As agências de rating voltam a ser as "culpadas" da crise

É o regresso aos dias em que a crise do subprime estava no auge, os bancos estavam sob a ameaça da falência e os culpados eram, de acordo com a generalidade dos políticos e líderes financeiros, das agências de rating.

Tal como no final de 2008, quando estas instituições falharam na sua missão de alerta relativamente ao risco dos títulos relacionados com o mercado imobiliário norte-americano e depois contribuíram, com cortes repentinos de ratings, para a entrada em falência de alguns bancos, os dedos estão agora todos a apontar na mesma direcção.

O motivo para a nova onda de indignação contra as agências de rating esteve nas decisões tomadas na terça- feira em relação aos Estados grego e português por uma das três grandes agências internacionais, a Standard & Poor"s. O rating da Grécia foi cortado em três níveis para uma classificação que assume uma elevada probabilidade de default por parte do país. O rating BB-, agora atribuído, não permite, por exemplo, que as obrigações do tesouro gregas possam ser usadas como colateral pelos bancos comerciais nos pedidos de empréstimo ao Banco Central Europeu. Por isso, a situação já muito difícil deste país - desesperadamente à espera do empréstimo prometido pelos parceiros da zona euro e pelo FMI - ficou ainda mais grave, com as taxas de juro de mercado a subirem acima dos 10 por cento.

No caso de Portugal, a redução do rating foi de dois níveis, para A-, o que cimentou a ideia nos mercados de que, a seguir à Grécia, as finanças públicas portuguesas são aquelas que é preciso vigiar e contribuindo para nova alta das taxas de juro, que já se encontram ao mesmo nível registado na Grécia no final do ano passado, quando a possibilidade de uma ajuda internacional começou a ser discutida.

Como dizia uma nota de research do Bank of America, o que a Standard & Poor"s fez foi "atirar gasolina para a fogueira".

Ontem, as autoridades europeias vieram em defesa dos dois Estados-membros, deixando apelos e avisos às agências de notação financeira. Um porta-voz da UE pediu para que "ajam com responsabilidade e de forma rigorosa", acrescentando que "irá continuar a ser vigilante" relativamente à sua actuação.

Do lado do Fundo Monetário Internacional, as críticas foram mais moderadas, mas também foram feitas. O director-geral da instituição com sede em Washington, Dominique Strauss-Kahn, afirmou ontem que "não se deve acreditar de mais" no que dizem as agências de notação financeira, assinalando que elas se limitam a fazer reflectir nas suas classificações as informações que "recolhem sobre o mercado", sendo por isso falíveis, embora com "alguma utilidade".

S&P sem arrependimento

Em Portugal, o Governo já tinha, no próprio dia da decisão de descida do rating, apontado a maior parte das culpas às agências. E do lado dos bancos portugueses, que também viram a S&P baixar os ratings na sequência da decisão tomada para o risco soberano nacional, também vieram críticas. António de Sousa, presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), interrogou-se sobre "as razões de um corte de rating tão grande". "O que aconteceu ontem é bastante desagradável e, nomeadamente inesperado, pela sua dimensão, porque não houve nenhum acontecimento substantivo do ponto de vista técnico", afirmou, defendendo que o que foi feito foi um simples acompanhamento da tendência revelada pelo mercados. "Mas isso não é a função das agências de rating", disse.

Do lado da Standard & Poor"s não parece haver sinais de arrependimento. Ontem, voltaram à carga, com uma descida do rating da Espanha, embora apenas de um nível. A decisão gerou, para seguir a regra, nova reacção negativa do poder político. A vice-presidente do Governo espanhol, María Teresa Fernández de la Veja, criticou os que classificou com ironia de "paladinos da pureza económica", afirmando que estão a pôr em causa "os pilares sobre os quais se sustém a economia [espanhola]", quando eles próprios "falharam redondamente na hora de prever a crise actual".

O regresso em força deste tipo de críticas deixa no ar uma dúvida. Por que é que os governos - que após os acontecimentos do final de 2008 anunciaram a intenção de alterar as regras a que devem obedecer estas agências, colocando mesmo a hipótese de criar uma agência de carácter público para as substituir - ainda não deram passos concretos para evitar o que dizem ser os "erros" e "manipulações" destas entidades? Será que a nova crise será suficiente para forçar as mudanças?

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