Rock na relva


Palco principal, com experientes do rock como os Nine Inch Nails e novatos como os The Horrors. Um palco secundário dançante, para que a noite se prolongue, e jazz, à tarde, para relaxar. É assim o cardápio musical de mais um festival Paredes de Coura.


Quarta-feira

Patrick Wolf
O primeiro dia do festival é feito em regime de descontracção. É uma espécie de sessão de aquecimento para os restantes três dias. Mas isso não significa que os motivos de interesse sejam nulos. Com três álbuns lançados, Patrick Wolf é uma das certezas da pop inglesa. No último álbum, editado este ano, The Bachelor, divide-se entre canções pop barrocas, de arranjos sumptuosos, e outras onde envereda por uma toada mais introspectiva, próxima da folk mais contemplativa, contando para a sua feitura com nomes como o da actriz Tilda Swinton ou o músico Matthew Herbert. Para completar os destaques da noite, dos EUA, mais exactamente do Texas, virão os Strange Boys, que se estrearam este ano com Strange Boys and Girls Club, quarteto praticante de um rock tão doce quanto explosivo, na linha de outros defensores do som das guitarras em volume alto, os Black Lips.

Bons Rapazes (01h30)
Patrick Wolf (00h00)
Strange Boys (23h00)
Sean Riley and the Slowriders (22h00)

Quinta-feira

Franz Ferdinand
No ano em que lançam o terceiro álbum de originais, Tonight: Franz Ferdinand, os escoceses Franz Ferdinand regressam a Portugal, onde já conhecem um grande culto. O álbum, que foi recebido com alguma frieza em todo o mundo, divide-se entre explorar ideias já evidenciadas nos registos anteriores e tentar desbravar terrenos novos, assumindo uma vocação dançante mais vincada. Ao vivo, consta que o grupo consegue dinamizar canções que, em disco, parecem algo entorpecidas. Outros britânicos, os The Horrors, vêm apresentar o segundo álbum, Primary Colours, disco surpreendente de rock electrónico, tenso, psicadélico, paranóico, enquanto de Nova Iorque virão os Pains of Being Pure at Heart, simbolizando a época actual, música movida por múltiplas temporalidades, agregando o melhor que o rock e a pop das últimas décadas foram capazes de oferecer. A partir das 2 da madrugada o palco after hours terá música de dança com os americanos Holy Ghost, terminando uma jornada que se iniciará com os Tubab, que asseguram a tarde de jazz na relva.

Holy Ghost! (03h00)
Chew Lips (02h00)
Franz Ferdinand (00h15)
Supergrass (22h30)
The Horrors (21h20)
Pains of Being Pure at Heart (20h10)
Temper Trap (19h00)
Tubab (16h00)

Sexta-feira

Nine Inch Nails
O ambiente de sexta-feira promete ser mais industrial e sombrio, tudo por causa dos Nine Inch Nails, do seu mentor Trent Reznor e dos milhares de admiradores esperados para assistirem àquele que poderá ser um dos últimos concertos do grupo, se for confirmada a intenção - evidenciada por Reznor nos últimos tempos - de, em Agosto, o grupo dizer um adeus definitivo aos palcos. Quem vai continuar nos palcos é a canadiana Peaches, agora em versão mais sedutora do que propriamente provocadora. Conferir no seu quarto álbum, deste ano, I Feel Cream. Apesar do nome - Portugal, The Man -, este grupo americano nunca actuou por aqui. Comparados aos Led Zeppelin ou aos Jane's Addiction, virão apresentar o seu novo álbum, The Satanic Satanist.
Punks Jump Up (03h00)
Kap Bambino (02h00)

Nine Inch Nails (00h10)
Peaches (22h30)
Blood Red Shoes (21h20)
Portugal, The Man (20h10)
Mundo Cão (19h00)
Space Ensemble (16h00)

Sábado

The Hives
O último concerto do festival ficará a cargo do rock nostálgico dos suecos The Hives, capazes de doses de energia imparável misturada com um sentido de irrisão que, algumas vezes, se revela completamente surpreendente. Alguma ironia, e pop marcada pela elegância, é aquilo que se espera da actuação do britânico Jarvis Cocker. O ex-Pulp virá mostrar o seu novo álbum, Further Complications, produzido pelo mítico Steve Albini. Os australianos Howling Bells e os Foge Foge Bandido, um dos actuais projectos do antigo vocalista dos Ornatos Violeta, Manuel Cruz, são outros dos destaques da última noite do evento.
Nuno Lopes (03h00)
Sizo (02h00)

The Hives (01h00)
Jarvis Cocker (23h05)
Howling Bells (21h40)
The Right Ons (20h30)
Foge Foge Bandido (19h00)
Manuel d'Oliveira (16h00)



Vítor Belanciano

Paredes de Coura, o festival sentimental

Foto
Em 2009, o Festival de Paredes de Coura tem uma dose de risco e Patrick Wolf, Nine Inch Nails, The Hives e Franz Ferdinand Nelson Garrido/PÚBLICO

Com Paredes de Coura, tudo parece ser sentimental, sensorial. Mesmo com machos alfa como Trent Reznor a encabeçar o cartaz. É a relva do anfiteatro natural do recinto, o "carinho" da organização pelos espectadores, a "ternura" do público pelo festival... Até o principal patrocinador, que este ano falta no Festival de Paredes de Coura, é descrito como "uma almofada mais confortável" - ainda que ausente. A falta da cerveja Heineken pode nem ser muito sentida: não só a organização promete o melhor cartaz dos últimos anos (mesmo sem almofada) como os The Hives pediram que lhes seja servida exclusivamente cerveja portuguesa.

