Na música, como noutros campos artísticos, há a ideia feita que é nas estreias que existe dose maior de espontaneidade. Os anos vindouros serão de superação ou consolidação e, supostamente, o gesto instintivo será mais difícil de se manifestar. Não digam isso a Stephen Wilkinson, ou melhor Bibio, britânico que já lançou três álbuns e que, ao quarto, parece ter encontrado a verdadeira inspiração, aquela que lhe permite, com gesto desprendido, descortinar uma linguagem sua, onde se sente confortável, conseguindo transmitir o prazer, que é também leveza, de ter chegado a um lugar seu.
Coisas que levam tempo. Não que o novo álbum seja radicalmente diferente dos anteriores registos, combinação de planície e cidade, repetição electrónica urbana e elegância acústica, folk bucólica e ambientalismo caleidoscópico. Não é. Mas possui um travo diferente: o travo de quem é capaz de olhar a paisagem por inteiro, saboreando com tempo todos os contornos, a finura das texturas, a abstracção das cores, e traduzi-la numa música aberta. A maior parte dos temas aproxima-se da estrutura da canção pop, mas nem todos o são exactamente. "Lovers carvings" ou "Jealous of roses" partem de variações simples e repetitivas para guitarra, desembocando num clima de pop primaveril, com a voz em falsete de Wilkinson em acção. "Fire ant" ou "Sugarette" são construídos segundo as premissas de corte-e-costura do hip-hop, libertando uma energia em forma de arco-íris. "Abrasion" respira naturalmente o ar da Inglaterra rural, num registo folk psicadélico. É uma avenida cheia de árvores, aquela que ilustra a capa de um álbum de canções diversas, unidas pela mesma atmosfera vagamente nostálgica. Não faltará quem as contemple e as encare como mera revisitação ao passado. Mas é uma visão redutora. em "Ambivalence Avenue" fundem-se múltiplas temporalidades. E mesmo que isso não acontecesse, haveria sempre uma mão cheia de canções inspiradas, daquelas que não estão presas a nenhuma época, capazes de contaminar, com frescura, o Verão na cidade.
