e que um deles era um desertor da polícia que se passara para a oposição. No Youtube foi colocado um vídeo mostrando seis corpos e dizendo que foram largados em ruas de Hama, no bairro de Bab Qabli, mas a autenticidade do filme não pode ser confirmada.

No relato que fizeram sobre o que se passa na cidade, as duas fontes disseram que as ruas de Hama estão vazias, depois dos bombardeamentos desta semana. "Há postos de controlo a isolar os bairros uns dos outros e a cidade está fortemente militarizada. Hama é uma área militar cheia de veículos armados e tropas".

Hama é uma das cidades mais activas na rebelião contra o regime do Presidente Bashar al-Assad, que recorreu às forças de segurança para reprimir a revolta que começou em Março do ano passado. É uma cidade conotada com a oposição e com a violência: na década de 1980, Hafez Assad, o pai do actual chefe de Estado, ordenou o uso da força contra uma revolta da Irmandade Muçulmana. Milhares de pessoas morreram.

Na terça-feira, o Governo de Damasco iniciou uma grande ofensiva contra as três cidades mencionadas por Al-Dabi e ainda em subúrbios da capital onde se têm intensificado os ataques das forças armadas da oposição. Perante esta escalada, um porta-voz do Conselho Nacional Sírio, que agrupa uma grande parte dos grupos da oposição, disse que foi decidido pedirem a ajuda do Conselho de Segurança e pedir protecção. Samir Neshar, numa conferência de imprensa em Istambul citada pela Reuters, adiantou que a missão que está este domingo em Nova Iorque é chefiada pelo presidente do Conselho, Bourhan Ghalioun.

O Conselho de Segurança da ONU começará amanhã a debater uma proposta árabe e europeia para a resolução do conflito na Síria. Mas a Rússia já anunciou que vetará qualquer documento que preconize a saída do poder do Presidente Bashar al-Assad.

“Já dissemos claramente que a Rússia não considera esse texto como uma base para um acordo”, disse o embaixador russo nas Nações Unidas, Vitali Tchourkine, citado pela AFP.

Após o debate de segunda-feira, em que especialistas em Médio Oriente clarificarão o documento ponto por ponto, será a vez (já na terça-feira) de os enviados da Liga Árabe à ONU defenderem as suas opções - são eles o secretário-geral da Liga Árabe, Nabil el-Araby, e o primeiro-ministro do Qatar, Hamad bin Jassim al-Thani, cujo país detém a presidência rotativa da organização. Só no final deste processo se saberá se a resolução vai ou não a votação, o que depende do acordo que os diplomatas conseguirem alcançar para evitarem o veto russo e, eventualmente, da China.

O embaixador francês, Gérard Araud, disse esperar um acordo sobre a resolução “até ao final da próxima semana”, de forma a quebrar a “paralizia do Conselho de Segurança sobre este assunto”.

O plano da Liga Árabe implica a saída do poder do Presidente sírio e a criação de um governo de transição. “Qualquer decisão sobre o futuro da Síria deve ser feito no decurso de um processo político sem condições prévias”, dissera na sexta-feira em Moscovo, o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros, Gennadi Gatilov. “Não podemos apoiar a saída de Assad numa resolução”, disse Gatilov, citado pela Interfax.

A resolução, apurou a Reuters, apoia o plano de paz da Liga Árabe (que preconiza ainda a libertação dos presos políticos e a inclusão da oposição nas futuras estruturas dirigentes do país) porque “facilita uma transição política com vista à democracia e a um sistema político plural”. A Síria é um país de partido único, o Baas, de Assad.

Em Março do ano passado, na sequência do início das revoluções tunisina e egípcia, os sírios saíram à rua para exigir a Assad reformas democráticas no país. O regime de Damasco respondeu com violência e, rapidamente, os manifestantes passaram a exigir o fim do regime totalitário. Na repressão (do regime para com os manifestantes) e nos confrontos (entre o exército na oposição e as forças governamentais) morreram pelo menos 5700 pessoas. As Nações Unidas fizeram saber na semana passada que deixariam de contabilizar o número de vítimas, mas a sua agência para a infância, a Unicef, avançou na quinta-feira com um novo dado: no conflito morreram 384 crianças e cerca de 380 estão detidas (muitas delas com menos de 14 anos).

Nos últimos dias, a violência agudizou-se sobretudo nas cidades de Hama, Homs e Idlib, conforme referiu na sexta-feira à noite o chefe da missão de observadores da Liga Árabe no terreno, o general sudanês al-Dabi.

Em Novembro do ano passado, a Liga Árabe suspendeu Damasco da organização e aprovou – mas ainda sem execução – um corte de relações comerciais com a Síria e o congelamento dos seus bens nos países árabes. Apresentou também a Assad um plano de paz que implicava o fim da violência da parte do Governo, a libertação de presos políticos, o início de negociações com a oposição e permitir a entrada e circulação livre no país de estrangeiros, incluindo todos os media internacionais.

O Governo de Damasco, apesar de dar o seu assentimento verbal à proposta, nada fez no terreno que sinalizasse a aceitação dos termos do acordo.

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