Conheça as principais medidas previstas no acordo

Foto
José Sócrates, acompanhado por Teixeira dos Santos, confirmou ontem a chegada a acordo com a troika Foto: Presidência do Governo/Reuters

Depois de Sócrates ter revelado que o Governo português chegou a um acordo com a troika formada pela Comissão Europeia, Fundo Monetário Internacional e Banco Central Europeu para uma ajuda financeira a Portugal de 78 mil milhões de euros a três anos (que inclui a recapitalização da banca), algumas das principais medidas do documento vão sendo conhecidas.

Emprego

Os trabalhadores independentes vão passar a receber subsídio de desemprego. O Governo invoca uma necessidade de “aumentar as redes de protecção social” para justificar esta medida.

O documento prevê ainda a redução, de 15 meses para 12 meses, do período contributivo para os trabalhadores terem acesso ao subsídio de desemprego, mas reduz o subsídio para um máximo de 18 meses.

O memorando reduz ainda o máximo mensal do subsídio para os 1.048,05 euros.

O documento deixa ainda claras as novas limitações para o aumento do salário mínimo. “Qualquer aumento do salário mínimo só terá lugar se justificado pelas condições económicas e terá de ser acordado no contexto das revisões regulares do programa” de auxílio.

“As reformas vão focar-se na criação de novos empregos”, refere o documento, destacando a criação de postos de trabalho para os mais jovens, e sublinha a necessidade de resolver os problemas “fundamentais que impedem a transição eficiente de trabalhadores entre ocupações, empresas e sectores e que criam privilégios socialmente injustos” e promete a adopção das novas medidas em consulta com os parceiros sociais.

Para os novos contratos, o documento promete ainda alinhar as indemnizações compensatórias dos contratos a termo certo aos dos contratos sem termo, reduzir estas indemnizações, para dez dias por ano de trabalho, pagas pela empresa, ao qual se junta um valor igual, pago pelo trabalhador. O acordo facilita despedimento individual por inadaptação.

Regulamentação profissional

O plano de ajuda externa prevê a redução do número de profissões regulamentadas. Estas profissões são aquelas cujo exercício se encontra regulado por títulos profissionais obrigatórios (Licença, Carteira Profissional, Cédula Profissional ou outro) que garantem a posse das competências necessárias. É o que se passa, por exemplo, com advogados, contabilistas, engenheiros, paramédicos, médicos, dentistas, cirurgiões veterinários, farmacêuticos e arquitectos. Em Portugal existem actualmente cerca de 140.

No memorando entre o Governo e a troika estabelece-se que esta redução deverá ser efectuada ainda este ano. Também devem ser eliminadas restrições, que “já não se justifiquem”, ao exercício de certas actividade por parte daqueles profissionais. Neste âmbito reforça-se que são eliminadas as restrições «à publicidade comercial relativa a profissões regulamentadas”.

O levantamento desta interdição foi estipulado numa directiva comunitária de 2006, transposta no ano passado para o direito nacional, embora ainda com alguma reserva. No diploma nacional refere-se que “não são permitidas condições que imponham uma proibição absoluta de publicidade comercial relativa a profissões regulamentadas”. No memorando defende-se a ”eliminação das restrições” à sua utilização.

Por outro lado, defende-se que devem ser adoptadas medidas com vista a liberalizar o acesso e o e exercício das profissões regulamentadas por parte de profissionais qualificados de outros Estados da União Europeia. Este princípio também está contemplado numa directiva comunitária, onde se defende que quem possui qualificações para exercer uma profissão no seu país de origem também as possui para a exercer nos restantes países da UE. Estas medidas devem ser adoptadas até 2012.

Já este ano, o Governo deverá proceder a uma revisão das condições que ainda são exigidas para o exercício das profissões regulamentadas de modo a eliminar as que “não se justificam ou nãos sejam proporcionais”.

Política fiscal

As empresas portuguesas vão passar a pagar menos taxa social única. Para compensar os efeitos orçamentais da redução da taxa social única, o memorando prevê diversas medidas, como a alteração da estrutura e das taxas do IVA, novos cortes permanentes na despesa e o aumento de outros impostos, desde que não tenham efeitos nocivos sobre a competitividade.

