O rei Jarvis e uma notável galeria de plebeus

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Pulp e a sua pop britânica amanhã DR

Entre hoje e sábado, não faltam motivos para rumar a Paredes de Coura, desde os Pulp aos menos famosos mas valentes Kurt Vile e Deerhunter.

No longínquo ano de 1993, nada era como hoje. Nesse ano, houve o primeiro Festival de Paredes de Coura, só com bandas nacionais (cinco) no cartaz - quem se lembra dos Gangrena e dos Cosmic City Blues? Hoje, o cenário é diferente: olhamos para o cartaz do festival e encontramos quase 50 nomes, repartidos por vários palcos, num verdadeiro "quem é quem" do rock indie a fazer lembrar a edição de 2005, que mostrou a Portugal a experiência Arcade Fire ao vivo.

"O festival começou de uma forma pequena", conta João Carvalho, da organizadora Ritmos, ao P2. "Começou tudo como uma brincadeira. E, sem querer ser pretensioso, originou a criação de outros festivais do género. Fomos responsáveis pelo regresso de Vilar de Mouros, porque a organização viu que havia mercado para este tipo de festivais. É um festival que tem vindo a crescer em termos de público. E com qualidade."

O cartaz do festival que hoje arranca na praia fluvial do Taboão tem um rei - Jarvis Cocker, a cara dos Pulp - e vários plebeus muito talentosos (se é que a música pop ainda gera fenómenos duradouros como os Pulp), de Kurt Vile aos Deerhunter. E nada garante que não venha de um dos nomes que ocupa menos tamanho no cartaz a maior surpresa dos quatro dias e quatro noites de música que se seguem (Paredes de Coura é useiro e vezeiro nesse fenómeno - lembremos, de novo, o caso Arcade Fire de 2005).

"Os Pulp são gigantescos, mas há muitos nomes bons", confirma João Carvalho. "Tenho a certeza absoluta que vai ser um ano que vamos ter na memória como um dos melhores de sempre", refere. O ano de 2005 - edição de luxo, com Queens of the Stone Age, Pixies, The Roots, Nick Cave & The Bad Seeds - vem-lhe à memória: "Parece-me que esta é a [edição] mais parecida".

Só o poderemos dizer quando as festividades começarem, mas há nomes que dão garantias que tal possa acontecer. Hoje, o destaque vai quase inteiro para Omar Souleyman, um sírio revelado ao mundo pela recomendadíssima Sublime Frequencies (antes de entrar no palato ocidental - e de conquistar Björk - lançou mais de 500 cassetes da sua música "para dançar"), mas não convém perder de vista a cacofonia electrónica dos Crystal Castles, com a irrequieta Alice Glass, e as canções grandiloquentes movidas a guitarras e falsete dos Wild Beasts, uma das sensações da música independente britânica mais recente.

Amanhã, há Pulp, membros vitalícios da realeza pop britânica, que decidiram regressar aos palcos em 2010 com a sua formação original para satisfação das massas, depois de uma separação, em 2002, que parecia definitiva. Mas há também o turbilhão ascético de guitarras dos Blonde Redhead, o rock inteligentemente contido dos Warpaint, e Twin Shadow, de novo entre nós para provar que os anos 80 são um filão sem fim à vista.

Até ao fim do festival, haverá ainda oportunidade para ouvirmos as canções fofinhas dos Kings of Convenience, uma versão possível de Simon & Garfunkel para a actualidade; o maravilhoso cancioneiro de torpor dos Deerhunter, autores do segundo melhor disco de 2010 (Ípsilon); o rock experimental com travo pop dos Battles; o rock não experimental com travo... rock dos Death From Above 1979 (de regresso a Coura, depois de 2005); os Mogwai, outros retornados; e dois nomes aparentemente pequenos que são bem grandes: No Age, súmula do melhor rock à margem, dos Hüsker Dü aos Sonic Youth, e Kurt Vile, que reanimou a crença na velha máxima do rock"n"roll born to lose com pinta e canções-milagre como Jesus Fever e Freaktrain.

O melhor do mundo

Os dias anteriores ao festival têm dado motivos para que João Carvalho acredite que o público vá responder em peso. "Nunca chegou tanta gente com tanta antecedência", garante. O espaço de campismo abriu sábado, mas desde dia 10 que há pessoas a acampar. O conceito "uma semana de férias" com um festival pelo meio "resultou". As vendas antecipadas de bilhetes superaram os valores dos últimos quatro anos, algo "fantástico num ano de crise e com um cartaz indie".

Indicadores positivos, para mais num cartaz que não impressiona pela galeria de estrelas, mas mais pela consistência das escolhas. A Ritmos espera 20 mil pessoas por dia no festival, número que condiz com a escala humana que o festival se orgulha de conseguir manter. "Ainda hoje me diziam que é o melhor festival do mundo: "não há pó, a relva está sempre presente, há o rio"", brinca o promotor. "As casas de banho têm autoclismos, há um número suficiente de chuveiros. Aqui, as pessoas salientam a música porque tudo o resto está assegurado. Nós temos essa preocupação com as pessoas que pagam bilhete."

Mais difícil é garantir alojamento em Paredes de Coura ou nas localidades vizinhas para os festivaleiros com "30, 40 anos", muitos deles que cresceram com o festival, mas "já não arriscam acampar". "Se tivesse duas mil camas conseguia ocupá-las, em Paredes de Coura ou nas terras limítrofes." A procura é tanta que há preços "exageradamente inflacionados", como uma casa para quatro dias por mil euros, conta. "Mas não tenho armas [para resolver a situação]."

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