Turner para o fantasma efémero de Richard Wright

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O trabalho em folha de ouro demorou quatro semanas a completar Toby Melville/Reuters

É o regresso da pintura às vitórias no Turner, mas é um regresso que não passa de Janeiro. É que Richard Wright é um pintor do efémero, dos frescos feitos à medida dos espaços que os acolhem e que desaparecem depois da sua passagem. A sua obra dourada, sem título, para a exposição do Prémio Turner na Tate Britain, é obviamente um exemplo: baseando-se nas técnicas dos pintores de frescos do Renascimento, transferindo um desenho para a parede através de furos no papel em que é feito, produziu "o fantasma de uma obra", como explicou ao Guardian.

Daí nasceu a imagem de folha de ouro, cuja "profunda originalidade e beleza" convenceu o júri composto porStephen Deuchar, director da Tate Britain (era o presidente), Charles Esche, director do Van Abbemuseum, em Eindhoven, a apresentadora Mariella Frostrup, o director da Trienal Folkestone, Andrea Schlieker, e o crítico de arte do Guardian Jonathan Jones.

E daí vieram os 27,6 mil euros do prémio maior da arte contemporânea britânica, dado ao mais velho premiado de sempre (49 anos). O fresco dourado, algo entre o barroco e o abstracto, descreve a imprensa, e "a composição mais complexa e mais ambiciosa até à data" do artista, segundo o júri, vai desaparecer no dia 3 de Janeiro, quando acaba a exposição do Turner e nova camada de tinta o ocultará.

Sobre o que é produzir uma peça que não durará, Wright responde: "Estou interessado em colocar a pintura numa situação em que colida com o mundo. A fragilidade dessa existência, [o facto de] estar aqui por um tão curto período de tempo, penso que intensifica a experiência de estar aqui. É também um desafio à comercialização da obra", explicou à BBC.

Perda e alívio

Não se pode ficar rico, assume, a vender peças que não existem para todo o sempre - ou que, pelo menos, carregariam em si esse potencial - "mas consegui chegar até aqui", sorri na mesma entrevista, fazendo-nos pensar na sede (agora, com a crise, um pouco menor) do mercado em torno dos trabalhos dos membros da Young British Art que têm vencido o Turner. Mas Richard Wright confessa ao Guardian que sim, às vezes há "perda", mas que outras vezes há "alívio" quando mais uma peça desaparece.

Para o júri, o seu trabalho, "alicerçado na tradição das belas-artes mas, no entanto, radicalmente conceptual no seu impacto", produz obras "que ganham vida quando são experimentadas pelos espectadores". Para esses espectadores que foram deixando comentários na Tate, a mensagem do artista parece ter passado na perfeição: "Obrigada por trazer alguma perícia de volta ao Prémio Turner"; "Atitude refrescante em relação à comercialização e à mortalidade". Mas não se pense que Wright não tem uma rede de segurança: há cerca de dez murais de Wright no mundo, sobrevivendo em paredes de galerias, e ele é representado por um dos galeristas e comerciantes de arte mais poderosos do mundo, Larry Gagosian.

Richard Wright, que nasceu em Londres mas foi para a Escócia em criança, onde estudou (agora vive em Glasgow), nem sempre pintou assim: começou pela tela, pelas peças figurativas, mas depois passou às paredes e ao abstracto (destruiu todos os seus quadros em tela, que achava "uma porcaria"). Foi nomeado para o Turner no último ano em que podia ganhá-lo (o prémio é para artistas com menos de 50 anos) por duas exposições, uma na 55th Carnegie International (Pittsburgh) e outra na Galeria Ingleby (Edimburgo).

Os restantes nomeados deste ano eram Roger Hiorns, Enrico David e Lucy Skaer. No ano passado, o Turner foi para Mark Leckey, que produziu um filme com Homer Simpson e Felix the Cat de inspiração pop. Entre os vencedores do Turner, fundado em 1984, figuram Damien Hirst, Martin Creed, Grayson Perry ou Gilbert and George.

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