A agitar o Minho desde 1993, agora sem a "concorrência" de Vilar de Mouros e tido como um local de peregrinação regular dos fãs dessa vaga coisa chamada música alternativa, o festival de Paredes de Coura abre hoje oficialmente as portas. Mas já há muita gente pelo parque de campismo, algo que Vítor Pereira, da Ritmos, organizadora do festival, constatou na habitual voltinha pelo recinto. "Se acabar [o espaço no parque oficial], fala-se com o proprietário de um campo e chega-se a um acordo", disse ao P2, cheio de espírito courense.

No ano em que perdeu o seu patrocinador dos últimos anos, a cervejeira Heineken, o festival propõe Franz Ferdinand, Jarvis Cocker, Nine Inch Nails, Strange Boys, Patrick Wolf, The Hives. A organização considera que tem de haver um trabalho editorial (chamar-lhe pedagógico seria exagerado). "O nome da banda é importante, mas é muito mais importante o que ela faz e o que representa num dado momento", explica Vítor Pereira.

Como o ananás a rebentar na cabeça de Karen O dos Yeah Yeah Yeahs em 2003, há bandas emergentes "que vêm directamente de tocar em clubes para o palco principal" de Coura e ao "efeito surpresa" alia-se a criação de "um certo happening". Que pode acontecer sexta-feira, com Trent Reznor a ameaçar que esta é a última digressão dos Nine Inch Nails - "um factor de motivação para os trazer", confirma Vítor Pereira. O que interessa é "termos bandas que possam representar uma mais-valia para o cartaz em relação a outros festivais".

Foi essa edição do cartaz, a temática, o controlo de qualidade, que permitiu resistir à falta da tal almofada patrocinadora. Este ano, fazer o cartaz de Coura "foi mais difícil": "Se não tivéssemos uma certa identidade teríamos ainda mais dificuldade. O main sponsor acaba por ser uma almofada mais confortável." As marcas de cerveja estão a canalizar o seu investimento para o futebol, diz Vítor Pereira, mas o apoio constante da autarquia, aliado ao esforço financeiro da própria organização, permitiu correr este "risco".

Crise em Espanha

O contexto crise está a afectar os festivais de diferentes formas. Muita oferta e, do lado do público, cada vez mais espírito vá para fora com música dentro - um festival pode servir de pretexto para umas miniférias em São Pedro do Sul (Andanças), em Sines (Músicas do Mundo) ou na Zambujeira do Mar (Sudoeste) - mas também há alguns festivais que caíram pelo caminho. Olhe-se para o lado, mais precisamente para Espanha, e constate-se a ausência do Summercase, cuja edição 2009 foi cancelada. Este sinal parecia ao jornal espanhol El Mundo o prenúncio do rebentar da bolha festivaleira.

Em Fevereiro, o mesmo diário espanhol perguntava ao co-director do Sónar, outro festival de referência espanhol, se são os festivais que estão em crise ou se sofrem pelo contexto internacional. "O consumo está em queda, o investimento publicitário está em queda e, tal como se vendem menos casas, também se vendem menos bilhetes para concertos", dizia Ricard Robles. Outro factor que surpreendeu os organizadores dos festivais em Espanha foi o cancelamento das linhas de crédito que financiavam muitos eventos.

Qual é a solução? 1 - tentar depender o mínimo possível de patrocinadores e afins. 2 - identidade própria (Vítor Pereira garante: "Não estamos a competir com o Rock in Rio ou outros festivais maiores"). 3 - (uma das palavras mais repetidas por Vítor Pereira na conversa com o P2) "risco". Ter um pouco de "coragem" e "optimismo" para colher frutos mais tarde.

Em Coura, a organização assume que pode perder algum dinheiro. "Mas no futuro permite-nos mais respeito", prevê Vítor Pereira, numa ética muito rock n' roll. "As pessoas sabem que este ano não temos patrocínio e isso também é considerado por elas. Não vivemos de desejos imediatos, vivemos de um público fiel", entre os quais cerca de 40 por cento de galegos.

É a família Paredes de Coura, a tal que os organizadores dizem ser fiel e em crescimento. Por falar nisso, venham a eles as criancinhas. Cientes de que os festivaleiros de Coura são menos teen e mais thirtysomething, este ano há serviço de babysitting. "Nós tratamos dos filhos deles enquanto eles vão aos concertos", diz Vítor Pereira. Tudo no espírito de "descontracção, contacto com a natureza e carinho", como enumera o organizador, quase em registo mais Woodstock português do que os vizinhos de Vilar de Mouros. Carinho pelos espectadores, diz, e que é recíproco: "As pessoas têm mais ternura pelo festival." Até os Franz Ferdinand pediram à organização que lhes fornecesse postais da terra para enviarem à família.

Em Paredes de Coura, pior do que a crise só mesmo o espectro da chuva. Como a que baptizou Morrissey em 2006. E essa parece ter ido, com o patrocinador maior, para outras paragens.

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