O documento promete medidas para mitigar “o impacto social do aumento das taxas sobre o consumo”, para assegurar que as alterações nas contribuições para a segurança social serão compensadas com a relocação de recursos suficientes para não por em causa a sustentabilidade do sistema de pensões e, por último, medidas que garantem que as alterações nos impostos se traduzem em preços mais baixos.
O memorando estabelece ainda que os aumentos do IVA, IRS e IRC já em vigor se mantenham até 2013, mas será realizada uma revisão das listas de bens e produtos sujeitos à taxa reduzida e intermédia. A Madeira e os Açores vão ser obrigados a
aumentar a carga fiscal a partir de 2012, de forma a atenuar diferença face ao continente.

O IMI sofrerá um aumento para compensar uma redução do IMT, aumentando no entanto os impostos específicos sobre os veículos (ISV) e tabaco.

A ‘troika’ irá ainda introduzir um valor global de limite que os contribuintes poderão deduzir em despesas de saúde, educação e prestação da casa, variando consoante o escalão de rendimento.

Os benefícios e incentivos fiscais serão congelados, estando ainda previsto que algumas deles desapareçam, sendo que no caso das empresas serão eliminadas várias isenções, será imposto um limite à dedução de perdas.

No que toca à fraude e evasão fiscal, as partes assumem que até final de Outubro vão preparar um novo plano estratégico para 2012-2014 para a administração fiscal, que inclui “medidas concretas para combater a fraude e evasão fiscais” que não especifica.

Por outro lado, até final de 2011 será apresentada ao parlamento uma nova proposta de lei para reforçar a auditoria fiscal e a capacidade de aplicação da lei por parte da estrutural central de impostos, por forma a que esta possa “exercer controlo sobre todo o território nacional, incluindo as atuais zonas isentas”.

A nova lei, especifica o documento, dará à administração fiscal central “o poder exclusivo de emitir decisões interpretativas sobre impostos de aplicação nacional, para assegurar uma aplicação uniforme” dos mesmos.

Já no campo da justiça, será criada até ao final de 2012 uma “task force de juízes para despachar processos [fiscais] acima de 1 milhão de euros”.

Obras públicas

O próximo Governo terá de suspender a concretização de novas Parceria Público Privadas (PPP). O novo aeroporto de Lisboa não contará com fundos públicos e a linha de alta velocidade ferroviária Lisboa-Porto será suspensa enquanto durar o programa de ajuda a Portugal. A construção desta linha já tinha sido adiada para 2017 pelo Governo agora demissionário.

Ainda no âmbito das PPP, o Governo vai pedir assistência técnica à União Europeia e ao Fundo Monetário Internacional (FMI) “para avaliar, pelo menos, as 20 PPP mais significativas, incluindo as principais PPP da Estradas de Portugal”. Esta avaliação terá de estar concluída até Agosto.

O Governo terá também de “melhorar substancialmente os relatórios sobre as PPP para reforçar os mecanismos de monitorização” e, a partir de 2012, os relatórios anuais sobre as PPP terão de especificar todos os cash flows futuros e as obrigações do Governo nestes projectos.

Banca

Os bancos portugueses poderão vir a receber 12 mil milhões de euros de ajuda externa, incluídos no pacote de 78 mil mil milhões de euros que vai ser entregue a Portugal. A atribuição dos 12 mil milhões de euros será efectuada de forma a garantir que a gestão dos bancos continue a ser controlada pelos accionistas privados durante uma primeira fase e a permitir-lhes a recompra da posição do Estado.

“O Banco de Portugal vai agora exigir aos bancos, sujeitos a supervisão em Portugal, que atinjam um rácio ‘core tier I’ [nível de solvabilidade mínimo para exercer a sua actividade] de 9 por cento no final de 2011 e de 10 por cento no máximo até ao final de 2012 e mantê-lo a partir daí”, sublinha o memorando.
O rácio de ‘core tier 1’ é apurado através do quociente entre o conjunto de fundos próprios designado de ‘core’ e as posições ponderadas em função do seu risco.

“Caso os bancos não consigam atingir os seus objectivos dentro do prazo, poderá ser necessário o financiamento público temporário para assegurar o reforço dos rácios de capital”, explica.
Contudo, acrescenta, os bancos que beneficiarem de fundos públicos “estarão sujeitos a regras e restrições e a um processo de reestruturação em linha com as regras comunitárias da concorrência e com as exigências para a ajuda estatal, o que constituirá um incentivo para que seja dada prioridade às soluções baseadas no mercado”.

