Kiarostami, Leigh, Mikhalkov e Kitano em Cannes – ah, claro, e Oliveira

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O festival decorre de 12 a 23 de Maio Christian Hartmann/Reuters

As quatro grandes agências noticiosas – France-Presse, Reuters, Associated Press e Getty – já tinham ameaçado, e a ameaça cumpriu-se: devido a um diferendo sobre as “restrições severas” impostas pela organização à cobertura do próximo Festival de Cannes, nenhuma delas pôs ontem os pés na conferência de imprensa que lançou a 63.ª edição (de 12 a 23 de Maio) e onde se ficou a saber que, mais uma vez, Oliveira está lá.

O novo filme do cineasta português, O Estranho Caso de Angélica, passa na secção Un Certain Regard, lado a lado com outra figura tutelar do cinema europeu, Jean-Luc Godard (Film Socialisme), e com os novos romenos Radu Muntean (Mardi, Après Noël) e Cristi Puiu (Aurora). A abertura do festival, confirmou ontem o delegado-geral do festival, Thierry Frémaux, fica mesmo nas mãos do Robin Hood de Ridley Scott – e de Kristin Scott-Thomas, que apresentará a cerimónia.

Na secção competitiva mais a doer, com a Palma de Ouro ao fundo do túnel, há mais autores lá de casa: do iraniano Abbas Kiarostami, que concorre com Copie Conforme, um inusitado boy meets girl com Juliette Binoche, ao tailandês Apichatpong Weerasethakul (com uma longa, Uncle Boonmee Who Can Recall His Past Lives, que começou por ser uma curta), passando pelos muito regulares Mike Leigh (que leva a Cannes Another Year, com dois dos seus actores-fétiche, Imelda Staunton e Jim Broadbent, juntos outra vez depois de Vera Drake), Nikita Mikhalkov (muitos anos depois das purgas estalinistas, vamos reencontrar Sergei Kotov, o protagonista de O Sol Enganador, a fugir ao gulag e a combater na frente russa da Segunda Guerra Mundial: sim, é O Sol Enganador 2), o argelino Rachid Bouchareb (Hors la Loi) e Bertrand Tavernier (La Princesse de Montpensier forma, juntamente com Tournée, de Mathieu Amalric, e Des Hommes et des Dieux, de Xavier Beavois, o contingente francês no assalto à Palma de Ouro).

Os novos do mexicano Alejandro González Iñárritu (Biutiful, com um Javier Bardem a tentar fazer as pazes com o passado), do japonês Takeshi Kitano (Outrage, de regresso ao filme de yakuzas), do italiano Daniele Luchetti (La Nostra Vita) e dos sul-coreanos Lee Chang-dong (Poetry) e Im Sang-soo (Housemaid) são outros dos filmes seleccionados para a competição oficial. Cartas fora do baralho? You, My Joy, uma ácida parábola da Rússia contemporânea filmada pelo documentarista Sergei Loznitsa, que aqui se estreia na ficção, e Un Homme qui Crie, do chadiano Mahamat-Saleh Haroun – e um filme americano, por enquanto o único, Fair Game, de Doug Liman, adaptação das memórias da agente da CIA Valerie Plame. Por enquanto, dizíamos, porque ainda há quatro buracos para preencher na competição: soube-se ontem, no entanto, que à partida nenhum deles será para o novo Terrence Malick, The Tree of Life, que muito provavelmente não estará pronto a tempo de integrar a selecção oficial de Cannes. Fim de especulação, portanto (ou não necessariamente: nos bastidores, continuam os rumores acerca da inclusão do filme de Malick e também de Potiche, de François Ozon, com Catherine Deneuve e Gérard Depardieu).

Também em antestreia absoluta, mas fora de competição, estarão três grandes pesos-pesados do cinema mundial: Woody Allen, com You Will Meet a Tall Dark Stranger, Stephen Frears, com Tamara Drewe, adaptação da série de banda desenhada criada por Posy Simmonds, e Oliver Stone, com a oportuníssima (pós-crise do subprime e primeiro crash bolsista do século XXI) sequela de Wall Street, Money Never Sleeps. Também em sessões especiais, passarão ainda os novos filmes do georgiano Otar Iosseliani, Chantrapas, e do chileno Patrício Guzmán, Nostalgia de la Luz, meditação sobre os despojos da ditadura de Pinochet.

O júri que irá atribuir a Palma de Ouro, e que, sabia-se desde Janeiro, será presidido por Tim Burton, também ficou ontem completo, com as entradas de Benicio del Toro, Kate Beckinsale, Giovanna Mezzogiorno, Alberto Barbera (director do Museu Nacional do Cinema Italiano), Victor Erice, Emmanuel Carrere e Shakhar Kapur. O canadiano Atom Egoyan presidirá ao júri Cinéfondation; Claire Denis dirigirá os trabalhos na secção Un Certain Regard. O programa da Quinzena dos Realizadores e da Semana da Crítica fica para as próximas semanas – assim como, espera-se, o desfecho do diferendo entre o festival e as agências.

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