O memorando prevê ainda a criação de um programa de garantias à emissão de obrigações dos bancos no valor de 35 mil milhões de euros, incluindo o pacote de incentivos actuais, frisando que “os bancos serão encorajados para tomar acções que fortaleçam as margens de segurança”. O Estado português vai ainda acelerar os prazos para vender o BPN, sem um preço mínimo, esperando encontrar um comprador até ao final de Julho, indica o memorando.

Já sobre a Caixa Geral de Depósitos, banco público sobre o qual o primeiro-ministro adiantou terça-feira que não seria privatizado no âmbito deste acordo, o texto refere que “o grupo CGD será simplificado para aumentar a base de capital do seu ramo bancário”.

PIB

O memorando de entendimento prevê, para este ano e para 2012, uma quebra no produto interno bruto (PIB) de dois por cento. Está contemplado um ajustamento de 3,4 por cento do PIB na despesa e 1,7 por cento na receita.

Do lado da despesa, as principais medidas de contenção referem-se ao congelamento dos salários e das pensões até 2013, com excepção das pensões mais reduzidas, para além da introdução de um imposto nas pensões acima de 1500 euros.

Administração pública

A ‘troika’ pretende reduzir o número de pessoal na administração central em um por cento por ano, recorrendo para isso à regra de 2 por 1 reforçada já iniciada pelo Governo (uma entrada por duas saídas), aplicando ainda uma racionalização da administração pública a nível regional e local, de modo a permitir reduzir o número de trabalhadores em 2 por cento por ano.

A estas, juntar-se-ão maiores limites nas transferências para os governos regionais e locais, outras entidades públicas e empresas do Estado.

Nas empresas públicas, para além da implementação efectiva dos cortes nos custos operacionais em 15 por cento face aos valores de 2009, já previstos, a ‘troika’ pretende reduzir os benefícios variáveis (como o cartão de crédito, por exemplo) em pelo menos 5 por cento por ano até 2014 e alinhar as práticas salariais com a função pública.

O acordo entre o Governo e a ‘troika’ prevê ainda o fecho de uma em cada cinco repartições locais de finanças e que a administração fiscal será constituída por 30 por cento de auditores até ao final de 2012.
“A força laboral de auditores [fiscais] será aumentada para 30 por cento do total de trabalhadores da administração fiscal até 2012, na sua maioria através da recolocação de pessoal do sector público e na administração fiscal”, indica o memorando de acordo entre o Governo e a equipa tripartida da Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional.

O texto também indica que “será fortalecida a informação de terceiros para apoiar as auditorias” aos contribuintes.

Na vertente organizacional, o acordo prevê a modernização da administração fiscal, com a unificação dos vários serviços de impostos (Direção Geral de Contribuições e Impostos), alfândegas (Direção Geral de Alfândegas) e serviços informáticos (Direcção Geral de Informática e Apoio aos Serviços Tributários e Aduaneiro).

Até ao final de Setembro deste ano, as duas partes prevêm ter concluído um estudo sobre se a nova estrutura - cujo formato estará decidido até ao final de 2011 - pode ou não acumular a coleta da segurança social.

Esta nova estrutura, adianta o memorando, vai simplificar as repartições locais de finanças, fechando pelo menos 20 por cento (uma em cada cinco) em 2011 e em 2012.

Na administração local, o acordo entre o Governo e a ‘troika’ refere que Portugal terá de reduzir a partir de Julho de 2012 o número de câmaras e juntas de freguesias, actualmente 308 e 4259 respectivamente, reduções que terão de estar concretizadas nas próximas eleições autárquicas que decorrerão em 2013.
O memorando diz também que, até Dezembro deste ano, terá que ser publicado um levantamento de todas as entidades públicas, incluindo associações, fundações e outros organismos em todos os níveis da administração pública, que permitirá ao Governo decidir quais deverá encerrar ou manter.

Deverão ser igualmente criadas até Julho de 2012 novas leis da administração pública que regulamentem aquelas entidades.

Educação

Será aplicada uma “racionalização” do currículo escolar e da criação de centros escolares de forma a reduzir os custos para o Estado.

A autonomia das escolas secundárias é uma das medidas apresentadas no plano de ajuda externa a Portugal. Até 2012, o Governo deverá estabelecer contratos de confiança com as escolas com vista a implementar a sua autonomia. Deverão ser criados mecanismos de prestação de contas: os resultados escolares são um dos critérios a ter em conta.

Saúde

Na saúde, as taxas moderadoras deverão ainda sofrer aumentos e eliminadas isenções, sendo também aqui protegidas as pessoas com menores rendimentos.

A ADSE e os sub-sistemas de saúde dos militares e das polícias deverão ser atingir a sustentabilidade financeira em 2016. Para isso, o memorando prevê que o custo orçamental dos sub-sistemas de saúde sofram um corte de 30 por cento já no próximo ano e de 20 por cento em 2013.

Uma poupança da ordem dos 550 milhões de euros no sector da saúde é o que está previsto no memorando de entendimento que Portugal assinou com a “troika”.

Benefícios ficais: as despesas com a saúde e seguros privados nas declarações de IRS vão ser cortados em dois terços.

Convenções com privados: estipulado um corte de pelo menos 10 por cento já para este ano e de mais 10 por cento em 2012.

Custos com o transporte de doentes: um terço de redução (em 2009 aproximaram-se dos 100 milhões de euros).

Hospitais do SNS: redução de 200 milhões de euros nos custos operacionais (100 milhões este ano e 100 milhões em 2012), graças à concentração e racionalização dos hospitais públicos; para 2013 está previsto um corte adicional de cinco por cento nos custos operacionais, em resultado da continuação da reorganização da rede hospitalar e da concentração de unidades de saúde e serviços de urgência.

Medicamentos: a despesa pública vai ser reduzida gradualmente, passando a representar 1,25 por cento do PIB no próximo ano e um por cento do PIB em 2013 (actualmente ronda os 1,5 por cento do PIB).

Farmácias: vai ser alterada a forma de cálculo da margem de lucro ( que hoje é uma percentagem de 20 por cento sobre o preço de venda ao público dos medicamentos), medida que visa encorajar as vendas de produtos farmacêuticos mais baratos e que se estima venha a contribuir com pelo menos 50 milhões de euros de poupança.

Reduzir em pelo menos 10 por cento a factura com horas extraordinárias dos profissionais de saúde, em 2012, e em mais 10 por cento em 2013 (em 2010 o gasto com horas extraordinárias rondou os 350 milhões de euros).

Justiça

A ‘troika’ e o Governo pretendem resolver o problema da pendência processual em 24 meses, o que começará com uma auditoria, a concluir em Junho, sobre todos os casos das acções de execução, insolvências, dívidas fiscais e processo laborais. Com base nessa auditoria serão tomadas medidas adicionais, até Setembro, para melhorar a resolução do número de processos pendentes nos tribunais, que todos os anos aumentam.

Está ainda prevista uma reestruturação dos tribunais para melhorar a sua eficácia e a implementação das 39 comarcas do novo mapa judiciário até ao final de 2012, quando o Governo a tinha previsto para 2014.

Até Setembro será definido um roteiro para esta reforma que será financiada através do que se vai poupar em gastos e ganhos de eficiência, conseguidos pela racionalização de custos e por uma melhor gestão dos serviços públicos.

A ‘troika’ do FMI, Comissão Europeia e Banco Central Europeu definiu ainda um novo sistema de gestão para dois tribunais, entre os quais se inclui um da região de Lisboa, que será implementada até ao final do ano. Será ainda implementada uma nova gestão de pessoal de apoio, estando prevista a mobilidade especial dos oficiais de justiça.

O memorando indica ainda que vai ser feita uma fusão de pequenas execuções de dívidas que sejam semelhantes e que serão cobrados custos adicionais aos devedores que não cooperem com a justiça.

O número de agentes de execução irá também ser reforçado para permitir a libertação dos juízes para outros casos. O documento refere ainda que será alargada e melhorada a resolução alternativa de litígios para permitir que mais casos sejam retirados dos tribunais.

Privatizações

O Estado vai sair do capital da EDP e da REN até ao final do ano, indica o memorando de entendimento entre o Governo e a ‘troika’, que diz que se houver condições espera privatizar também a TAP até final de 2011.

Notícia actualizada às 19h02
Sugerir correcção
Comentar